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Cinema
Hélio Nascimento

Hélio Nascimento

Publicada em 03 de Abril de 2025 às 20:32

Resenha do filme Parthenope, de Paolo Sorrentino: Uma vida

Parthenope, novo filme de Paolo Sorrentino, é uma reflexão sobre a beleza em meio aos cenários de Nápoles

Parthenope, novo filme de Paolo Sorrentino, é uma reflexão sobre a beleza em meio aos cenários de Nápoles

/WARNER BROS PICTURES/DIVULGAÇÃO/JC
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Hélio Nascimento
O diretor Paolo Sorrentino concorreu no Festival de Cannes do ano passado com este Parthenope, ficando com o direito de exibir antes das apresentações o símbolo daquela mostra. Já é uma vitória ser selecionado para um evento que, reunindo interessados de todo o mundo, necessita eleger pouco mais de duas dezenas para a competição oficial. Sorrentino é claramente um ambicioso seguidor de Federico Felllini, um dos gigantes que dominaram o cinema italiano a partir dos anos 50 do século passado. Assim como seu modelo, o cineasta procura olhar a realidade de uma forma na qual a ironia é um instrumento usado para que seus exageros reveladores sejam tornados mais visíveis. O cenário é a cidade de Nápoles e um dos momentos mais significativos das intenções do realizador é a cena do ritual de São Genaro, felliniano do primeiro ao último plano, algo que lembra a cena do milagre em A doce vida. A personagem principal tem o nome de uma das sereias e durante todo o filme, interpretada com perfeição pela atriz Celeste Dalla Porta, ela é a portadora de fascínio e encanto que irão encaminhar os demais personagens para situações que afastarão o véu que esconde personalidades verdadeiras. Da mesma forma, a trajetória da protagonista permitirá ao espectador contemplar as verdades ocultas da cidade, aquela que o esplendor da natureza e a ostentação permitida pela riqueza acumulada ocultam.
O diretor Paolo Sorrentino concorreu no Festival de Cannes do ano passado com este Parthenope, ficando com o direito de exibir antes das apresentações o símbolo daquela mostra. Já é uma vitória ser selecionado para um evento que, reunindo interessados de todo o mundo, necessita eleger pouco mais de duas dezenas para a competição oficial. Sorrentino é claramente um ambicioso seguidor de Federico Felllini, um dos gigantes que dominaram o cinema italiano a partir dos anos 50 do século passado. Assim como seu modelo, o cineasta procura olhar a realidade de uma forma na qual a ironia é um instrumento usado para que seus exageros reveladores sejam tornados mais visíveis. O cenário é a cidade de Nápoles e um dos momentos mais significativos das intenções do realizador é a cena do ritual de São Genaro, felliniano do primeiro ao último plano, algo que lembra a cena do milagre em A doce vida. A personagem principal tem o nome de uma das sereias e durante todo o filme, interpretada com perfeição pela atriz Celeste Dalla Porta, ela é a portadora de fascínio e encanto que irão encaminhar os demais personagens para situações que afastarão o véu que esconde personalidades verdadeiras. Da mesma forma, a trajetória da protagonista permitirá ao espectador contemplar as verdades ocultas da cidade, aquela que o esplendor da natureza e a ostentação permitida pela riqueza acumulada ocultam.
Sorrentino não é, certamente, o primeiro a transformar a figura mitológica em personagem de uma narrativa inspirada no poder das sereias em dominar a todos com seu canto. O cineasta talvez conheça a ópera de Handel, estreada em Londres, no ano de 1730. Ou então a desconhece, utilizando em algumas cenas A valsa triste, de Sibelius, o que não deixa de ser um acerto por mesclar um gênero que exalta o movimento eterno, como Kubrick provou em seu 2001, com manifestações de extrema melancolia, como a que domina e termina levando à morte de um dos personagens, após a repressão a seus impulsos incestuosos. É que todo filme está estruturado sobre o conflito entre instinto e cultura, impulsos eróticos e religião, agressividade e civilização. Toda a sequência do milagre, que termina com uma encenação que procura substituir o que não termina acontecendo no altar, resume uma das temáticas da obra, que procura evidenciar a força de certos rituais para controlar e disciplinar comportamentos. Nápoles é a cidade-cenário, mas certamente isso não impede que espectadores que acumulam críticas e ressentimentos sintam a universalidade da manifestação da diva que retorna e não hesita em lançar críticas severas ao local e seus habitantes. Nem o Brasil escapa de Sorrentino, representado, através de citação, por um cirurgião plástico que termina deformando o rosto de uma atriz.
Outro aspecto a ser destacado no filme é o paralelismo entre inteligência e beleza. A protagonista não é apenas uma sereia. Ela também fascina o professor que termina elevando-a como sua substituta, ao constatar que está diante de um cérebro privilegiado. Mas este professor tem um segredo oculto, que, ao ser revelado, faz o filme se aproximar de uma fantasia que procura afirmar que a bondade pode por vezes estar oculta em uma forma que se aproxima do grotesco, outra digital felliniana presente. E como a protagonista está quase sempre perguntando, estamos diante de uma obra que abre espaço para meditações. E ao terminar com uma bela cena seu relato sobre diversas formas da natureza humana, Sorrentino também focaliza sentimentos relacionados ao vivido e que nunca será repetido. O canto vai aos poucos mergulhando na noite, até deixar que o silêncio reine e que a memória exerça seu papel. Eis um filme realizado por um cineasta disposto a utilizar recursos antes descobertos, mas que ainda estão repletos de sugestões indicadoras de caminhos que podem levar o cinema para novas etapas. Até por ser um olhar atento sobre o comportamento humano, um indispensável valor para o cinema de verdade. O diretor também recorre a um personagem real, um escritor americano vítima do álcool e de indecisões que o transformam em um sofredor. Está completo o painel formado por criaturas reais, às vezes enriquecido pela fantasia e perturbado pelo grotesco.
 

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