Porto Alegre não terá mais leilões de índices construtivos – o Solo Criado, que corresponde a mais metros quadrados em uma construção na comparação com o básico que se pode erguer em cada terreno. A decisão chega pouco mais de um ano após o governo de Sebastião Melo (MDB) ter informado que os leilões seriam
anuais e um mês depois de um certame
deserto. Como consequência dessa decisão, a prefeitura propõe a extinção do Fundo Especial Pró-Mobilidade (Funpromob), herdeiro do fundo para obras da Copa e que recebia seus recursos dessa fonte.
“O leilão perdeu atratividade”, justifica Rodrigo Fantinel, secretário da Fazenda da capital. A avaliação é que, como consequência da nova diretriz adotada pela administração municipal, que agora tem
venda direta dos índices de qualquer tamanho, de acordo com o estoque disponível, a disputa entre os empreendedores não faz mais sentido. Para o município, o recurso do solo criado seguirá entrando, mas com outros dois destinos: os fundos de Habitação (índice não adensável e pequeno adensamento) e de Gestão do Território (médio e grande adensamento), ambos geridos pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade. O saldo do Funpromob (R$ 15,2 milhões) irá para o Fundo de Reforma e Desenvolvimento Municipal e seguirá carimbado até esgotar sua aplicação.
O modelo de gestão do solo urbano que estabelece um índice básico para a construção e comercializa o potencial restante até o máximo definido pelo Plano Diretor é considerado uma forma de financiamento da cidade. Assim, a ideia com as vendas por lote era limitar a oferta e arrecadar mais recurso por meio da disputa entre os interessados. Mas isso já não acontecia mais, explica Fantinel: “nos últimos leilões (com venda, em
2021 e
2020), não teve concorrência. Todos já sabiam quem compraria cada lote. O mercado aprendeu que não tem porque discutir entre si para pagar mais caro”.
A alteração da lei para permitir compra de solo criado em balcão, como é chamada a negociação direta, vem da gestão anterior. Em 2019 o ex-prefeito Nelson Marchezan (PSDB), atendendo a uma demanda do mercado, autorizou que fossem vendidos índices acima de 1 mil metros quadrados vinculados a um projeto de construção – antes, essa metragem só poderia ser adquirida em leilão. Porém, uma falha de procedimento na tramitação do projeto, à época, fez com que a lei fosse questionada pelo Ministério Público do Estado no ano seguinte. Um acordo fez com que a proposta fosse reapresentada e aprovada este ano. As regras valem desde 2019, mas a alteração recente desobriga a apresentação do Estudo de Viabilidade Urbanística no momento da compra.
“Com a mudança, o empreendedor que queria comprar índice e tinha que necessariamente aguardar o leilão, agora pode ir ao balcão. Isso permite que não precise desembolsar antes, agora compra quando vai efetivamente usar”, complementa Fantinel. Outra vantagem ao mercado da aquisição direta é o parcelamento da compra, que via leilão deveria ser paga à vista.
Falando em FUNDOS MUNICIPAIS
Área adensável: é a parte de uma edificação utilizada para morar ou trabalhar; gera impacto no entorno, como mais pessoas circulando nas ruas, mais veículos, demanda por energia, água e serviço de esgoto
Área não adensável: são as demais áreas de uma edificação, como o corredor, as escadas, o elevador; como são locais de passagem, não geram adensamento (concentração de pessoas) e não contam para o impacto na infraestrutura
Índice construtivo: medida urbanística para a construção
Potencial construtivo: o quanto pode ser construído em um terreno, que varia entre o básico e o máximo definido pelo Plano Diretor (em Porto Alegre, vai de 1 a 3 vezes a área do terreno)
Solo Criado (ou outorga onerosa do direito de construir): compra de índices construtivos para alcançar o máximo potencial construtivo permitido para um terreno
Estoque de índices construtivos: potencial de construção definido pelo poder público por quarteirão e para regiões da cidade; considera fatores como infraestrutura e fomento ao crescimento
Histórico do Solo Criado em Porto Alegre
1994 - instituída a primeira lei que regra a compra de índices construtivos
1999 - Plano Diretor dedica um capítulo ao Solo Criado e apresenta os conceitos de pequeno, médio e grande adensamento
2001 - Estatuto da Cidade cria o instrumento da Outorga Onerosa do Direito de Construir, equivalente ao Solo Criado
2009 - é criado o Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social (FMHIS)
2010 - cria o Fundo Municipal de Planejamento Urbano, que dividia recursos com o FMHIS; já revogada
2019 - lei complementar regra o tamanho para adquirir índices em balcão e o destino dos recursos; institui a compra por contrapartida; cria o Fundo Municipal de Gestão de Território
2020 - coletivo AtuaPOA questiona a criação do novo fundo e a falta de audiência para alterar as regras do Solo Criado
2021 - Ministério Público Estadual acolhe parcialmente o questionamento do coletivo e cobra do município a revogação da lei e debate com a sociedade; município firma acordo, garantindo que a lei anterior seguisse valendo durante o trâmite; foi realizada audiência pública virtual
2022 - passa a valer a nova lei para compra de índices construtivos em balcão; leilão realizado em outubro não tem vendas e prefeitura decide acabar com este modelo de venda do Solo Criado