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Publicada em 12 de Janeiro de 2025 às 18:49

'Projetos difíceis têm que ser votados no 1º ano', diz Comandante Nádia

Vereadora terá o desafio de dar conta de uma Câmara plural na votação de matérias polêmicas

Vereadora terá o desafio de dar conta de uma Câmara plural na votação de matérias polêmicas

THAYNÁ WEISSBACH/JC
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JC
Ana Carolina Stobbe, Bolívar Cavalar
A Câmara Municipal de Porto Alegre elege anualmente um vereador para presidir o Parlamento. A decisão é realizada mediante acordo estabelecido entre as bancadas na transição entre as legislaturas. O Partido Liberal (PL) foi o escolhido para comandar o Legislativo em 2024, quando Mauro Pinheiro ocupou o cargo pela sigla até a janela partidária, em que migrou para o PP. Agora, a legenda retorna à presidência com Comandante Nádia (PL).
A Câmara Municipal de Porto Alegre elege anualmente um vereador para presidir o Parlamento. A decisão é realizada mediante acordo estabelecido entre as bancadas na transição entre as legislaturas. O Partido Liberal (PL) foi o escolhido para comandar o Legislativo em 2024, quando Mauro Pinheiro ocupou o cargo pela sigla até a janela partidária, em que migrou para o PP. Agora, a legenda retorna à presidência com Comandante Nádia (PL).
Ao longo de 2025, Nádia precisará mediar um Parlamento bastante plural e, de certa forma, polarizado. Além disso, deverá dar conta da tramitação de projetos polêmicos e que podem ser votados no primeiro ano da legislatura, como a concessão do Departamento Municipal de Águas e Esgotos (Dmae) e a revisão do Plano Diretor da Capital, que está atrasada há pelo menos cinco anos. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, a vereadora comenta sobre os desafios do cargo e avalia a sua trajetória política.
Jornal do Comércio — Esta é a primeira vez que a senhora preside a Câmara Municipal. Como pretende comandar o Parlamento?
Comandante Nádia — Com legitimidade, eficiência e eficácia. Para ter agilidade dentro do que está preconizado no regimento da Câmara e não fique nada parado.
JC — Qual a importância de comandar a Câmara no primeiro ano da legislatura?
Nádia — O primeiro ano é importante porque são os projetos mais combativos e eu tenho certeza que tenho um pulso firme para fazer a coisa andar aqui. Então, mais por isso, para ajudar o prefeito Sebastião Melo (MDB) e a vice Betina Worm (PL), porque nós somos governo. No primeiro ano precisamos ter um presidente que bote uma rigidez e que coloque a Câmara nos trilhos para que a gente possa entregar serviço.
JC — Corre na Justiça um pedido de cassação de sua candidatura por abuso de poder político, em que foi absolvida em primeira instância. Como está acompanhando o processo?
Nádia — Estou muito tranquila. Isso mostra duas coisas: primeiro, que a verdade estava conosco, o Ministério Público e o juiz eleitoral enxergaram a verdade sob a nossa visão; segundo, a forma que o meu adversário tende a fazer política é tentando desconstruir seu adversário. Enquanto eu estava fazendo política, eles estavam tentando destruir a história da Comandante Nádia.
JC — A Câmara eleita tende a ficar polarizada neste ano, a partir do crescimento da oposição. Como pretende administrar uma legislatura tão plural?
Nádia — Vamos garantir sempre o tempo do vereador na tribuna. Não dá para um vereador ficar falando aos berros da galeria. A galeria tem que entender que tem um momento de manifestação e tem um momento em que o vereador, legitimamente eleito, vai poder falar com tranquilidade. Então, nós vamos trancar o tempo cada vez que for necessário, e não vamos deixar entrar mais pessoas do que o possibilitado através do nosso PPCI (Plano de Prevenção Contra Incêndio), e vamos tratar a Câmara com a forma do regimento. Quando tem regra, nada fica difícil. É muito fácil conduzir uma Câmara se tu leva tudo ao pé da letra.
JC — Durante o evento de condução do prefeito Melo ao cargo, a senhora falou em "abafar" a oposição. O que quis dizer com isso?
Nádia — Não é abafar suas posições, mas os maus comportamentos. Abafar não tem como, todo vereador aqui tem o seu momento, o seu tempo. Nenhum vai ser destituído da sua legitimidade de usar a tribuna. O que nós temos que abafar são atitudes de dizer uma coisa e fazer outra. Na reunião de líderes, por exemplo, tínhamos aprovado um novo "espelho de classe" para o plenário, fizemos uma votação e PT, PCdoB e PSOL aprovaram. Perderam no voto e tentaram mudar no plenário. Teoria e prática tem que casar e comigo não vai se criar isso, ou tu combina uma coisa e tá combinado, é fio do bigode, ou nós vamos ao rigor das leis.
