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Publicada em 22 de Setembro de 2024 às 17:57

Melo propõe concessão do Dmae com drenagem urbana pública

Sebastião Melo (MDB) quer conceder parcialmente o Dmae

Sebastião Melo (MDB) quer conceder parcialmente o Dmae

Fotos: THAYNÁ WEISSBACH/JC
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Bolívar Cavalar e Lívia Araújo
Bolívar Cavalar e Lívia Araújo
Candidato à reeleição, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), vem apontando que parte dos problemas ocorridos na enchente deste ano precisa ser sanada por uma ação conjunta com as esferas federal e estadual de governo, inclusive para uma atualização do sistema de contenção de cheias na cidade.
O emedebista apresenta ações que já está realizando e que envolvem, em um primeiro momento, a recuperação de diques, o fechamento de comportas e o reparo de casas de bombas, ainda que defenda que à prefeitura caibam outras atribuições. "As obras de macro e microdrenagem, tratamento de esgoto, questão pluvial, bacias de contenção dentro da cidade são obra nossa".
Para tal, Melo pretende construir um modelo de concessão do Dmae que prevê "a extensão de rede de água e tratamento de esgoto para um parceiro privado", ponderando que o fornecimento de água e a drenagem urbana devem permanecer como serviços públicos.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Melo também avaliou a própria administração apontando um "saldo positivo", com pontos como a duplicação da Avenida Tronco e a diminuição de taxas e tributos.
Jornal do Comércio - O que já está realizando e ainda pretende realizar quanto à prevenção de desastres, como as enchentes?
Sebastião Melo - O Brasil precisa ter um programa nacional, com peculiaridades regionais e locais, de adaptação climática e prevenção. Os entes federados devem trabalhar juntos. O sistema de proteção de cheias veio da década de 1960, feito pelo Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS), extinto nos anos 1990. A quantidade de água que chegou ao Guaíba mostrou que o sistema concebido foi absolutamente insuficiente. Você tem que refazer emergencialmente o sistema de proteção existente. Já há duas obras em andamento: os diques dentro do Sarandi e da Fiergs. Temos empresas ganhadoras também para poder fechar 7 ou 8 comportas, e tem obras em duas casas de bomba, a 17 e a 18, e outras licitações para as casas de bombas, para mudanças também tecnológicas. São R$ 500 milhões, orçado pelo Dmae. Mas a partir do Cristal, ainda não tem proteção de cheia. Quem deveria fazer as obras é o governo federal, mas eles dizem que não farão as obras, e sim enviar o dinheiro. O mais apropriado seria o governo do Estado gerir, porque não há obra de proteção de cheia que não seja na bacia hidrográfica. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) tem uma diferença entre o anúncio e a execução. Esperamos que os valores do PAC contra as cheias sejam desburocratizados, porque a burocracia é tão grande para liberar um PAC, que entre o anúncio e o começo da obra, vai um tempo enorme.
JC - O que é responsabilidade específica da gestão municipal?
Melo - É responsabilidade da União a proteção contra cheias. Limpar o Guaíba, que nunca foi limpo, e desassorear o Guaíba das milhares de toneladas de areia é responsabilidade do governo do Estado. Limpar arroio é nossa. Todas as obras de macro e microdrenagem, tratamento de esgoto, questão pluvial, bacias de contenção dentro da cidade, isso é obra nossa, seja com dinheiro próprio ou buscando empréstimos.
JC - Na parte de arroios e drenagem, como avalia a gestão? O que precisa ser aprimorado?
Melo - Porto Alegre tem, sim, um drama de drenagem. Tanto é que quando eu disputei a última eleição, propus a parceirização do Dmae, para que todo o recurso que vier, deva ir para a drenagem urbana. O Dmae tem um orçamento que incorpora parte do que vai para a drenagem urbana, mas tem os seus limites também. Então, ao longo do tempo, o governo foi fazendo obras, mas o crescimento desordenado, o adensamento da cidade sempre foi muito maior do que a capacidade de infraestrutura. Essa é a realidade para todas as áreas. Cada governo vai correndo atrás de um pedaço, e acho que todos fizeram a sua parte, e estou fazendo a minha.
JC - Pretende dar sequência ao projeto de concessão do Dmae?
Melo - Chegamos a um modelo em que a água será produzida pelo Dmae, e você entrega a extensão de rede de água e tratamento de esgoto para um parceiro privado. No final de 2023, o Censo reduziu 70 mil pessoas na população, e o estudo para a concessão foi feito em cima de 1,4 milhão de portoalegrenses. Então o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) disse que eu teria de refazer. Em 2024, decidi que esse assunto não deveria ser levado à Câmara em ano eleitoral. Então, se for reeleito, vou retomar essa discussão e acertar o modelo. O Dmae continua público, cuidando da drenagem, da água e de todos os contratos da concessão. A regra é ter um edital e uma fiscalização bem feitos. Sem isso, não tem nenhum serviço concedido que vai ser bom.
