Estudo divulgado nesta quarta-feira (27) aponta uma 'explosão' no número de trabalhadores com contratos determinados nas empresas no Rio Grande do Sul, diz o pesquisador Guilherme Xavier Sobrinho, do Departamento de Economia e Estatística (DEE), que sucedeu a extinta Fundação de Economia e Estatística (FEE), no governo estadual.
Com base nos dados da Relação Anual de Relações Sociais (Rais), alimentada por empregadores, Sobrinho mostra que o número saltou de 11.001 contratações, em 2017, ano da reforma, para 362.503 em 2019, dois anos depois. Ou seja: um crescimento de 3.200% no mercado empregador gaúcho.
Com essa escalada, o peso desse tipo de vínculo na estrutura do mercado formal foi transformado. De 0,4% das vagas, passou a 12,3% no período analisado. Sobrinho explica que o estudo comparou 2019 com 2017 justamente para verificar a influência da última grande mudança na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O ano de 2020 não foi incluído porque os dados da Rais ainda não estão disponíveis.
No Brasil, também houve um mega salto, mesmo que percentualmente inferior ao do Estado. Segundo o estudo, o aumento foi de 1.658%, passando de 294,1 mil para 5,2 milhões de postos, 10,9% do total. Já o contrato indeterminado, que significava 79,4% dos vínculos em 2017, passou a 67,9%, 12,1 pontos percentuais a menos. Os funcionários públicos respondiam por 12,3% e passaram a 11,7%, refletindo uma perda de espaço que se acenutua na última década, lembra o autor do estudo pelo DEE.
"A fisionomia do mercado mudou de forma muito rápida", conclui o pesquisador, sobre os dois anos analisados na esteira da reforma.
A reforma mexeu no prazo da contratação por tempo determinado, que já existia, mas que passou a ser de até dois anos, podendo ser prorrogada uma vez, e nos direitos na rescisão. A modalidade turbinada não prevê pagamento ao trabalhador de multa de 40% sobre o saldo do FGTS na demissão sem justa causa e aviso prévio, duas situações asseguradas na versão clássica por prazo indeterminado. Já indenização de férias e 13º proporcionais e retirada do FGTS são asseguradas. Para firmar os contratos, é preciso observar peculiaridades da legislação.
Sobrinho não considera que apenas a mudança na legislação pode explicar as mutações na estrutura do mercado, mas para ele é o maior fator. Enquanto houve o salto no contrato determinado, as vagas indeterminadas reduziram 12,9% no mercado gaúcho - eram 2,3 milhões postos em 2017 e passaram a 2,01 milhões em 2019 -, e 10% no Brasil, passando de 34,5 milhões, em 2017, para 31,05 milhões em 2019.
Prazo determinado é trabalhador com 'check-out', diz pesquisador
"Essa forma de contratação 'rotativa' é uma perda e reforça a precarização do mercado trabalho", opina Sobrinho, resumindo o efeito de regras com menos vantagens. "Tivemos expansão de vinculos formais, mas que não seguem os mesmos direitos da CLT básica", contrasta.
"No tempo determinado, o trabalhador já entra com a mala pronta para sair, com check-out contratado, o que pode mudar no engajamento e na produtividade do trabalho", adverte o pesquisador, sobre itens que podem demarcar as fronteiras dos vínculos.
Dá para dizer que o mercado formal de trabalho no Brasil, aquele que, em geral, tem carteira assinada, pode ser dividido hoje entre CLT 'raiz' e 'nutella', termo associado a 'modernidades' em setores ou comportamentos. O contrato por tempo determinado, turbinado na última reforma trabalhista, é a CLT nutella, que mostrou o crescimento vertiginoso.
A "explosão" do contrato determinado nas empresas puxou a participação desse vínculo no agregado, pois há outras versões com menor representatividade, desde avulso e temporário. No total de vagas formais, o segmento respondia por 2,9% das contratações, em 2017, e pulou a 15,3% em 2019. Com isso, o Estado é o quarto na proporção e fica à frente de economias mais ricas e até mais comparáveis, como São Paulo e Minas Gerais e Paraná. O Brasil passou de 3% para 13,9% de participação dos determinados.
Sobrinho não vê uma razão clara para isso, mas pode ser porque alguns setores passam a ter maior uso desse vínculo. Na indústria de alimentos, estes contratos chegam a 22%, seguido por 21,8% no comércio atacadista e 20,6% na construção civil.
A remuneração média também varia dependendo do prazo. Na versão indeterminada em empresas, o trabalhador recebe R$ 2.603,96 no Estado e R$ 2.611,31 no Brasil. Os vínculos determnados têm salários médios de R$ 2.032,35 nas empresas gaúchas e R$ 2.212,92 nos empregadores no País.
Os homens têm maior fatia nas vagas com prazo, respondendo por 59,5%, ante 40,5% das mulheres. Já no indeterminado, a diferença é menor, com a mão de obra masculina com 55,8% das vagas e a feminina, com 44,2%.
No mercado formal, o Estado acumula déficit na reposição de vagas. Desde 2014, não há aumento no número absoluto de vagas. Naquele ano, o estoque era de 3,1 milhões de postos formais. Em 2015 e 2016, a queda foi mais aguda, com recuo em 2017 e 2018, mas mais suave, define o pesquisador. Em 2019, houve alta de 2%, ou mais 57 mil vagas, sobre dois anos antes, ficando em 2,957 milhões de contratos. O Brasil terminou 2019 com 47,5 milhões de vagas, ante 46,3 milhões de 2017.
Base da Rais é alimentada pelo eSocial
O pesquisador recomenda que é preciso ter alguma cautela com os dados da Rais, que passou a ser alimentada em 2018 pelo eSocial, que é preenchida também pelas empresas. Ainda há as duas frentes: a digital e a do formulário clássico. Sobrinho diz que a equipe técnica da Secretaria de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia - o atual governo extinguiu a pasta do Trabalho -, emitiu nota técnica explicitando que pode ter imprecisão devido ao uso de metodologias diferentes.
"A coleta é feita de outra forma e agora podem ser captados dados que antes não eram disponibilizados que pode gerar diferenças de crescimento ou redução", exemplifica o pesquisador. "Os técnicos assumem que precisa ter cautela." A adesão ao eSocial segue a adoção obrigatória por tamanho de empresa. O novo sistema é alimentado mensalmente e há fechamento anual.
"Agora as empresas que informam todos os meses", . O efeito, quando a sistemática se consolidar, é ter disponibilidade mais rápida das informações para análise das mudanças e transformações do mercado, a partir de informações como número de trabalhadores, tipo de contrato, carga horária e remuneração.