O município de Porto Alegre deverá apresentar, no prazo de 10 dias, um plano de atuação em que constem informações sobre ações de resposta, restauração e recuperação previstas para os casos de inundações/enchentes. A decisão liminar foi emitida pela 7ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul na noite desta quarta-feira (12). As informações foram publicadas no site do próprio órgão. A Procuradoria Geral do Município (PGM), por sua vez, relata que ainda não foi notificada da decisão.
Conforme decisão liminar do juiz Thiago Notaria Bertoncello, o documento deverá esclarecer sobre quais medidas já foram implementadas, bem como o cronograma de ações futuras, no que diz respeito à remoção de fontes de perigo; ao suprimento e à distribuição de água potável e de energia elétrica; à limpeza urbana, desinfecção e desinfetação do cenário de desastre; ao esgotamento sanitário e ao escoamento/drenagem das águas que eventualmente continuam represadas em bairros do município, com enfoque na situação do Humaitá, Sarandi, Anchieta e Arquipélago.
De acordo com o magistrado, "o ponto central é averiguar se, mesmo diante desses eventos, havia dentro do escopo de atribuições do Município alguma diligência, providência ou um conjunto de ações passíveis de serem adotadas que poderiam evitar ou minimamente atenuar os efeitos da enchente".
Apresentado o plano, mesmo que provisório, devem ser intimadas as partes autoras e, logo após, o Ministério Público.
Pedido
A ação tem como autor o Sindicato dos Municipários de Porto Alegre, a Federação Gaúcha de uniões e Associações de Moradores e Entidades Comunitárias, Central Única dos Trabalhadores, Associação de Juristas pela Democracia e Associação Brasileira de Juristas pela Democracia.
Os autores pedem a condenação do ente público municipal a obrigações de fazer, consistentes na apresentação e na execução de plano de atuação, sintonizado com as ações previstas no Plano de Ações Emergenciais de Proteção e Defesa Civil em Áreas de Muito Alto Risco do Município.
Sustentam que, apesar de o Sistema de Proteção contra Inundações de Porto Alegre ser eficiente, não vinha recebendo a devida manutenção permanente, em especial a manutenção das comportas. E que a tragédia climática que atingiu Porto Alegre no último mês poderia ser ter sido evitada ou, ao menos, amenizada caso as medidas de manutenção das Casas de Bombas fossem feitas.
Já a prefeitura de Porto Alegre espera que a Justiça estenda a decisão ao governo do Rio Grande do Sul e ao governo federal. "Plano de cheia envolve o governo federal, que é o responsável maior pelas enchentes do Brasil, o governo do Estado, que governa 497 municípios, e espero que a Justiça estenda a decisão", afirmou o prefeito Sebastião Melo, em coletiva realizada nesta quinta-feira (13). De acordo com ele, o que não falta é um plano de contingência.
Decisão
O magistrado, ao analisar o pleito, considerou haver probabilidade suficiente do direito alegado pelas partes autoras, "o que se soma à situação de extrema vulnerabilidade enfrentada pelas populações dos bairros da Zona Norte de Porto Alegre/RS que permaneceram, se não continuam, por longo período longe de suas residências e estabelecimentos em razão dos eventos climáticos e da enchente".
Citou jurisprudência das cortes superiores, dispositivos constitucionais e o Estatuto da Cidade, que estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.
No caso específico de calamidades públicas, em especial de inundações, destacou, em âmbito federal, a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (Lei nº 12.608/2012) e também a Lei nº 12.340/2010, que dispõe sobre as transferências de recursos da União aos órgãos e entidades dos Estados, Distrito Federal e Municípios para a execução de ações de prevenção em áreas de risco de desastres e de resposta e de recuperação em áreas atingidas por desastres e sobre o Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil.
O magistrado explicou que, "com apoio financeiro e de controle pela União, as ações voltadas a prevenção em área de risco, à resposta e à recuperação de desastres competem ao Município que deve articular junto com o Estado, diante dos limites municipais e da integração local ou regional, a contratação e execução das obras ou prestação de serviços, inclusive de engenharia, em todas as suas fases".
Para o Juiz, se faz necessária a realização de uma prova pericial complexa que provavelmente contará com uma equipe de profissionais ou, no mínimo, mais de um profissional para se aferir com precisão eventuais equívocos na condução pelos agentes públicos atuais, e também na própria execução de todas as pontas que integram o Sistema de Proteção contra Inundações. "Contudo, nesse momento processual, de todo esse histórico, haurem-se mínimos indícios quanto à excessiva demora da Administração Pública Municipal em providenciar e implementar aparentes obras de correção de algumas EBAPs".
Ele citou como exemplo o levantamento inicial voltado a preparar alguma obra de correção, por exemplo, na Estação de Bombeamento de Águas Pluviais (EBAP) nº 20, instalada no Bairro Sarandi, que só veio a ser efetivada às vésperas da catástrofe que já havia assolado grande contingente de municípios do interior do Estado e já começava a chegar a Porto Alegre. "Calha frisar que havia previsão orçamentária de R$ 23.106.103,00 no ano-calendário de 2022 a título de créditos suplementares, sem falar da previsão orçamentária anual ordinária, para, em princípio, fazer frente a esses problemas identificados", frisou.
"Aliado ao extravasamento do dique no bairro Sarandi, tal situação culminou, como noticiado em todas as mídias, a qualificar o fato como notório, na inundação dos bairros da Zona Norte, a provocar o desalojamento e o desabrigamento de pessoas, danos elevados a estabelecimentos comerciais e a residências, entre outros, que somente foram minimamente solucionados semanas após", acrescentou o juiz Thiago Bertoncello.