Nos últimos dias, intensificaram as discussões se um recolhimento mais severo da população impactaria tanto a economia que os desdobramentos da estratégia seriam ainda mais nocivos do que o próprio coronavírus. No entanto, economistas indicam que, se não forem tomados os devidos cuidados com a questão da pandemia, as consequências podem ser mais drásticas.
O diretor da Faculdade de Ciências Econômicas da Ufrgs, Carlos Henrique Horn, afirma que o melhor caminho para a saúde e a economia é seguir as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e aumentar os gastos do setor público.
Para o economista, é um falso dilema contrapor as duas áreas. Horn enfatiza que, o isolamento ser amplo ou restrito para combater a pandemia se trata de um assunto que cabe a especialistas médicos. Ele comenta que o fim imediato do isolamento e a migração para um quadro de suposta realidade, conforme as premissas sugeridas pela OMS, ao invés de melhorar as condições da economia, provavelmente as agravaria. O economista explica que, estando corretas as informações passadas pela classe médica, sair da quarentena hoje de forma massiva implicaria um número de letalidades muito maior e essa situação acarretaria custos mais elevados para a retomada da economia.
O diretor da Ufrgs sugere o aumento do dispêndio público, com a expansão de crédito, subsídio para as empresas e renda direta para os mais necessitados como forma de suavizar os reflexos. Esse incremento do gasto público, nesse cenário excepcional, conforme Horn, tem sido avaliado por várias correntes econômicas em 10% a 20% do PIB de cada País. "Nós não estamos fazendo isso no Brasil, aqui o nosso tímido conjunto de medidas anunciadas há alguns dias foi estimado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV) em nem 2% do PIB", lamenta.
A respeito do coronavírus, professores da Faculdade de Ciências Econômicas da Ufrgs lançaram manifesto com 32 sugestões de diretrizes e medidas de combate à pandemia e para a recuperação da economia. Entre as ações levantadas estão a intervenção no mercado de câmbio, instituir imposto sobre lucros dos bancos, ampliar o nível dos investimentos públicos, sobretudo em infraestrutura e energia, e suspender a tramitação da chamada "PEC emergencial" e de demais medidas que significariam fortes restrições ao combate à pandemia e à recuperação da economia brasileira.
Sobre a proposta apresentada por Fiergs, Farsul e Fecomércio de retorno gradativo das atividades econômicas, permitindo que as empresas possam operar com 50% de pessoal nas suas atividades a partir do dia 1º de abril, e retomando a 100% em 6 de abril, Horn pondera que as entidades para apresentar uma orientação como essa precisariam consultar especialistas em saúde. Além disso, sustenta que o ideal seria trazer esses profissionais a público para discutir com os outros agentes envolvidos no combate a pandemia. Ele reitera que se trata de uma questão médica se o isolamento será mantido amplamente ou restringido.
O professor dos MBAs da FGV/Decision Robson Ribeiro Gonçalves diz que se a proposta das entidades fosse feita em junho, para a retomada em 1 de julho, ele seria "o primeiro assinar". Porém, neste momento, o economista não concorda com a ideia. De acordo com ele, as prioridades vão mudar ao longo da evolução da própria pandemia.
Profissionais e empresas terão que se adequar
Os próximos meses serão de adaptação das atividades econômicas, com o mínimo contato social possível, antecipa o professor dos MBAs da FGV/Decision Robson Ribeiro Gonçalves. Ele enfatiza que vários segmentos estão se reinventando, como garçons atuando com delivery ou a difusão da telemedicina para alguns diagnósticos. A própria FGV está mobilizada na realização de cursos à distância.
Gonçalves considera que o País vive uma economia de guerra. "Empresas ressuscitam, pessoas não, um empresário pode quebrar e pode dar a volta por cima, uma vida humana não tem retorno, não tem recuperação judicial", sustenta. Apesar das dificuldades, ele ressalta que a realidade que se vê nos noticiários é relativa a um cenário mais urbano, no interior, por exemplo, o agronegócio continua funcionando. "É importante que as bases das cadeias produtivas continuem operando", reforça. No caso dos grandes centros, o professor aponta que essas cidades terão que fazer o máximo de uso possível da tecnologia para praticar o trabalho à distância e manter o isolamento social.
O economista e assessor de investimentos na Messem Investimentos Álvaro Villa também não considera que haja uma dicotomia entre saúde e economia. "Não podemos voltar ao que era antes, não fazer quarentena, não é uma via ou outra", frisa. Ele comenta que se os sistemas de saúde e de transporte fossem mais eficientes no País, seria mais fácil manter uma condição mais próxima da normalidade, mas esse não é o caso do Brasil.
Apesar de admitir que são necessárias iniciativas de cuidados com a população, Villa projeta que a situação vivida hoje pode encaminhar muitas pessoas para a marginalidade. Entre as estratégias que podem ser tomadas para atenuar o cenário, o economista cita uma real complementação de renda, por parte do governo federal, para as pessoas que precisarem ficar recolhidas e forem afetadas. Outro caminho plausível seria a redução da carga tributária para as empresas. O assessor de investimentos na Messem Investimentos frisa que a garantia de uma renda básica é uma obrigação do governo. Quando houver a retomada, Villa prevê que o setor do comércio e estabelecimentos como restaurantes e shopping centers serão os mais demandados pela população.