Prefeito reeleito de Caxias do Sul, Adiló Didomenico (PSDB) quer dar sequência aos projetos iniciados na atual gestão e avançar com as propostas afirmadas ao longo da campanha eleitoral. Entre os destaques, estão um projeto de concessão ou parceria público-privada (PPP) do parque da Festa da Uva e as tratativas junto ao governo federal para iniciar a construção de um novo aeroporto no município, que, na avaliação do prefeito, é estratégico para o desenvolvimento econômico da Serra gaúcha.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Adiló conta sobre o andamento dos projetos e avalia a atual situação política do PSDB, que vem perdendo representatividade nos últimos anos. O prefeito também fala de sua entrada na prefeitura de Caxias do Sul, que ocorreu após imbróglios envolvendo o chefe do Executivo municipal anterior, Daniel Guerra (REP), que sofreu um processo de impeachment.
Adiló Didomenico ainda comenta sobre como o poder público pode ajudar a impulsionar as feiras e indústrias de Caxias do Sul, que tradicionalmente são relevantes para a economia da segunda cidade mais populosa do Rio Grande do Sul.
Jornal do Comércio - Como avalia a gestão 2021-2024?
Adiló Didomenico - Assumimos o município talvez no pior momento que um prefeito pudesse assumir, em meio à pandemia, com um orçamento deficitário em R$ 230 milhões, com uma ação de indenização de uma área de quase 40 anos estourando - o pessoal já ameaçando bloquear as contas na segunda semana. O Fundo de Aposentaria dos Servidores, com um déficit de R$ 6,6 bilhões, consumiu R$ 780 milhões do (caixa)livre nos três primeiros anos. Aí tivemos dois anos de estiagem severa, que quase todo o Rio Grande do Sul passou, tendo que levar água para os agricultores. Depois disso, nós já fizemos 172 quilômetros de rede para levar água para o interior, coisa que nunca tinha sido feita um quilômetro. E aí, depois, convivemos com as quatro maiores enchentes da história: setembro, novembro, janeiro e a de maio, que foi avassaladora. Apesar de tudo isso, a gente conseguiu organizar as finanças do município e resolver o problema da Previdência dos funcionários, uma tarefa muito difícil, um desgaste político enorme. Imagina enfrentar isso, que eles tinham derrubado a obrigação de contribuir até o teto da Previdência e nós retomamos isso, com a base de um projeto de lei aprovado pela Câmara. Com tudo isso, conseguimos fazer muitas entregas, claro que nem perto daquilo que a gente gostaria de fazer, mas temos muitos projetos em andamento.
JC - Para próxima gestão, o que acredita que pode ser feito?
Adiló - Na próxima já está no nosso plano de governo a construção de uma nova UPA, temos duas, e vamos construir uma na zona sul para desafogar a UPA central. Já estamos em processo de licitação da telemedicina, que é uma necessidade até para tirar as filas dos postinhos e das próprias UPAs, e temos o Agenda UBS, que é a marcação de consulta por telefone que a gente começou, implantou em 14 - nós temos 48 UBS -, e a meta para esse próximo ano é levar para todas elas. Estamos também apoiando e trabalhando junto com a prefeitura de Vacaria para conquistar o terminal ferroviário em Vacaria, que para Caxias é muito importante porque teremos a vinda do aço - Caxias é o maior consumidor de aço do RS. Ele viria por linha féria até Vacaria, que dá 120 quilômetros. Hoje vem por via rodoviária, e custa muito caro. Então estamos apoiando, também vamos apoiar e trabalhar politicamente a conquista do porto de Arroio do Sal, que já foi assinada a ordem de início, e o aeroporto da Serra Gaúcha de Vila Oliva, que é o objetivo de no ano que vem a gente estar já, se Deus quiser, em obras.
JC - Sobre a questão aeroportuária, por que a decisão de construir um novo em vez de investir no Hugo Cantergiani?
Adiló - A Secretaria da Aviação Civil fez um estudo e não recomendou a ampliação do Hugo Cantergiani pela sua posição, pela incidência de neblina, mas acima de tudo pela proximidade dos prédios. Ao longo dos anos houve um descuido, e hoje ele não tem condições de alargamento de cone de aproximação, que é o grande problema para a aviação de maior porte. O novo local foi escolhido pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) em 2003 pela ausência total de neblina diurna, em uma área totalmente favorável, e nós adquirimos 453 hectares. Acredito que é uma das maiores áreas de destinação de aeroporto aqui da Região Sul. Com esses 453 hectares, temos condições de fazer um aeroporto de carga, cujo projeto é o que está pronto, e já está na Casa Civil. O ministro anunciou a liberação de recursos, o que depende agora de alguns detalhes de cronograma financeiro, físico, e também de a gente superar ali alguma questão ambiental que ainda está pendente. Mas a gente tem uma expectativa muito favorável, que, no máximo até janeiro, vá para a licitação de fazer a parte de infraestrutura. A parte de benfeitorias, que é a parte dos imóveis, esse é um projeto que está sendo finalizado agora, que está no seu prazo tranquilamente, porque enquanto você vai preparando a infraestrutura, você complementa o projeto dos prédios.
