Do encontro, que durou 45 minutos no começo da manhã em São Caetano do Sul, sede da companhia no Brasil, com o presidente da GM Mercosul, Carlos Zarlenga, e outros dirigentes, Leite recebeu algumas encomendas da empresa sobre condições da operação no Estado, onde fica a fábrica considerada uma das mais modernas no mundo da marca, com maior volume de produção no País e que é alvo da terceira ampliação em 20 anos, com aporte prometido de R$ 1,5 bilhão.
A GM quer rever aspectos do acordo da operação logística no porto do Rio Grande, por onde ingressam os carros produzidos na Argentina e saem os nacionais, e ainda o diferencial da alíquota de frete interestadual, que sofreu mudanças em 2018. O antecessor José Ivo Sartori acabou com a isenção em 2018. Leite diz que vai levar à exame da área da Fazenda e responderá em nova reunião, em 15 dias, desta vez no Palácio Piratini. "No que estiver ao alcance do Rio Grande do Sul, tudo será feito, mas evidentemente dentro do razoável", adiantou o governador, ao falar com o Jornal do Comércio, logo após a conversa com a GM.
Leite citou ainda que a permanência no Estado depende mais de mercado e tratativas com São Paulo e sindicatos e apontou que o teto de definição deve ser fevereiro, segundo prazo dado pela GM. Ciente do peso da negociação com o governador paulista, João Doria, o governador pretendia abordar o tema em encontro com o colega ainda nesta quarta-feira. A montadora tem de apresentar relatório até abril sobre o que já executou do novo investimento inserido no Fundopem gaúcho, citou Leite. Zarlenga disse que a direção global da montadora exige fim de prejuízos que são registrados há cinco anos.
A empresa negocia com sindicatos a revisão de benefícios para reduzir custos.
Jornal do Comércio - Com qual impressão o senhor saiu da reunião com a GM? A operação está em risco ou ameaçada?
Eduardo Leite - Algum risco há na medida em que a empresa está buscando globalmente se reestruturar. Foi passado que as operações no Brasil e Mercosul respondem por 5% do mercado global da marca e que a companhia tem tido prejuízo nos últimos cinco anos e que a nova CEO global determinou revisão em mercados para buscar equilíbrio, e é isso que está sendo feito, com negociação com sindicatos para reduzir custos operacionais, e, em paralelo, negociar com o governo para investimentos. Este mercado exige atualização de produtos para manter a fatia de mercado. No RS, são R$ 1,5 bilhão para dois novos produtos a partir de 2021. A empresa negocia com São Paulo aportes nas plantas de São José dos Campos e São Caetano do Sul. A manutenção das atividades para superar o desequilíbrios passa pelo sucesso na negociação com sindicatos e com o governo de São Paulo. Se as operações forem diminuídas (em São Paulo), não se consegue manter mercado só com produtos do Rio Grande do Sul. O Estado depende da negociação com São Paulo para manter o investimento da GM. A empresa tem a expectativa de que as negociações evoluam e que no mês de fevereiro possa ter decisão sobre investimentos no Brasil e no próprio Rio Grande do Sul.
JC - Mas os investimentos anunciados em meados de 2017 já não estão encaminhados? Isso não está acontecendo já?
Leite - Para o nosso controle, os investimentos, segundo as regras do Fundopem para incentivos que viabilizaram o aporte (R$ 1,5 bilhão), têm de ser apresentados em abril deste ano pela empresa, quando seremos notificados se os investimentos estão acontecendo. 15% do total de investimento terá de ter sido executado até abril.
JC - O prazo de definição é fevereiro, então?
Leite - A empresa está negociando com os sindicatos e o governo paulista. A expectativa deles é que em fevereiro seja resolvido, pois não podem ficar aguardando equilíbrio para projetar investimentos determinantes para a sobrevivência da marca no País. Eles tomam as medidas, fazem as negociações, esperam decisão em assembleia (trabalhadores) e projetam investimentos. As duas coisas casadas é que vão garantir a manutenção das operações no Brasil e no Rio Grande do Sul. Saímos com boas expectativas da reunião. Vamos receber a diretoria da General Motors nos próximos 15 dias no Estado.
