O deputado estadual reeleito Vilmar Zanchin foi o nome indicado pelo MDB para presidir a Assembleia Legislativa no sistema rotativo entre os partidos com maiores bancadas da Casa. Em sua condução, quer trazer para o Parlamento o tema que já é considerado prioridade pelo governo composto pelo seu partido: a Educação.
Zanchin deseja levar a Assembleia para as comunidades e utilizar as representações que têm os deputados federais no convencimento cultural sobre os benefícios do contraturno nas futuras escolas de tempo integral no Rio Grande do Sul.
Segundo ele, os parlamentares também devem fazer parte de discussões nacionais como a reforma tributária, que deve pode proposta pelo governo federal ainda este ano. "A Assembleia não pode ficar alheia a esse tema porque isso inevitavelmente vai interferir na receita dos Estados e dos municípios", afirma Zanchin, nesta entrevista especial.
Jornal do Comércio - Como espera que seja este ano à frente da presidência do Legislativo?
Vilmar Zanchin - Eu vou cumprir a missão da melhor maneira possível, seguindo um acordo que já existe aqui na Assembleia há mais de 15 anos, da gestão compartilhada, onde as quatro maiores bancadas dividem a tarefa da gestão da Casa e vão se revezando na presidência. Vou atentar àquilo que preconiza o nosso regimento interno, que está estabelecido na lei maior, e fazer a representação externa do poder Legislativo, mantendo sempre a independência e, claro, tendo uma relação harmoniosa e respeitosa com os demais Poderes e instituições.
JC - Como o poder Legislativo pode ser protagonista em pautar as principais questões do Estado, e não apenas ser provocado pelo Executivo?
Zanchin - Todos os debates ocorrem nesta Casa. Claro que a iniciativa, por conta inclusive daquilo que está estabelecido na legislação, faz com que o Executivo tenha até prerrogativas maiores no início de algumas legislações. Mas a Casa não se omite diante de qualquer tema que interesse à sociedade, sejam eles em sistemas momentâneos, como a estiagem. Tem outros assuntos que fatalmente serão discutidos aqui na Casa, nos órgãos técnicos ou no plenário, mas também nós queremos ter neste ano um assunto onde a Assembleia seja protagonista. Vamos propor um debate muito amplo dentro da Casa no tema da educação. Nós (RS) já figuramos no passado indicadores da educação no Brasil que eram muito melhores do que aqueles que temos hoje, agravado pela pandemia. Nós precisamos colocar esse tema no centro dos debates e é isso que nós vamos propor neste ano, não apenas internamente, mas também ouvindo a sociedade com encontros que faremos nas mais diversas regiões. A gente sabe que o próprio governo tem também esta área como prioridade e nós queremos contribuir para que haja avanços no setor educacional. E aí vai além da estrutura física das escolas, com a questão de remuneração dos profissionais da área da educação, mas também construirmos políticas públicas visando à profissionalização dos nossos alunos, que precisam ser inseridos no mercado de trabalho. A questão da própria inovação da tecnologia que tem que estar muito presente dentro dos nossos educandários e preparar o nosso corpo docente para os desafios que estão nesse mundo tecnológico, nesse mundo que se transforma de maneira muito rápida. Acho que a Assembleia não pode ficar alheia a esse debate. Nós temos que estar inseridos nessa discussão e, mais do que isso, ser um agente de motivação na sociedade para que esse assunto seja discutido e que todos se envolvam no debate do tema da educação.
JC - A secretária da Educação coloca que o principal desafio para as escolas de tempo integral seja cultural. O Parlamento, como agente na sociedade, vai auxiliar nessa questão?
Zanchin - O poder Legislativo é o único poder onde 100% da sociedade gaúcha está representada e, portanto, nós temos essa condição de estarmos presentes em todos os meios da sociedade para debater um assunto como esse da educação. Além da questão da estrutura física, é também essa questão cultural das famílias desejarem que os seus filhos estejam mais tempo na escola. Nós vamos procurar fazer esse debate, essa discussão, chamando todos os deputados, de todas as vertentes políticas, para discutir a importância da educação, dos alunos estarem mais tempo em sala de aula e buscar o conhecimento, a formação, se preparando para o mercado de trabalho e para a vida. É um tema que é consenso dentro desta casa. Tem esse sentimento de que a educação merece essa atenção e chegou o momento de nós discutirmos além dos poderes.