JC - É provável que a conclusão das obras ocorra após o seu mandato, que se estende até 2028. Mesmo assim, que benefícios acredita que este aeroporto pode trazer para Caxias e região?
Adiló - O aeroporto vai trazer um desenvolvimento muito grande para a Serra gaúcha, porque hoje mais de 60% dos passageiros que desembarcam no Salgado Filho têm o destino da Serra. Mas, para nós, além da questão do passageiro, o aeroporto da Serra gaúcha nos interessa muito para o transporte de carga. Mandamos hortifrutigranjeiros para 18 estados brasileiros, até para o Amazonas. O custo e a qualidade do produto que chega lá não são os mesmos se pudermos colocar no avião, e também para receber carga. Caxias hoje recebe carga rodoviária ou pelo porto de Rio Grande. É muito longe, custa muito caro. Para Caxias o terminal ferroviário de Vacaria é importante, mas o aeroporto é estratégico, é fundamental.
JC - Sua gestão apresentou uma proposta de PPP do parque da Festa da Uva. Como está o andamento deste projeto?
Adiló - No parque da Festa da Uva talvez a gente faça uma concessão. Mas é possível que seja uma PPP, talvez, mas acredito que ele se adéqua muito mais a uma concessão. É um parque maravilhoso, são 37 hectares no coração da cidade, e o que tem de melhor esse parque? Ele tem oito acessos. Isso é uma raridade para um parque. Ou seja, tem oito entradas ou saídas, tem uma boa área de estacionamento, mas ele precisa investimentos pesados para tornar ele muito mais rentável e também que ele seja o motor do turismo. Para isso precisamos ou a parceria ou a concessão, porque o poder público hoje não tem os recursos para fazer investimento. E outra: o nosso poder público, para esse tipo de função e investimento, o setor público não é o mais indicado. A iniciativa privada faz melhor que nós. A gente vai reservar algumas datas de interesse do município, como Festa da Uva, Festa do Agricultor, que a gente já começou, nos anos impar, é Festa do Agricultor, e, nos anos pares, é Festa da Uva.
JC - As feiras de Caxias têm grande relevância econômica. O que a prefeitura tem feito para potencializar estes eventos?
Adiló - Caxias tem hoje como segunda ferramenta que mais traz o público a área esportiva, por incrível que pareça. Incluindo os dois clubes de futebol, o Juventude e o Caxias, e o Caxias Basquete, mas também maratona, meia maratona, canoagem etc. Por isso, estamos investindo no parque automotivo. Agora, as feiras hoje ainda têm um peso maior.
JC - E como impulsionar mais?
Adiló - Precisamos espaços com maior conforto, porque uma das reclamações de feiras é que os nossos pavilhões não têm uma climatização, eles sofrem um pouco com problemas ainda de estrutura, de concepção, porque ele é um pavilhão aberto, então se gasta muito para fazer o isolamento. Caxias é sabido que tem um inverno muito rigoroso, e a gente se ressente de não poder fazer eventos no período de inverno, porque os nossos pavilhões não têm estrutura adequada.
JC - Resolvendo essa questão da climatização, Caxias poderia ter novos eventos no inverno?
Adiló - Com certeza, que é o que a Fenavinho (em Bento Gonçalves) fez. O nosso inverno seria muito propício pra trazer eventos gastronômicos etc. E aí tem um pavilhão que não tem uma boa estrutura.
JC - Caxias tem a marca de ser uma cidade industrializada. Como manter e incentivar essa tradição?