JC - Na assistência social, a questão da população em situação de rua se agravou ainda mais com a enchente. Como pretende gerir isso, incluindo a prevenção de casos como o incêndio da Pousada Garoa?
Melo - Convivo com os prefeitos do Brasil inteiro, e esse tema dos moradores de rua é um drama de todo o País. O último Censo nos dá conta de cerca de 2,6 mil moradores em situação de rua em Porto Alegre. Temos equipamentos públicos para acolhimento e os parceirizados, mas uma parcela grande dos moradores não aceita o acolhimento. É uma questão bastante delicada. Eu, por exemplo, acho que em situações extremas deveria haver internações compulsórias, em determinados casos crônicos. Comprar vagas em estabelecimentos vem de 2002. Fizemos uma licitação, como fizemos milhares, com um preço no edital e apareceu uma empresa, a Garoa, que ganhou dentro das regras. Essa mesma empresa também atendia o Hospital Conceição, que é federal e que, depois da tragédia, cancelou o contrato. Não temos ainda a conclusão do inquérito. Se foi um incêndio criminoso, acidental, não sei. A tristeza é que perdemos gente. Mas o PPCI (Plano de Prevenção Contra Incêndios) de qualquer estabelecimento comercial é responsabilidade do dono. E quem fiscaliza o PPCI já não é mais a prefeitura, é competência dos Bombeiros. Ao acontecer, eram 400 vagas. A gente reduziu, fizemos uma força-tarefa, fechamos várias dessas pousadas e estamos em fase de extinção do contrato. Mas ainda tem algumas vagas que irão até ao final do ano.
JC - Mas o que será feito para evitar esse tipo de situação e ampliar o atendimento?
Melo - Precisamos dar um passo adiante nessa política pública, seja com novos equipamentos, especialmente, e acho que pode esgotar tudo para ser parceirizado, e não ser público. Tem algumas experiências em que você tem um espaço de moradia com 30 ou 40 pessoas, famílias ou individualmente. A pessoa que está na rua perdeu a noção de tudo, não sabe usar um fogão, uma geladeira. Então, tem algumas experiências de uma convivência mais coletiva, para a passagem dessa pessoa até voltar para a família. Também vou mudar as equipes de abordagem, que não estão cumprindo o verdadeiro papel que deveriam. Também vou unificar a Secretaria de Assistência Social e a Fasc, pois separadamente não foi uma coisa que deu certo.
JC - No caso da educação, dois problemas crônicos em Porto Alegre são a falta de vagas em creches e o baixo índice no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Como pretende abordar a questão?
Melo - Não estou nada satisfeito com o resultado da educação em Porto Alegre. Também vou criar uma prova municipal. Vou mandar uma lei para a Câmara propondo que a escola que tiver melhor aprendizado terá um tratamento diferenciado para o professor e para a própria infraestrutura. Se uma escola do município tem um desempenho melhor na educação, tem que ter tratamento diferente. No caso das creches, quando assumimos a prefeitura, tínhamos em torno de 11 mil solicitações de vagas. Conseguimos acolher 7 mil nesses quase quatro anos, comprando vagas no mercado, que variam de 1,1 mil a 1,5 mil. E temos também 220 escolas que são parceirizadas, recebendo um valor por cada criança. Ainda restam 3 mil e poucas. Nosso compromisso é acolher mais 7 mil, então vamos zerar.
JC - No caso do transporte público, o senhor costuma pontuar bastante a manutenção do valor da tarifa. Junto com isso, como também manter a qualidade do serviço e ampliá-la?
Melo - Uma coisa mal resolvida, concebida, executada, chama-se mobilidade humana no Brasil. Não tem nenhum sistema de mobilidade que deu certo que não tenha tido um super apoio dos governos centrais. Mas falar em metrô, não vai sair do papel. VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) é possível, ônibus elétricos, frota nova. Tem que ter qualidade, integração com bilhete único e uma passagem que caiba no bolso do cidadão. Eu vou começar pela integração, continuar lutando para isso. Vou continuar insistindo para transformar a Rodoviária de Porto Alegre numa rodoviária metropolitana, porque tem sete terminais de ônibus metropolitanos que liquidam o espaço do Centro de Porto Alegre. E vou botar todo o orçamento possível para ter uma passagem mais justa...
JC - Para manter o preço?
