Eu odiava quando a minha mãe me falava das coisas que ela me alertara e eu, que já fui "millenial", não prestara atenção e depois quebrava a cara. E lá vinha ela com aquele insuportável "eu te falei".
Eu te falei, Facebook.
O Facebook é uma empresa admirável, com contribuição incrível à nossa seminal capacidade de conexão e comunicação. Graças a ele, eu posso falar com meus colegas de escola, ver meu filho em segundos, entender melhor o sentimento das pessoas com quem me relaciono todo dia ou com quem me relaciono só pelo Face.
Eu amo o Facebook e não vivo sem ele. Mas ninguém pode viver sem limites. Nem eu, nem você, nem qualquer empresa ou organização.
E hoje gigantes praticamente recém-nascidos, como Facebook, Amazon e Google, não têm limites. E precisam ter. Como lá atrás foi dado limite a gigantes de telefonia, energia e finanças. Não é moderno defender isso. Mas prefiro senhores no Supremo a "millenials", ainda que às vezes eles se engalfinhem como "millenials".
Há um ano, eu comecei a bater no Facebook. Meus sócios reclamaram. Meus mídias ficaram constrangidos. Meus amigos do Facebook, gente que eu adoro, ficaram em saia justa.
Na semana passada, a empresa perdeu bilhões de dólares em valor de mercado. E certamente eu não fui a única pessoa a alertar o Facebook sobre seu descaso irresponsável com "fake news", conteúdos ofensivos e radicais, ambientes publicitários poluídos. Sem falar do seu comportamento arrogante e imperial com as comunidades que nele atuam.
O Facebook é como uma rede de TV que não se responsabiliza pelas notícias e publicidade que aparecem nela e cujos aparelhos de TV assistem à vida dos seus telespectadores e vendem dados e privacidades dessas vidas sem o devido cuidado.
Além disso, Facebook e Google precisam tomar mais medidas para não enfraquecerem o pilar fundamental da democracia, a imprensa.
Foi isso o que eu disse em 2017. E é por isso que esse patrimônio da humanidade, usado por mais de 2 bilhões de pessoas no mundo, está sofrendo.
Mas essa empresa e seu fundador são admiráveis. A prova é o próprio Facebook, ou sua face iluminada. É preciso também dar a outra face à luz. E, nesse processo, consertar brechas e atalhos facilmente usados para ações ofensivas, agressivas e abusivas.
Depois de uma reação tímida às revelações de uso indevido de dados dos usuários, estamos todos aguardando mais de Mark Zuckerberg e seu time. No domingo, eles publicaram anúncio de página inteira em grandes jornais dos EUA e do Reino Unido que esperamos seja o início de uma nova resposta, mais eficaz e transparente, às questões perturbadoras levantadas nas últimas semanas. O título do anúncio era sugestivo: "Temos a responsabilidade de proteger seus dados. Se não conseguimos, não os merecemos". Era assinado pelo próprio Zuckerberg.
Quando voltou a Harvard, no ano passado, para receber título da universidade que largou para desenvolver o Facebook, Zuckerberg falou de como todos nós precisamos buscar nosso propósito na vida e ainda ajudar os outros a encontrar os seus. Ele citou uma visita de John F. Kennedy à Nasa. Quando o presidente norte-americano perguntou a um faxineiro o que ele fazia na agência espacial, ele respondeu: "Estou ajudando a levar o homem à Lua".
O Facebook não é uma criação só de Zuckerberg e associados. É de todos nós. Vamos pressionar e ajudar o Facebook a retomar o seu caminho. Não tenho dúvidas de que conectar pessoas pode ser a maior arma de criação em massa da humanidade.
Publicitário e fundador do Grupo ABC