JC — Quais são os principais desafios de 2025 na Câmara?
Nádia - Temos dois grandes projetos que vão ser debatidos e provocarão muita discussão, a concessão do Dmae (Departamento Municipal de Águas e Esgotos) e a revisão do Plano Diretor, que eu gostaria muito que acontecesse esse ano. Acho que vai ser uma discussão bem ferrenha aqui dentro da Câmara, mas vamos conduzir com a maior tranquilidade possível. O desafio do presidente é o de liderar líderes, e como eu venho da Brigada Militar sei bem como fazer esse comandamento. Além disso, tem as questões de zeladoria da Câmara e toda a parte administrativa.
JC — Como está o andamento desses dois projetos?
Nádia - O do Dmae já está bem amadurecido, ele já vem desde o ano passado. O prefeito Melo dá tempo ao tempo. Ele dá tempo para os vereadores entenderem o projeto, colocarem suas emendas, fazerem suas críticas e trazerem sugestões. Só que no ano passado, quando o projeto estava muito maduro, chegamos na eleição municipal. E para não permear uma questão politiqueira e trazer politicagem, ele decidiu não protocolar. Mas acredito que o projeto está bem maduro e que já pode ser feita uma discussão com responsabilidade para que já possa fazer essa votação o quanto antes.
JC — No dia da posse, Melo afirmou que poderia protocolar a concessão do Dmae já em fevereiro. Quando isso for feito, será dada prioridade ao projeto?
Nádia - Eu acho que todos os projetos que entram aqui são prioridades, tanto os do governo, quanto os dos colegas vereadores. Dado os ritos, dado os procedimentos, o que tem de prazos, nós vamos tocar. Não vou deixar nada parado e nós vamos fazer as discussões. Tenho bastante coragem de enfrentar as discussões necessárias. E entendo que os vereadores estão aqui não para ficar esperando, mas para efetivamente discutir as pautas, mesmo que sejam votadas negativamente. Eu acho que independente do resultado, se é sim ou se é não, a discussão sempre é válida.
JC — Na legislatura passada havia um receio de que houvesse dificuldade em aprovar a concessão do Dmae. Como observa o clima para a votação neste ano?
Nádia - No ano passado estávamos em um período eleitoral. Então, muitos vereadores tinham medo de perder votos por votarem sim ou não para a concessão. Neste ano, eu entendo que a base do governo vem forte e bem coesa, até porque tem menos partidos. Eu acredito que temos maturidade suficiente. Os projetos mais difíceis e que têm mais discussão precisam ser votados já no primeiro ano, para não correr o risco de pararem os trabalhos. Ano que vem já teremos eleições de novo.
JC — E em relação à revisão do Plano Diretor, acredita que ela será votada em 2025?
Nádia — A Câmara depende dos líderes e dos 34 vereadores, além da presidência. O Plano Diretor está há (mais de) 10 anos parado. Nós estamos tendo um crescimento desordenado da cidade, com mais de 800 ocupações, invasões, por falta do Plano Diretor. Então, eu espero que a Câmera tenha responsabilidade de não atrasar mais. Altura de prédio é o mínimo que ele fala, porque o Plano também é sobre meio ambiente e habitação. Eu espero que, principalmente a oposição, que possa vir a trazer dificuldades, se eles falam em habitação para as pessoas, o Plano Diretor é uma ferramenta que vai facilitar isso. Espero que exista coerência entre a teoria e a prática da oposição, que poderá sim trazer algum tipo de obstáculo e dificuldade para o Plano Diretor no segundo semestre ser votado.
JC — A Câmara foi impactada pela enchente e uma das funções da presidência é tratar da estrutura. Na semana passada, a senhora assinou a autorização para o início das obras de reforma do primeiro andar. O que deve ser feito?
Nádia - Em todo o primeiro andar vai ser retirado o piso, porque ele foi condenado com as águas, vamos fazer todo o forro, toda a mudança elétrica e de hidráulica também, e paredes. Nós vamos fazer uma reforma geral que, se Deus quiser, vai durar mais uns 30 ou 35 anos.
JC - Qual o valor da obra? Ela já tem prazo de conclusão?
Nádia - Eu empenhei o valor de R$ 3,4 milhões. Ou seja, assinei que vou pagar isso, o que será feito em partes. As obras iniciaram semana passada e a licitação prevê um ano para a conclusão. Eu conversei com os engenheiros e pedi para que sejam feitas em seis meses, mas eles falaram em oito meses. Vamos ficar negociando. Vai começar por todo o lado direito, porque é onde tem a maior concentração de funcionários.
JC — Vai ser necessária alguma outra reforma além desta?
