Jo�o Roberto A. Neves
Em 1808, ao desembarcar no Brasil, Dom João VI fundou o Conselho da Fazenda, para arrecadar os tributos que custeariam os gastos da coroa e de seus apaniguados. Nascia ali o embrião da atual Receita Federal do Brasil. Seus membros tinham o mesmo DNA dos chamados "letrados" de Portugal - os membros do Fisco, das Forças Armadas e do Sistema Judiciário - operadores de uma máquina ineficiente e corrupta, uma espécie de Estado paralelo, do qual os monarcas se tornaram reféns, tanto que, na Casa dos Contos, órgão de controle das receitas e despesas do Reino, eram constantes as investigações com o fim de apurar a falta de prestações de contas à Fazenda, as quais geralmente não surtiam nenhum efeito. De Dom João VI até os dias atuais, o Estado foi se amoldando ao antigo modelo institucional português. O "estamento burocrático" é consequência desse amoldamento. A Receita foi gerada nas entranhas desse estamento.
Com os olhos de Argos Panoptes para contribuintes decentes e laboriosos, os quais entregam cinco meses de seus rendimentos para o Brasil oficial se locupletar sob as mais diferentes formas, o Leão da Receita, no entanto, é o último a saber de tantos ilícitos praticados contra a ordem tributária, conforme provam operações da Polícia Federal.
O caso do chinês Wu Yu Sheng é ilustrativo. Sua movimentação financeira e seu estilo de vida eram incompatíveis com a renda que declarava para o Leão, R$ 2.533,32, quantia risível para quem operava para megadoleiros deste País, que mais tem órgãos fiscalizadores, como Coaf etc. Sheng remete a uma obra anônima, A Arte de Furtar, datada de 1744, e que foi "oferecida a El-Rei nosso senhor D. João IV para que a emende". Tal obra, erroneamente atribuída a Antônio Vieira, a qual faz parte do acervo da Biblioteca Nacional, continua atual: "Venham aqui todos os ladrões do mundo, (...) pilhem tudo quanto quiserem (...)". Acrescente-se: e nada lhes acontecerá!
Advogado