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Publicada em 24 de Dezembro de 2024 às 07:45

Morre Alceu Collares, ex-governador do Rio Grande do Sul, aos 97 anos

Collares foi o primeiro e único governador negro do Rio Grande do Sul

Collares foi o primeiro e único governador negro do Rio Grande do Sul

TÂNIA MEINERZ/JC
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O ex-governador gaúcho Alceu Collares (PDT) faleceu às 2h40min desta terça-feira (24), aos 97 anos, vítima das complicações de uma pneumonia. Ele foi internado no dia 16 de dezembro no Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, onde foi acompanhado por equipe médica e familiares. Seu quadro permaneceu estável até a segunda-feira (23), quando o boletim médico informou um agravamento do estado de saúde. 
O ex-governador gaúcho Alceu Collares (PDT) faleceu às 2h40min desta terça-feira (24), aos 97 anos, vítima das complicações de uma pneumonia. Ele foi internado no dia 16 de dezembro no Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, onde foi acompanhado por equipe médica e familiares. Seu quadro permaneceu estável até a segunda-feira (23), quando o boletim médico informou um agravamento do estado de saúde
O governador Eduardo Leite decretou luto oficial de três dias em homenagem ao pedetista. O velório será realizado nesta quarta-feira no Palácio Piratini, das 9h às 16h, com abertura ao público a partir das 11h. O sepultamento será no Cemitério Jardim da Paz.
Na rede social X, Leite lamentou a morte e ressaltou o exemplo de Collares. Ressaltou que o pedetista foi o único governador negro do Rio Grande do Sul e que dedicou sua vida ao serviço público, sendo deputado federal, vereador e prefeito de Porto Alegre e governador do RS entre 1991 e 1995. E enalteceu o legado de luta pela justiça social, pelos direitos dos trabalhadores e pela educação, com a construção dos Centros Integrados de Educação Popular (Cieps), ação pioneira de escola em tempo integral, e pelo desenvolvimento do Rio Grande do Sul.
"Minha solidariedade aos filhos de Collares e à sua esposa, Neusa Canabarro, neste momento de dor. Que possam encontrar conforto na memória de sua trajetória e no reconhecimento de sua contribuição para nossa sociedade. O Rio Grande do Sul perde um grande líder, mas seu exemplo será eterno".
Também no X, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva referiu a morte de Collares, a quem definiu como "um dos grandes políticos brasileiros".
"Sempre defendendo os trabalhadores e as causas trabalhistas do País, Collares deixa um grande legado para o Brasil. Meus sentimentos aos familiares e admiradores deste grande brasileiro", disse no texto.
No Facebook, o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, também falou sobre o político gaúcho. "É com o coração apertado que nos despedimos de Alceu Collares, um amigo querido e parceiro de tantas batalhas no PDT. Ele foi um exemplo de coragem e dedicação à justiça social, e tive o privilégio de viver ao lado dele momentos marcantes na luta por um Brasil mais justo. Sua ausência será profundamente sentida, mas o legado que ele deixa continuará nos inspirando. Meus sinceros sentimentos à família e a todos que compartilham essa grande perda comigo".
Collares foi o primeiro e único governador negro do Rio Grande do Sul (1991-1995), assim como o primeiro prefeito negro de Porto Alegre (1986-1989). Sua gestão no Executivo Estadual ficou marcada pela criação dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento (Coredes) e por uma reforma na educação, conhecida pela implementação do calendário rotativo e pela construção de mais de 70 Centros Integrados de Educação Pública (Cieps), apelidados de "brizolões". 
Nascido em Bagé, em 7 de setembro de 1927, Collares cresceu em uma família pobre. Diferente dos pais, foi alfabetizado na infância, mas precisou deixar a escola aos onze anos de idade para ajudar no sustento da casa, vendendo frutas na quitanda de seu pai, João de Deus Collares. Em 1941, tornou-se carteiro e, em 1956, após concluir o Ensino Básico, se mudou a Porto Alegre para cursar Direito na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), onde graduou-se cinco anos depois. 
Na Capital, passou a se interessar por política, frequentando assiduamente os discursos do líder trabalhista Leonel Brizola na Praça da Alfândega. Foi assim que, em 1959, filiou-se ao Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Dois anos depois, apoiou a Campanha da Legalidade, movimento liderado por Brizola para garantir a posse de seu cunhado, o vice-presidente João Goulart, após a renúncia do presidente Jânio Quadros. 
