Um estudo pioneiro no Sul do Brasil, desenvolvido por uma pesquisadora da Universidade Feevale, vêm analisando desde maio amostras de água coletadas em estações de esgoto em Porto Alegre e cidades da Região Metropolitana para verificar a circulação do novo coronavírus em determinadas áreas populacionais.
Para isso, coleta material em pontos de captação do esgoto para detectar a presença e propagação da Covid-19 nas comunidades. Até o momento, de 29 amostras pesquisadas, cinco acusaram a presença do vírus em estações de tratamento de água e em saídas de esgoto de hospitais.
Desenvolvido por meio de um convênio firmado entre a universidade e o Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS), o trabalho é coordenado pela bióloga Caroline Rigotto, professora do mestrado em Virologia da Feevale. Segundo ela, o principal objetivo da pesquisa é, a partir da verificação da circulação do coronavírus, dar suporte às autoridades de saúde para a tomada de decisão em relação às medidas de prevenção.
“Além disso, é fundamental avaliarmos o uso desse monitoramento como uma ferramenta de vigilância da Covid-19. E, após a pandemia, ter essa metodologia como forma de identificar a presença de vírus, antecipando casos e atuando com rapidez para conter a transmissão local da doença”, diz a pesquisadora.
Diversas iniciativas semelhantes de monitoramento do vírus em amostras têm sido bem-sucedidas em diferentes países e regiões do Brasil, no sentido de ajudar a estimar a presença e até a prevalência da Covid-19 nas comunidades.
As coletas na capital gaúcha e em cidades da região do Vale do Sinos estão sendo feitas em pontos estratégicos, com apoio dos órgãos municipais e estaduais envolvidos, e os testes ocorrem no Laboratório de Microbiologia Molecular da Feevale. São consideradas amostras de água bruta de mananciais e residuais de esgoto (que entra e sai), inclusive de hospitais.
Do total das 29 amostras de 10 pontos de coletas - distribuídos em duas Estações de Tratamento de Esgoto (ETE), duas Estações de Bombeamento de Esgoto (EBE), um manancial altamente impactado e quatro hospitais e uma Estação de Tratamento de Água (ETA)- já analisadas desde 11 de maio, cinco (17%) apresentaram resultados positivos, sendo quatro na Capital, na medição mais recente, feita entre 1 e 5 de junho.
No ponto de monitoramento da Estação de Bombeamento de Esgoto (EBE) Baronesa do Gravataí, em Porto Alegre, houve a presença do vírus em 100% das amostras de esgoto bruto nas duas coletas realizadas. Nas amostras analisadas em pontos de monitoramento dos efluentes de hospitais verificou-se resultado positivo na terceira semana de coleta.
Amostra foi coletada no Arroio Dilúvio nesta quarta-feira. Foto Sergio Louruz/PMPA/JC
Entre as ETEs da cidade, a São João Navegantes, segunda unidade de esgotos de Porto Alegre em termos de capacidade de tratamento, e que atende bairros como Navegantes, Vila Farrapos, São Geraldo, São João, Auxiliadora, Higienópolis, Santa Maria Goretti, IAPI, Dona Teodora, Humaitá e Aeroporto, apresentou reação positiva na maior porcentagem de amostras.
“Essa estação dá vazão para mais de 700 mil pessoas e foi a que apresentou mais reação positiva. Agora, nas próximas etapas, vamos repetir a coleta e ampliá-la para três hospitais, para a água do Lago Guaíba, Arroio Dilúvio, em Porto Alegre, e Vale do Sinos e Rio do Sinos”, comenta Caroline.
No Dilúvio, coleta foi realizada nesta quarta-feira (24), com apoio de técnicos da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). A pesquisadora reforça que o estudo pode ajudar as prefeituras e o governo do Estado a entender melhor por onde o vírus está circulando mais, comparar as áreas de contaminação e, a partir daí, aplicar restrições e políticas mais específicas. “Já que não podemos testar todo mundo, podemos monitorar a circulação do vírus e ver onde estão os focos de contaminação”, ressalta.
O estudo será apresentado à Secretaria da Saúde do Estado, com o intuito de viabilizar recursos para sua ampliação. Nesta primeira fase, o trabalho analisará 50 amostras até metade de julho e a intenção é conseguir estender a pesquisa para 10 meses e com abrangência em outros pontos do Estado. “Seria importante viabilizar isso, pois acreditamos que a cada semana, com o aumento de casos positivos, vão aumentar também as amostras positivas, por isso buscamos novos focos exatamente em regiões mais próximas de arroios, de alta concentração populacional e vulnerabilidade social”, completa Caroline.
Alguns resultados esperados
- Identificar precocemente e monitorar comunidades infectadas
- Auxiliar na tomada de decisão nas medidas de distanciamento
- Monitorar a presença do coronavírus em áreas sem saneamento básico (em especial nas de maior vulnerabilidade social e densidade populacional)
- Gerar impacto econômico positivo ao fornecer informações necessárias ao acompanhamento da Covid-19, na impossibilidade de testagem em massa
- Após período pandêmico, ter como alertar a presença de vírus, antecipando os casos e atuando com rapidez para conter a transmissão local da doença
Amostragem em Porto Alegre
Foram selecionados pontos estratégicos de coletas nos Sistemas de Esgotamento Sanitário (SES) que representassem a maior parte da população: Navegantes, Ponta da Cadeia e Salso. Neste último encontra-se a maior unidade de tratamento de esgoto do Rio Grande do Sul: a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Serraria, que integra as SES Ponta da Cadeia, Cavalhada, Zona Sul e Salso. Também foram selecionados quatro hospitais de grande porte – públicos e privados – que recebem pacientes com Covid-19.