JC - O senhor espera que os trabalhadores e sindicatos cedam?
Leite - A manifestação até agora é dos sindicatos, mas precisa ter decisão em assembleia. Temos expectativa que haja bom senso de parte à parte - tanto da empresa como do grupo dos funcionários, tendo em vista que o País vem de uma recessão profunda e estamos submetidos a condições do cenário internacional, como a da Argentina, que tem sua crise também. Isso (negociação) exige esforços compartilhados para a manutenção das atividades.
JC - A GM quer rever itens tributários do acordo com o Estado?
Leite - A empresa apresentou alguns tópicos que vamos discutir nos próximos 15 dias. Vamos levar à exame da Secretaria Estadual da Fazenda. São pontos de ajuste e não de nova concessão de benefícios. Há questões em logística na operação no porto do Rio Grande e no diferencial de alíquotas entre os estados.
JC - A empresa pediu redução de alíquota?
Leite - Estamos passando agora por um momento de alteração da implementação de benefícios fiscais em função da implementação da Lei Complementar 160, que estabeleceu regras nacionais para benefícios, que devem ser convalidados nos estados regionalmente. Algumas coisas estão se alterando na concessão e na operação de incentivos. Havia o benefício de isenção de frete nas operações interestaduais que foi suspensa no governo anterior (de José Ivo Sartori). A GM trouxe isto à discussão. A Fazenda vai examinar, mas à luz da nova legislação que coloca limites na concessão de benefícios, pois a regra foi feita para amenizar os efeitos da chamada guerra fiscal. Vamos avançar na próxima reunião com a GM nestes temas.
JC - A situação fiscal do Estado coloca limites a mais concessões ou o senhor acha que tudo tem de ser feito para não perder a fábrica?
Leite - É importante deixar claro que há fatores alheios à própria negociação com o estado, como mercado, tratativas em São Paulo e com sindicatos, que interferem no custo da operação e atratividade de manter negociações. No que estiver ao alcance do Rio Grande do Sul, tudo será feito, mas evidentemente dentro do razoável. Temos disposição de discutir benefícios numa atividade economicamente relevante ao Estado. Incentivos individualmente conferidos à montadora geraram a atração da empresa no fim dos anos de 1990, além de benefícios para Gravataí, à população e mais arrecadação de ICMS. É pertinente manter a discussão com a empresa para manutenção das atividades no Estado.
JC - Muitos criticam ou questionam este modelo dizendo que a empresa é atraída por incentivos, monta fábrica e pode sair a qualquer momento. Esta situação está colocada agora?
Leite - Passando dessa questão para a de benefícios e desenvolvimento, acho que isso comprova que temos de apostar em novos mercados que se abrem. Na verdade, o mercado de automóveis é importante, gera seus empregos, mas é uma indústria do passado. A gente tem uma nova indústria que precisa ser incentivada, em tecnologia e startups. A indústria do automóvel está sofrendo diante de uma nova realidade econômica e de relações sociais, o impacto dos aplicativos de transporte. Tudo interfere nesse mercado. É importante mostrar a condição de diversificação da nossa economia e vamos ter de apostar em novos setores. Não tenho problema em trabalhar numa lógica de benefícios para atração de investimentos, mas tem de ser especialmente conferidos a setores que interessam ao Estado. O automotivo é ainda interessante e atraente, o que justifica que o Estado promova a discussão de benefícios ao setor.
JC - O Estado conseguiria se refazer da perda de um investimento como esse?
Leite - Estou confiante que não haverá perda.
JC - No passado, o PT pagou uma conta alta com a saída ou desistência da Ford em montar uma fábrica aqui. Qual é o impacto que teria ao seu governo caso haja a saída da GM?
Leite - Insisto, estou confiante de que não haverá saída. A conversa foi muito boa e positiva para identificar saídas que não são radicais e são bastante razoáveis para que a empresa mantenha a atividade. Estou convicto de que a GM não sairá.