JC - A Assembleia teve uma taxa de renovação grande a partir da eleição. Ao que o senhor atribui esse movimento?
Zanchin - Não é de hoje que tem ocorrido uma alteração, uma mudança na composição do Parlamento. Na eleição passada não foi diferente. Isso é em função de toda uma nova relação que a sociedade, os eleitores têm com a política e os políticos. Nós estamos num processo de transformação, inclusive dos próprios partidos. Esta mudança se dá em função de um novo contexto que nós vivemos no Brasil e no mundo, do próprio questionamento do papel do representante. Mas cada um eleito ao seu modo, no seu tempo, procura fazer o melhor e o grande desafio que nós temos é acompanhar esta visão e essa mudança que nós presenciamos na sociedade. Estarmos conectados com esta sociedade que se transforma, que evolui e que exige mais dos seus representantes.
JC - Ao contrário da eleição nacional, pôde-se observar três vias claras no pleito do gaúcho. Acredita que Eduardo Leite precisará enfrentar oposição tanto na esquerda quanto na direita na Assembleia?
Zanchin - Não, eu acho que todos os partidos, as bancadas que estão postas, vão procurar fazer com que as suas ideias, os seus pensamentos sejam colocados. E se traduz em palavras e também em votos. Mas eu confio muito na capacidade da posição política de centro de, através do diálogo, do equilíbrio, fazer esta mediação entre as posições mais aos extremos. O próprio governador e o vice-governador têm demonstrado isso, que têm todas as condições de apresentarem não apenas aqui para dentro da Casa, mas também para a sociedade, as suas propostas, respeitando as posições diferentes, mas buscando sempre o entendimento, o equilíbrio e a busca de um consenso. Acredito que os debates poderão ser até acalorados em determinados momentos, mas o governo também, através da sua liderança nesta Casa, deverá buscar e encaminhar as matérias através do diálogo, da discussão, do equilíbrio e do respeito a todas as posições.
JC - O governo colocou que a agenda desse governo não seria tão polêmica.
Zanchin - Nós tivemos no primeiro mandato do governo Leite, e também do governo Sartori, matérias que tramitaram nesta Casa… algumas até que eram disruptivas. Falar em privatização até o governo Sartori era quase um tabu. O governo teve coragem de encaminhar essas matérias: reforma administrativa, reforma da previdência, que começou lá no governo Sartori e teve a conclusão no governo Leite, inclusive com a deliberação aqui em Plenário. É claro que fez com que houvesse uma pressão externa para dentro da Casa muito maior em relação àquilo que se anuncia que poderá vir de matéria agora. Sobre esse aspecto, eu diria que nós não teremos a repetição de anos que foram tensos dentro da Assembleia. No entanto, quais os projetos que o governo vai encaminhar para cá eu ainda não sei. E qual será o grau de tensionamento de debate também não saberia dizer. Mas é evidente que as matérias que eram mais tensas no debate, de enfrentamento, já passaram. Que eram as questões das privatizações, as reformas, que, por ora, não se vislumbra de vir matéria semelhante agora.
JC - Que outros temas além, da educação, o senhor considera que sejam prioridade para o Estado nos próximos quatro anos?
Zanchin - Tem algumas pautas que nós, o Legislativo, poderemos colocar, como essa da educação, dentro das comissões técnicas. Tem outros que a própria sociedade ou as circunstâncias nos impõem. Por exemplo, a questão da estiagem é um fenômeno da natureza que fatalmente virá para dentro desta Casa. Se confirmando de termos mais uma estiagem, talvez uma das maiores dos últimos anos, nós seremos provocados para tomar iniciativas no sentido de que o Estado encontre alternativas de apoio aos municípios, aos agricultores. Um outro assunto que nós deveremos nos envolver, se tiver avanços, é a reforma tributária, que está tramitando no Congresso Nacional e que o Governo Federal tem dito que ao longo deste primeiro semestre vai levar para votação. A Assembleia não pode ficar alheia a esse tema porque isso inevitavelmente vai interferir na receita dos Estados e dos municípios.
JC - Como o senhor avalia esse início de condução da reforma tributária pelo governo federal, com a nomeação de Fernando Haddad (PT) para o Ministério da Economia e Bernard Appy para conduzir a reforma?