Foi em 1963 que Collares concorreu pela primeira vez a um cargo eletivo. Conhecido pela atuação como líder sindical nos Correios e Telégrafos, obteve 3.147, conquistando uma vaga como vereador de Porto Alegre. Empossado em 1964, poucos meses antes da instalação da Ditadura Militar no Brasil, não teve o cargo cassado, diferentemente do seu correligionário e então prefeito Sereno Chaise. Com a imposição do bipartidarismo no País, migrou para o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que fazia oposição ao regime. 
Em 1966, concorreu a deputado federal, angariando mais de 16 mil votos. A quantidade, no entanto, não foi suficiente para elegê-lo, lhe garantindo a primeira suplência. Mantido na Câmara Municipal, se reelegeu como vereador de Porto Alegre em 1968, mais do que triplicando a votação obtida na primeira legislatura. 
Em 1970, tentou novamente emplacar uma candidatura à Câmara dos Deputados. Dessa vez, não apenas obteve êxito como foi o segundo político gaúcho mais votado, com quase 75 mil votos, sendo superado apenas por Sinval Guazzeli, que concorreu pela Arena. No Congresso Nacional, foi vice-líder da bancada do MDB e da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Reeleito em 1974, foi o primeiro em número de votos, conquistando 120 mil sufrágios. A façanha se repetiu em 1978, quando garantiu 112 mil eleitores. 
Ao longo de seus mandatos como deputado federal, Collares realizou críticas ao modelo econômico do Brasil. Com foco em demandas populares, ele apoiou a liberdade sindical, a criação do seguro-desemprego, a participação dos trabalhadores nos lucros das empresas, o direito à estabilidade e a alteração dos critérios de definição do salário-mínimo, de modo a acompanhar o custo de vida.
Além disso, organizou junto com outros parlamentares oposicionistas o programa do MDB que foi transmitido em rede nacional de rádio e televisão. Nele, deputados como Aldo Fagundes, Alencar Furtado, Franco Montoro e Ulysses Guimarães defendiam a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte e uma revisão da política salarial. 
A convite de Brizola, concorreu pelo PDT ao governo do Rio Grande do Sul pela primeira vez em 1982, na primeira eleição direta para o cargo desde a instalação da Ditadura. Entretanto, foi superado no pleito por Jair Soares, à época filiado ao PDS. 
Em 1985 concorreu a mais uma eleição, dessa vez à prefeitura de Porto Alegre. Seu vice foi Glênio Peres, um ex-colega na Câmara Municipal que havia tido seu mandato cassado pela Ditadura em 1977. A chapa foi eleita com 45,6% dos votos, ganhando do principal opositor, Carrion Junior, do MDB, que conquistou 30,7% do eleitorado. Foi no governo de Collares que a ex-presidente Dilma Rousseff (PT, 2011-2016) teve seu primeiro cargo público, como secretária da Fazenda.  
Com o lema "O Povo no Governo", a gestão de Collares no Executivo da Capital buscou garantir a participação popular nas decisões da prefeitura, em especial, no orçamento. Foi com base nisso que criou os Conselhos Populares. Além disso, focou em melhorias na saúde e na educação, implementando uma versão gaúcha das políticas educacionais que Brizola colocou em prática ao governar o Rio de Janeiro. Outra entrega foi a da primeira etapa do plano de urbanização da Orla do Guaíba. Em 1988, foi derrotado nas urnas por Olívio Dutra (PT) quando buscava a reeleição. 
Em 1990, apoiado pelo PT e pelo PMDB durante o segundo turno, Collares elegeu-se governador do Rio Grande do Sul, derrotando Nelson Marchezan, que concorreu pelo PDS, com 61,17% dos votos válidos. Mais uma vez, investiu na participação popular nas decisões governamentais a partir da criação dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento (Coredes). Também focou na redução dos cargos de confiança do governo e em mudanças na área da educação. Em 1994, planejava candidatar-se ao Senado mas acabou desistindo. 
Obteve mais dois mandatos como deputado federal, em 1998 e em 2002. Entre eles, tentou concorrer mais uma vez, no ano de 2000, à prefeitura de Porto Alegre, mas foi derrotado em segundo turno pelo petista Tarso Genro. A disputa foi marcada por uma intensa troca de críticas com o PT, fazendo com que o PDT deixasse a base do então governador Olívio Dutra (PT). Collares apenas se aproximou do partido no segundo governo de Luís Inácio Lula da Silva (PT), quando apoiou a candidatura do presidente e foi nomeado para o conselho de administração da Usina Hidrelétrica de Itaipu, onde permaneceu até 2016. 
Afastado de cargos eletivos, procurou sempre se manter ativo politicamente. Em 2013, tentou se tornar presidente do PDT, mas Carlos Lupi se reelegeu por aclamação. Em 2018, seu partido propôs sua candidatura ao Senado, mas Collares recusou alegando problemas de saúde. Em 2020, apoiou Manuela D'Ávila, à época do PCdoB, no segundo turno da disputa à prefeitura de Porto Alegre. Em 2024, assinou uma carta junto a outros ex-mandatários do Executivo da Capital em que criticavam a atuação do prefeito Sebastião Melo (MDB) durante as enchentes que atingiram o município. 
 

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