Melo - Abaixar não tem como. O sistema tem hoje R$ 250 milhões de isenção ao ano. A gente reduziu sete isenções para poder ter esse preço de passagem, Estamos botando R$ 135 milhões no sistema para pagar essas isenções. Se o governo federal bancasse a isenção, que é federal, a passagem poderia ser R$ 4,00. Então vou continuar trabalhando para manter. São 400 ônibus novos que entraram na frota. Compramos 12 elétricos, circulando em três linhas. E tem um pedido de empréstimo nosso que foi analisado pelo BNDES para botar mais ônibus elétricos.
JC - Há um grande atraso na revisão do Plano Diretor. Existe previsão concreta de envio? O que considera prioritário na revisão?
Melo - O plano que temos é o de 1999, é o segundo. E ele teve uma revisão em 2009, que terminou em 2010. Veio a pandemia e foi acertado não revisar o plano, porque a cidade que nasceu depois da pandemia é outra. Nós retomamos, mas houve uma representação no Ministério Público que levou ao trancamento da revisão em um determinado momento. Então houve as eleições dos novos conselheiros e nosso compromisso era de mandar depois da eleição, mas vieram as enchentes. Acho que a gente não manda esse ano, porque vai ter que revisar várias outras coisas, mas vou mandar na próxima legislatura. E aí vou querer entrar um pouco no mérito. Acho que mobilidade urbana tem que ser discutida no plano diretor, assim como sustentabilidade, áreas de risco, drenagem urbana. É muito ruim reduzir a discussão à altura dos prédios. Eu defendo adensar, botar mais moradia. É um equívoco ter levado a cidade para 30 quilômetros, 40 quilômetros distante do Centro, sem ter equipamento público suficiente. Isso precarizou a cidade em todas essas áreas de saúde, de educação, transporte urbano.
JC - Se reeleito, o que pretende fazer para reduzir a espera por consultas e exames e aprimorar a área da saúde?
Melo - A Capital é referência para mais de 200 municípios. Você atende paciente de Porto Alegre, Região Metropolitana e do interior do RS. O programa Assistir balizou o seu programa tratando hospital de porta fechada e de porta aberta igual. Com isso, Canoas perdeu dinheiro, Viamão fechou o hospital, Cachoeirinha vive com problema. Isso desarranjou o sistema da grande Porto Alegre, e agora tu pegas o trem, o ônibus, desce numa UPA, e vai ser atendido em Porto Alegre. A Capital é conhecida pelos melhores indicadores de atenção básica. São 390 equipes de saúde de família, nisso estamos bem. Onde é que nós estamos mal? Em fila. Vou criar um um mutirão permanente, a cada mês, que destina o valor de R$ 3, 4, 5 milhões, para combater as filas. No caso dos postos de saúde, saímos de 20 e poucos atendendo até as 22h, e chegamos a 56. Os centros de referência instalados hoje, vou transformá-los em policlínicas, com mais profissionais e mais exames para facilitar essa concentração. Vamos fazer uma parceria público-privada de gestão, a Câmara já sinalizou R$ 300 milhões via BRDE, para fazer um novo Hospital Presidente Vargas, que sairá de onde está e vai para a frente do Tesourinha. E vamos trabalhar muito para também melhorar o HPS nos seus 80 anos.
JC - Que avaliação faz de seu primeiro mandato?
Melo - Eu poderia citar uma por uma das propostas que fizemos em 2020. A gente disse que não aumentaria imposto e reduziria quando fosse possível. Nós diminuímos 61 impostos. Dissemos que iria melhorar o cuidado com a cidade. E temos 260 km de asfalto novo e 500 praças renovadas. Quando assumimos a Avenida Tronco, todo mundo dizia: "Melo, tu não vai terminar". E nós terminamos. Trocamos 110 mil pontos de iluminação. Temos uma assistência social que hoje atende 200 mil pessoas por mês. Avançamos muito, mas tem muito desafio pela frente, e não tem orçamento para tudo. Agora, só somos candidatos para continuar fazendo mais, com a experiência que obtivemos, mais amadurecido na gestão. Só sou candidato, junto com a Betina, para a gente fazer mais e melhor.
 

Perfil

Sebastião de Araújo Melo nasceu em Piracanjuba (GO). Tem 64 anos e até os 15 anos, trabalhou no campo. Mudou-se para Porto Alegre em 1978 e filiou-se ao MDB. Para concluir os estudos no Colégio Marechal Floriano, trabalhou em lancheria no Centro. Também foi carregador de caixotes nas Centrais de Abastecimento e vendedor em lojas de material de construção. Cursou Direito na Unisinos. Começou na política estudantil ao presidir o centro acadêmico. Atuou como advogado. Em 2000, elegeu-se vereador na Capital, reelegendo-se em 2004 e 2008. Após o terceiro mandato, foi eleito vice em 2012 na chapa de José Fortunati (PDT, 2013-2016). Foi candidato a prefeito em 2016, mas não se elegeu. Em 2018, foi eleito deputado estadual. Em 2020, disputou a prefeitura com vitória no segundo turno.

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