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Publicada em 08 de Julho de 2024 às 18:26

Movimento indígena protesta contra governo e marco temporal no STF

Manifestações devem começar na próxima quarta-feira (10)

Manifestações devem começar na próxima quarta-feira (10)

GABRIEL PAIVA/REPRODUÇÃO/JC
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Folhapress
O movimento indígena decidiu começar protestos contra o governo Lula (PT), sobretudo pela falta de demarcação de terras indígenas, e o Supremo Tribunal Federal (STF), que deve dar início ao processo de conciliação sobre o marco temporal em agosto.
O movimento indígena decidiu começar protestos contra o governo Lula (PT), sobretudo pela falta de demarcação de terras indígenas, e o Supremo Tribunal Federal (STF), que deve dar início ao processo de conciliação sobre o marco temporal em agosto.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que reúne as principais organizações dos povos no Brasil, realizou uma assembleia extraordinária nesta segunda-feira (8) para tratar do tema. Com descontentamento crescente, lideranças mudaram sua postura com relação ao governo.
Os atos devem começar na próxima quarta-feira (10). Parte do movimento já deixou de apoiar a gestão petista — em que pese outra ala entender que ainda não é momento para isso — e, sob reserva, lideranças reclamam que o Planalto não atua em prol desta pauta.
A posição de consenso, por enquanto, ainda é de se manterem aliados à ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, que é ex-coordenadora executiva da Apib.
O ministro do STF, Gilmar Mendes, marcou para agosto o início do processo de conciliação sobre a lei do marco temporal. Paralelamente, está na pauta da Comissão de Constituição e Justiça do Senado a proposta de emenda à Constituição que trata do tema.
A decisão é o ápice de uma insatisfação do movimento com o governo, que passa principalmente pela não demarcação de terras indígenas. Lula contrariou documentos do próprio governo quando, em abril, recuou e não demarcou dois quatro territórios que estavam prontos para isso. Segundo pareceres jurídicos internos, não havia impedimento para a homologação dessas terras, ao contrário do que afirmam o petista e seus ministros desde então.
A lei do marco temporal, outra das justificativas públicas para a decisão, também não seria obstáculo para as demarcações, de acordo com um entendimento conjunto da Casa Civil, da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria-Geral da União e dos ministérios da Justiça e dos Povos Indígenas.

Descontentamento

A insatisfação do movimento indígena com o governo federal, no entanto, é uma longa crescente, que também inclui críticas a não efetivação de políticas públicas voltadas à proteção dos povos.
Em abril de 2023, Lula foi convidado para participar do Acampamento Terra Livre (ATL) — principal ato anual do movimento indígena —, e havia a expectativa que ele anunciasse 14 novas demarcações de terras indígenas. A lista foi criada durante a transição de governo, quando a equipe compilou os territórios que não teriam impedimento jurídico para que fossem homologados.
No evento, no entanto, Lula anunciou apenas seis — as outras passaram então por novas análises internas. A promessa do governo era que toda a lista seria demarcada até o final daquele ano, o que também não aconteceu. Em abril deste ano, ainda com seis terras pendentes para homologação, a Apib não convidou o presidente para participar do ATL.
Paralelamente, o governo organizou um evento para anunciar as seis demarcações que restavam — de última hora, o Planalto recuou em quatro delas, e oficializou duas. A desistência surpreendeu autoridades, que foram avisadas da decisão no mesmo dia do evento, horas antes de seu início, e também lideranças indígenas, que cogitaram boicotar o discurso de Lula.
À época, a Casa Civil afirmou que, "por cautela", optou por "agir com maior segurança social e jurídica". Questionada sobre quais seriam os processos que impediram as demarcações naquele evento, a pasta citou, especificamente, a decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF, que suspendeu todos os processos sobre a constitucionalidade da lei que estabeleceu o marco temporal — tese segundo a qual as demarcações devem respeitar os territórios ocupados em 1988, data da Constituição.
A determinação do ministro aconteceu em 22 de abril. O recuo de Lula, porém, foi na semana anterior, no dia 18. Ainda, pelo menos desde março já havia o entendimento, construído em reuniões com a própria Casa Civil, de que o marco temporal não teria impacto sobre esses seis territórios. A posição, aliás, consta em pareceres dentro dos processos de demarcação.
Os documentos mostram que, após a sanção da lei do marco temporal, no fim de 2023, foi feita nova avaliação das homologações, para averiguar os possíveis impactos desta legislação nessas terras. Todos os pareceres concluem que o marco não atinge tais demarcações.
Após suspender os processos sobre o marco temporal, Gilmar Mendes marcou para agosto o processo de conciliação a respeito do reconhecimento, demarcação e uso das terras indígenas no país. A tese é defendida pela bancada ruralista. Segundo ela, os territórios dos povos devem considerar a ocupação na data da promulgação da Constituição Federal.
Por outro lado, o movimento indígena a avalia como inconstitucional, sob argumento de que o direito às terras é anterior à criação do Estado brasileiro e, portanto, não pode estar restrito a um ponto temporal e, sim, deve ser determinado por meio de estudos antropológicos.
Lideranças também criticam a ideia de conciliação proposta por Gilmar Mendes — que defende a tese do marco. Eles entendem que os direitos dos povos são fundamentais, ou seja, não há como existir um processo de conciliação. Também afirmam que o STF se contradiz, pois em 2023 julgou e derrubou a tese do marco temporal, por decisão da maioria do plenário.
O governo Lula também é alvo de protestos dos servidores ambientais, que iniciaram uma greve em junho deste ano, reivindicando melhores condições de trabalho e reajuste salarial.

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