Com o estudo de viabilidade da Hidrovia da Lagoa Mirim -que ligará comercialmente o sul do Brasil ao nordeste do Uruguai- entregue ao governo brasileiro na semana passada, o planejamento de ações prioritárias para sua execução, como dragagem e sinalização da obra, passam a ser fundamentais no período que virá após a licitação, prevista para ser lançada ainda este ano. No entanto, alinhado à necessidade de regulação do transporte de cargas e de construção de terminais portuários, o trabalho da concessionária que assumir o projeto passa também pela operacionalização e atualização da estrutura da Eclusa do Canal São Gonçalo, em Pelotas, fundamental para garantir a navegabilidade da hidrovia.
Localizada na margem esquerda da barragem do canal e sob responsabilidade operacional e de manutenção da Agência de Desenvolvimento da Bacia da Lagoa Mirim (ALM) e Universidade Federal de Pelotas (UFPel), a Eclusa foi concluída em 1977. Estrutura hidráulica disposta no Canal São Gonçalo, seu funcionamento é considerado vital para a região, pois garante a segurança hídrica e qualidade da água, utilizada tanto para consumo de cidades da Zona Sul do Estado como para irrigação das lavouras e arrozais. Sua função é impedir a intrusão de água salgada oriunda do mar- e que passa pela Lagoa dos Patos- no Canal São Gonçalo e em direção à Lagoa Mirim.
A operação das comportas da Eclusa, que não se destinam ao escoamento das águas, se dão de acordo com as necessidades de passagem das embarcações que já utilizam o Canal São Gonçalo como hidrovia. De acordo com o coordenador da Agência de Desenvolvimento da Bacia da Lagoa Mirim (ALM) e professor da UFPel, Gilberto Collares, a intrusão de águas oceânicas na Lagoa Mirim é condicionada pela intensidade dos ventos da região e pela condição de nível existente no local. Por conta dessa característica, a obra de construção da Eclusa do Canal São Gonçalo foi autorizada pelo governo federal em 1972, e concluída cinco anos depois.
Atualmente, segundo Collares, a estrutura necessita de investimentos de mais de R$ 31 milhões para manutenções preventivas e corretivas, já que a obra tem mais de 45 anos. O planejamento da Eclusa, por exemplo, não é feito para navegação em período de estiagem, quando ocorre a irrigação do arroz na região, se consome mais água e o nível hídrico baixa, dificultando a navegação. Pontos como esses precisarão ser considerados.
"Nossa expectativa (com a hidrovia) é das melhores, mas será necessária uma manutenção corretiva e preventiva de toda a estrutura da Barragem e sua Eclusa para que a Hidrovia da Lagoa Mirim entre em funcionamento pleno. Atualmente, as dificuldades de recursos comprometem a manutenção e operação da estrutura. Mesmo assim, os esforços da UFPel e da ALM mantêm essa importante estrutura pública, que vai muito além da hidrovia e que garante a segurança hídrica e o desenvolvimento econômico e social dessa importante bacia hidrográfica. Precisamos de todo um trabalho preventivo sempre, e não corretivo", comenta Collares.
Outro ponto destacado pelo professor como necessário de ser revisto para o funcionamento pleno da hidrovia diz respeito à ponte férrea sobre o Canal São Gonçalo, "que também requer manutenção e operação adequada e atenta", considerado outro gargalo do trecho.
Segundo ele, os investimentos em batimetria (medição da profundidade das águas), sinalização, dragagem e balizamento (sinalização que garante segurança à navegação) do projeto também serão fundamentais para deixar a Eclusa e a Barragem do Canal São Gonçalo em condições de uso para a hidrovia.
"A hidrovia terá de se estabelecer de acordo com o tamanho da Eclusa, são questões que deverão ser acertadas ao longo do projeto para efetiva operação. Estamos torcendo para que aconteça com maior brevidade possível. Dificuldades para toda a operação não haverá, desde que haja recurso para isso. A Eclusa é fundamental para dar condições de navegabilidade ao Canal São Gonçalo", comenta o professor.
Em 2017, estudo apresentado pela ALM ao governo federal apontou que seriam necessários para a manutenção corretiva e operacionalização da Eclusa e da Barragem cerca de R$ 2 milhões por ano. Desde então, os repasses não chegaram a esse montante - o previsto para 2022 deverá ficar em torno de R$ 500 mil, por exemplo. No entanto, a UFPel colabora para a manutenção da estrutura, e recursos de pesquisa também são destinados a garantir o funcionamento de todo o processo.
A ECLUSA
- Localizada na margem esquerda da Barragem do Canal São Gonçalo, a Eclusa do Canal São Gonçalo possui 120 metros de comprimento, 17 metros de largura e 5 metros de profundidade
Sua estrutura hidráulica é formada por uma câmara central, delimitada lateralmente por um diafragma de concreto armado e o fundo é protegido por uma camada de britaEm cada extremo da Eclusa está instalada uma comporta basculante, cuja finalidade é controlar o nível de água da câmara para a passagem das embarcações. Também há duas comportas flutuantes de manutenção.É operada por guincho de acionamento eletromecânicos, através de cabos de aço.A captação das águas do Canal São Gonçalo e Lagoa Mirim é utilizada para o consumo humano das cidades de Rio Grande, Capão do Leão e Pelotas e para atender significativas áreas de arroz irrigadas por inundação na abrangência da bacia hidrográfica.
CANAL SÃO GONÇALO
- O Canal São Gonçalo está situado na Bacia Hidrográfica da Lagoa Mirim e faz a ligação entre a Laguna dos Patos e a Lagoa Mirim.
É um manancial hídrico com significativa importância econômica e ambiental para a região sul do Brasil e suas águas são utilizadas para diversos fins, como abastecimento, irrigação e pesca.
A ALM
- A Agência de Desenvolvimento da Bacia da Lagoa Mirim (ALM) foi criada por decreto federal em 26 de maio de 1994, quando da transferência para a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) do acervo técnico-científico e patrimonial, bem como da administração das obras da Barragem e Eclusa do São Gonçalo.
Como instituição de apoio administrativo, técnico e financeiro, atua de forma complementar ao Ministério do Desenvolvimento Regional e junto ao Uruguai, no aproveitamento dos recursos naturais e hídricos da Bacia da Lagoa Mirim, comuns aos dois países.