Zanchin - Quanto à nomeação dos ministros por parte do governante, acho que nós temos que respeitar, com tanto que cada indicado cumpra bem a sua missão. Se não cumprir, não corresponder àquilo que lhe foi dado como missão, deve ser substituído. O Appy participou de um debate aqui quando nós tivemos um projeto de reforma tributária no Rio Grande do Sul. Quando eu era líder da bancada, chamamos ele para conversar com a nossa bancada sobre esse assunto. É um profissional reconhecido no Brasil, inclusive é um dos grandes responsáveis pela PEC 45 que está tramitando no Congresso Nacional. Eu acho que nós precisamos de uma reforma tributária no Brasil onde nós tenhamos a redução da carga tributária para quem produz e a simplificação do sistema. Só que nós temos que ter um cuidado. Não podemos retirar recursos dos entes federados, que são os mais demandados, que são os municípios e os estados. O município não pode ter perda de receita e o Estado também não. Para cumprir com o seu papel, não pode ter redução do seu orçamento. Aqui no Parlamento, nós, os deputados estaduais, podemos fazer também essa intermediação entre os municípios, ser também uma voz em defesa do nosso Estado e colaborar no sentido de encontrarmos o equilíbrio para produzirmos uma legislação tributária que seja moderna, avançada e que concilie a redução da carga tributária para quem produz, para quem consome, e que nenhum município tenha qualquer tipo de problema em função de uma mudança brusca na arrecadação. Não é uma tarefa fácil, é uma tarefa muito árdua, mas que eu acho que se nós conseguirmos unir todas as forças vivas da sociedade, é possível encontrar uma legislação que atenda a todos dentro de um prazo que seja interessante para aplicar a nova legislação.
JC - Como acredita que o País conseguiu chegar ao ponto de ter uma invasão na Praça do Três Poderes, que muitos classificam como golpista, no atentado e 8 de janeiro?
Zanchin - Esses movimentos extremistas nós percebemos no mundo. Ocorreu nos Estados Unidos, aqui no Brasil também. Nós temos que compreender esses fenômenos que acontecem em muitos países do mundo. Quanto a esse episódio do dia 8 de janeiro, eu condeno veementemente. Você depredar um bem público, ainda mais a sede dos poderes da República, é inaceitável. Não interessa quem são os agressores, os depredadores, se são da direita ou da esquerda, são condenáveis sempre. Isso é em decorrência de uma polarização que nós vivemos no Brasil nesses últimos anos entre esquerda e direita e nós esperamos que teremos a partir de agora uma pacificação do País. Eu confio muito na construção de uma política de centro, onde nós temos o equilíbrio que se respeite, que se ouça todas as posições, mas que nós buscamos sempre o entendimento através do diálogo para se avançar, para se construir políticas públicas, para se tomar decisões que beneficiam a todos os brasileiros, a todos os gaúchos. Não é com falta de diálogo, não é com extremismos que nós vamos construir avanços na nossa sociedade. Por isso que eu confio muito que quem venceu a eleição tenha iniciativas no sentido de que nós possamos caminhar para esse horizonte, de termos um futuro mais sereno, mais tranquilo. E que quem perdeu a eleição saiba que nós vivemos numa democracia. Tem que ser respeitado o resultado das urnas e que se prepare para a nova eleição. Não tem outro caminho, quem pensar diferente disso pode querer outra coisa que não as vias democráticas para se chegar e exercer o poder.
PERFIL
Vilmar Perin Zanchin tem 50 anos e é natural de Marau. É casado e pai de dois filhos. Começou a vida política como líder estudantil. É advogado formado pela Universidade de Passo Fundo (UPF). Em sua cidade natal, exerceu mandatos eletivos de 1997 a 2021, entre eles o de vereador, vice-prefeito e prefeito, em duas oportunidades. Também foi presidente de entidades que representam os municípios do interior do Rio Grande do Sul, como a Associação dos Municípios da Encosta Superior do Nordeste (Amesne), a Associação dos Municípios do Planalto Médio (Ampla) e a Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs). Foi eleito deputado estadual pela primeira vez durante as eleições de 2014, com 41,4 mil votos, ereeleito em 2018. Nas eleições do ano passado, foi reeleito pela segunda vez, com 44,3 mil votos. Será presidente da Assembleia Legislativa do RS durante o ano de 2023, representando o MDB.