Luiza Fritzen
Com oito indicações ao Oscar e vencedor do Globo de Ouro de melhor drama, estreia na quinta-feira Moonlight: sob a luz do luar. Retratando uma história triste e, ao mesmo tempo, revoltante, o longa traz para o cinema uma jornada que é deixada à margem e que não é comum em Hollywood.
A obra foi inspirada em um projeto de faculdade do dramaturgo Tarell Alvin McCraney, In Moonlight Black Boys Look Blue, e faz uma crítica social ao abordar clichês como o jovem negro, o traficante e a mãe viciada. O roteiro foi adaptado por Barry Jenkins, que também dirige o filme, e expõe a importância do meio e das pessoas que nos cercam em nossa construção como indivíduo.
O drama mostra que, apesar da doçura e bondade que carrega em si, um ambiente hostil e a falta de assistência durante o desenvolvimento de um ser implicam no caminho que ele irá seguir. E é através de muitas surras que a essência pura de um menino é roubada.
Quase como fases da lua, a narrativa é dividida em três tempos para contar a trajetória de Chiron: quando criança, Little; já na adolescência, Chiron; e chegando a vida adulta, Black. Os três atores escolhidos para registrar esses diferentes momentos, Alex R. Hibbert (infância), Ashton Sanders (adolescência) e Trevante Rhodes (adulto), conseguem passar toda a dor reprimida e o vazio interno de quem se sente só no mundo e consigo mesmo.
Negro e pobre, filho de uma mãe drogada que se prostitui para sustentar o vício, o desfecho do filme pode parecer esperado, não fosse outro estigma que o jovem carrega. Rotulado como diferente, mesmo quando sua idade e maturidade não permitiam compreender em que sentido, Chiron não se adequa ao padrão de menino robusto que vive atrás de meninas. Seu único amigo, Kevin, é quem lhe guia na saga em busca de seu autoconhecimento e também dá início a outra decepção.
Estigmatizado em diversos níveis, sexualidade, raça e classe multiplicam as opressões e a fragilidade dos laços afetivos começa já em casa. Sua mãe, Paula (Naomi Harris), o trata de forma indiferente, sem zelo e sem amor, e é mais uma a lhe reprimir por sua sexualidade e comportamento fora do comum.
Estranhamente, é na figura de desconhecidos que o menino encontra refúgio. Fugindo de uma surra preparada por colegas, Chiron se esconde próximo a boca de fumo do traficante Juan, com quem começa uma amizade. Indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante, Mahershala Ali, conhecido por suas atuações em séries como House of Cards e Luke Cage, é quem interpreta a pseudofigura paterna e ensina ao menino alguns conceitos sobre a vida.
É com Juan que o personagem vive uma de suas poucas e mais felizes cenas ao conhecer o mar e aprender a nadar. No entanto, a relação entre os dois causa outra ruptura no menino quando ele liga os fatos e descobre que o vício da mãe é alimentado pelo traficante. Teresa (Janelle Monáe), namorada de Juan, é quem faz a vez de figura materna e se mostra preocupada com o menino apesar da ausência de laços sanguíneos. A soma da violência simbólica, física, psicológica e cultural que o personagem sofre resulta em um homem solitário e quieto, que não se abre e nem confia nas pessoas ao seu redor.
Moonlight concorre ainda nas categorias de melhor diretor, trilha sonora original, atriz coadjuvante, roteiro adaptado, fotografia e melhor montagem. A fotografia merece destaque pois valoriza o luar, o azul, o tom da pele dos atores e utiliza diferentes cores para registrar cada passagem da vida de Chiron. Outro aspecto que chama a atenção, sendo fiel à peça, é a ausência de personagens brancos, o que dá o tom de protagonismo negro à trama e permite que a questão da sexualidade se sobressaia à racial.
Sem reviravoltas e um ápice redentor, o filme faz um estudo do personagem em busca de aceitação e do quão solitário é descobrir quem se é com as influências externas. É uma história pessoal e, ao mesmo tempo, universal que permite o exercício da empatia a quem é capaz de entender a vivência e as dificuldades do outro.