Nádia - Vamos trocar o painel do plenário que está com problema há anos. Fora isso, o único problema é o ar-condicionado central, que é antigo e está no térreo. O próprio gerador dele foi inundado. E como é antigo, é difícil conseguir as peças para a manutenção, tanto que estamos com 50% do ar condicionado em funcionamento, não está 100% ainda.
JC — Sobre a sua trajetória política, se elegeu pela primeira vez pelo MDB, na segunda pelo Democratas e agora pelo PL, tendo passado também pelo PP. Como enxerga que sua posição política se alterou ao longo do tempo?
Nádia — Tive um amadurecimento político. Quando ingressei na política, fui convidada por amigos do partido, como os ex-governadores José Ivo Sartori, Germano Rigotto e Pedro Simon, além do ex-prefeito de Porto Alegre José Fogaça. Mas eu vi que a raiz do MDB não é a minha. Não são os mesmos valores. Eu comemoro o 31 de março (data do início da ditadura militar brasileira, em 1964), o MDB não, bem pelo contrário. E quando tu vê que está um peixe fora d' água, tu tende a procurar um outro ambiente em que tenha um maior conforto de dizer as tuas pautas e o partido estar na mesma "vibe". E aí encontrei o Democratas, que se não tivesse se fundido com o PSL eu estaria lá até hoje, mas virou o União Brasil, que não tem nada a ver comigo. Com a mudança, fui para o PP, e o PP gaúcho é nosso parceiro, mas o diretório nacional ingressou no governo Lula (PT) e isso eu não posso admitir. Por isso vim para o PL, que faz oposição ferrenha ao PT.
JC — Esse é o seu terceiro mandato como vereadora. O que acredita que mudou na Comandante Nádia ao longo desses anos?
Nádia - Eu aprendi um pouco mais dos meandros políticos. Descobri que a teoria e a prática são diferentes, e que a grande maioria daqueles que se dizem pela população estão cuidando do seu umbigo. Mas a política é maravilhosa e um instrumento necessário para qualquer tipo de mudança quando está nas mãos certas. E a melhor forma de fazer isso é com transparência, comprometimento, eficiência e eficácia.
JC — Em 2022, a senhora concorreu ao Senado pelo PP, mas abriu mão da candidatura um pouco antes do pleito
Nádia - Sim, três dias antes. Mas não foi para apoiar o candidato Hamilton Mourão (Republicanos) e, sim, para fazer frente contra o PT.
JC - E procura concorrer a outros cargos em 2026?
Nádia - Agora eu não estou pensando nisso. Estou muito focada agora na Câmara de Vereadores, no trabalho aqui. Além de eu ser presidente, eu saio daqui correndo e vou no meu gabinete atender. Eu sei dividir bem. Então, o trabalho ficou dobrado agora. Entendo que é baixar a cabeça e trabalhar muito.
JC - E mais adiante?
Nádia - Nada é descartado. Na política e na nossa vida tudo pode mudar em 10 minutos. Então, nada é descartado. Mas sempre digo: ninguém é candidato de si mesmo. A gente tem que ser candidato a partir de um desejo de pessoas do partido, é uma construção.
JC — O seu partido é o mesmo da vice-prefeita Betina Worm. Acredita que essa aproximação possa estreitar as relações entre o Executivo e o Legislativo?
Nádia - Com o PL, sempre. Mas os outros partidos da base também têm uma interlocução muito forte. O Melo é um prefeito do diálogo e que respeita o tempo de cada um. O PL é o governo, e não um aliado, porque somos o partido da vice. Então, óbvio que tem uma proximidade, seja para criticar ou seja para aprovar. Também fica mais facilitado o trabalho de receber os projetos antes e conversar sobre eles, para dizer "não é o momento desse projeto" ou de facilitar a entrada dele (na Câmara). Essa é a boa política dentro daquele espírito republicano democrático, em que a gente leva adiante os projetos quando gostamos, mas conseguimos fazer as críticas necessárias quando não gostamos.
 

Perfil

Nádia Gerhard, 56 anos, é graduada em Letras e se especializou em Psicologia Escolar pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs). Fez carreira na Brigada Militar, alcançando o cargo de tenente-coronel. Se tornou a primeira mulher a comandar um batalhão da Polícia Militar no Rio Grande do Sul, em 2007, quando ocupava o posto de major. Além disso, foi responsável por implementar e coordenar a Patrulha Maria da Penha no Estado. Sua estreia na política foi em 2016, quando elegeu-se vereadora de Porto Alegre pela primeira vez, à época pelo MDB. Em 2020, foi reeleita, dessa vez pelo extinto Democratas, tendo migrado ao PP ao longo da legislatura. Em 2025, iniciando seu terceiro mandato, agora pelo PL, presidirá pela primeira vez a Câmara Municipal da capital gaúcha.

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