Com a entrega, nesta segunda-feira, ao Supremo Tribunal Federal (STF), de uma nota técnica subscrita por desembargadores, juízes, promotores e procuradores do Ministério Público apoiando a prisão em segundo grau, o julgamento do habeas corpus impetrado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no STF, marcado para esta quarta-feira, tende a polarizar totalmente a questão.
Tanto que manifestações a favor e contra a prisão em segundo grau estão previstas para hoje a amanhã, exigindo reforço na segurança do Supremo. Foram mais de 5 mil promotores, procuradores e juízes de todo o País que assinaram a nota técnica. Assim, a decisão dos ministros do Supremo terá repercussão no mundo jurídico e, mais ainda, junto à opinião pública nacional. Para alguns, a mudança da jurisprudência, nesse caso, implicará a liberação de inúmeros condenados, seja por crimes de corrupção, seja por delitos como estupro, roubo, homicídio etc. Para outros, aceito o habeas corpus, evitará afronta à Constituição. Em 24 de janeiro passado, Lula da Silva foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF--4). Depois, a Corte de apelação da Lava Jato rejeitou o embargo de declaração do ex-presidente. Pelo entendimento firmado pelo Supremo em 2016, Lula poderia ser preso após a condenação em 2ª instância. No entanto, o STF concedeu ao ex-presidente salvo-conduto até o julgamento final de seu habeas corpus, amanhã.
Para os peticionários a favor da prisão em segunda instância, o princípio da presunção de inocência, que consta na Constituição, ao longo dos tempos evidenciou-se de extremo valor para a liberdade individual e a sociedade civilizada. Suas implicações, no entanto, jamais foram reputadas absolutas. Também lembraram que não se trata de cláusula meramente declaratória em benefício de um cidadão, mas sim de parâmetros para o exercício legítimo da atividade de persecução criminal em favor da subsistência da sociedade. Aduziram que o referido princípio, enquanto tratamento dispensado ao suspeito ou acusado antes de sentença condenatória definitiva, tem natureza relativa. Em 17 de fevereiro de 2016, o Supremo Tribunal Federal confirmou, por sete votos a quatro, a prisão após a sentença na segunda instância. O então relator do caso, ministro Teori Zavascki, já falecido, destacou que o cumprimento da pena após o segundo grau é uma forma de harmonizar o princípio da presunção de inocência com a efetividade da Justiça.
Em 5 de outubro de 2016, a prisão em segunda instância voltou à pauta do STF, mas novamente por maioria dos ministros foi mantida. Segundo doutos na matéria, o termo presunção de inocência, se aceito absolutamente, levaria ao paroxismo de proibir até investigações de suspeitos, além da vedação de medidas cautelares constritivas no curso de apurações pré-processuais. Ensejaria a inconstitucionalidade de qualquer persecução criminal.
Porém, a presunção de inocência não consubstancia regra, mas princípio, sem valor absoluto. Deve ser balizada por outros valores, direitos e garantias constitucionais. A decisão de amanhã do STF fixará, ou não, posição por ele adotada. A prisão em segunda instância é legal mesmo que outros recursos possam ser apresentados. Assim, a defesa do ex-presidente Lula terá ainda recursos para serem acionados. As manifestações pró e contra a decisão do STF são democráticas. Mas, desde que em ordem e pacíficas, como, aliás, mandam a lei e a melhor conduta.