Adiló - Somos o segundo polo metalmecânico e pertencemos a uma região onde, num raio de 100 quilômetros, tem a maior diversidade industrial da América Latina. A nossa região de Caxias, englobando os municípios vizinhos, é da maior diversidade industrial. E como município, como é que a gente tem tratado isso para incentivar que não cesse o crescimento? Primeiro, com curso de capacitação de mão de obra, que é uma demanda constante dessas empresas. Segundo, baixamos o imposto para tudo que diz respeito à inovação e à tecnologia, para incentivar justamente a retenção de novos talentos em Caxias, e isso vem dando bom resultado. Então, reter novos talentos, dar curso de capacitação de acordo com a demanda dos sindicatos patronais, desburocratizando, tornando a máquina pública o mais leve possível e o mais ágil possível, dando a resposta para esses empresários - seja na área de licenciamento, seja na área de liberação de projetos. Nós alteramos o nosso código de obras recentemente para facilitar a vida de quem quer empreender em Caxias, aonde o nosso fiscal não entra mais da porta para dentro. A porta para dentro é uma relação profissional: técnico e seu cliente. Então isso já começa a trazer de volta a confiança dos investidores, porque é muito importante que se diga que se tem algo que não aceita ser maltratado em lugar nenhum do mundo é o capital. E pegamos 59 leis esparsas, confusas, uma sobreposta à outra, porque eram leis muito antigas, uma centena de decretos, revogamos todos os decretos e as 59 leis, e, em parceria com a Câmara de Vereadores, a gente escreveu uma única lei, simples, clara, objetiva, dando segurança jurídica para quem quer empreender em Caxias. Então esse é um gesto que hoje reputo muito importante para quem quer se instalar em Caxias.
JC - Como prefeito reeleito, se consolida como um dos principais nomes do PSDB ao lado do governador Eduardo Leite. Pretende concorrer a outros cargos?
Adiló - Eu vou cumprir esse mandato, até porque eu tenho compromisso com a população, mas veja bem: eu ajudei a fundar o PFL em 1984, e em 1986 saí do PFL, porque houve o ingresso de todo aquele grupo do ex-governador Jair Soares, do PDS e tal, e em 1988 eu ajudei a refundar o PTB e fiquei até 2020 no PTB. Foram 32 anos no PTB, fui presidente três vezes, me elegi vereador duas vezes pelo PTB. Só saí do PTB porque o presidente da época, Roberto Jefferson, não permitiu que eu fizesse coligação com a Paula Iores, que era do PSDB. E aí ficamos tentando que ele nos liberasse para concorrer a dobradinha que seria PTB e PSDB, o inverso do governo de Estado, já que o governo de Estado era PSDB e PTB, faríamos o contrário em Caxias. Chegou o momento da janela partidária, apertou, e aí tive o convite do Mateus Wesp, que era o presidente do PSDB, e fui para o PSDB e concorremos com chapa própria, foi muito arriscado. E hoje me sinto muito bem pela parceria que a gente tem com o governador Eduardo Leite, que é uma promessa, é um político jovem, eu dou certeza que é uma das grandes promessas da área política, e a gente tem tido uma parceria muito favorável com o governo do Estado, e Caxias precisa disso.
JC - Sobre o PSDB, o partido vem perdendo capital político ao longo da última década. Como avalia o futuro da legenda?
Adiló - Acho que muitas siglas no Brasil passarão por fusão ou reformulação, e é possível que com o PSDB também aconteça isso, porque acho que o partido errou estrategicamente na última eleição para presidente em não colocar candidato. Encolhemos muito o número de deputados por essa estratégia equivocada. O partido deveria ter colocado o candidato a presidente da República. Não importa se era o Eduardo Leite ou outro nome, enfim. E eu vejo, sim, hoje com muita preocupação esse declínio do PSDB, que tinha 32 deputados, na janela baixou para 20, e das urnas saiu com 13, então isso preocupa. Embora seja um partido que tem uma filosofia muito interessante, um partido de centro, um partido que tem valores muito importantes e lideranças aqui no RS muito boas. Estava aqui o prefeito de Santa Maria, (Jorge) Pozzobom, o prefeito eleito de Santa Maria, (Rodrigo) Decimo. Temos uma boa bancada liderada pelo deputado (Professor) Bonatto na Assembleia. Mas sim, hoje reconheço que o PSDB vai ter que se reinventar. Ou buscar a fusão, a federação com algum partido - e nós já temos ela com o Cidadania. Mas alguma coisa a mais tem que ser feita porque o partido precisa chegar mais forte na próxima eleição de presidente e governador.
Perfil
Adiló Didomenico tem 72 anos e é natural de Marau, Rio Grande do Sul. É graduado em Ciências Econômicas pela Universidade de Caxias do Sul e pós-graduado em Marketing pela Fundação Getulio Vargas. Foi comerciante por mais de 40 anos em Caxias do Sul. De 1989 a 1997, presidiu o Conselho Administrativo da Codeca e, entre 2005 e 2012, atuou como diretor-presidente da empresa, onde implantou a coleta mecanizada pioneira no País. Em 2012, elegeu-se para o primeiro mandato como vereador. No início de 2013, licenciou-se das atividades parlamentares para assumir como Secretário Municipal de Obras e Serviços. Em 2016, reelegeu-se à Câmara Municipal. Em 2018, concorreu a deputado estadual e ficou como suplente. Elegeu-se prefeito de Caxias do Sul em 2020 e, neste ano, foi reeleito, em segundo turno, com 51,38% os votos válidos.