Três parlamentares do Rio Grande do Sul de diferentes esferas do Legislativo se unem na tentativa de reativar cinco obras paralisadas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que foi retomado neste terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O senador licenciado Luis Carlos Heinze (PP) é um dos protagonistas dessa mobilização. Ele concedeu essa entrevista ao Jornal do Comércio para explicar como, junto ao deputado federal Luiz Carlos Busato (União Brasil) e ao deputado estadual Miguel Rossetto (PT), pretende concretizar a ideia, que já foi levada a importantes figuras do governo federal.
Essas obras foram projetadas entre 2012 e 2015 durante o mandato da então presidente Dilma Rousseff (PT, 2011-2016) e se destinam a proteger a Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA) de enchentes e inundações.
São cinco projetos: em Eldorado do Sul, no Arroio Feijó (Porto Alegre e Alvorada), no Rio Gravataí, no Vale dos Sinos e no Vale do Caí. O investimento estimado é de cerca de R$ 8 bilhões, sendo que dois desses projetos já contam com licenças prévias (LP).
O maior desafio agora é atualizar as cotas de inundação, visto que os projetos haviam sido feitos a partir da antiga marca histórica do Guaíba, que atingiu 4,76 metros na grande cheia de 1941 - marca que foi superada na catástrofe climática de 2024.
Jornal do Comércio - Qual é o pleito que o senhor, o deputado federal Luiz Carlos Busato e o deputado estadual Miguel Rossetto buscam junto ao governo federal para reativar obras do antigo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)?
Luis Carlos Heinze - Busato iniciou esse processo como secretário de Obras junto à Metroplan (Fundação Estadual de Planejamento Metropolitano e Regional), que trabalhava com ele, vários projetos que existiram naquela época. Tinha dinheiro até alocado para que essas obras saíssem do papel. Cinco obras importantes: Eldorado do Sul, Arroio Feijó, depois tem Gravataí, tem para o lado do Vale dos Sinos e o Vale do Caí. Foram iniciados os projetos, naquela ocasião com o governo Tarso (Genro, PT, 2011-2014). Foram parar com algumas coisas, com licença ambiental, pela morosidade do processo. Tem empresas gaúchas que elaboraram esses projetos, e falta muito pouco para serem concluídos os projetos e iniciar as obras propriamente ditas. Estamos buscando agora que o governo federal se sensibilize com essa situação e busque ajudar o Estado com obras definitivas.
JC - Então são cinco projetos no total?
Heinze - São cinco projetos para contenção e controle de enchentes desenvolvidos entre 2012 e 2015, no âmbito do PAC. Os estudos, paralisados nos últimos anos, foram atualizados. As medidas são soluções viáveis para evitar que os excessos de águas inundem os municípios da Região Metropolitana. Os empreendimentos têm como foco as bacias hidrográficas do Delta do Jacuí, Sinos, Gravataí e Caí e incluem a construção de um sistema baseado em muros de contenção, os diques, e também aterros em solo. O complexo a ser construído também prevê equipamentos e centrais de bombeamento de água.
JC - Em que fase pararam esses projetos?
Heinze - Das cinco iniciativas, duas já contam com projetos básico de engenharia concluído e licença-prévia (LP) emitida, que são as iniciativas voltadas para região do Arroio Feijó e Eldorado do Sul, com investimentos na ordem de R$ 3 bilhões, essenciais para prevenir inundações devastadoras na Região Metropolitana. As demais estão em fase de estudos: as medidas voltadas ao Rio Caí e dos Sinos contam com estudos avançados e até estimativas iniciais de custo, mas ainda dependem de finalização dos projetos básicos de engenharia. O do Vale do Taquari precisamos da realização de ações de desassoreamento na região e também no Guaíba.
JC - Qual poderia ser o projeto mais rápido a ser executado?
Heinze - O de Eldorado, porque é em torno de uma cidade, toda ela vai ser cercada por um sistema de diques, com o sistema tradicional. Lá não tem comporta, a não ser embaixo da terra, dos anos 1990. Mas são casas de bombas que retiram de dentro da área protegida a chuva. Ou seja, todo o sistema de drenagem da área urbana da cidade vai ser dirigido às casas de bombas, então não vamos ter retorno de água da enchente para dentro da área urbana. Porque não vão ter saídas a não ser pelas casas de bombas. Então não existe o risco de bueiros começarem a verter água, porque não vai ter essa possibilidade.
JC - O que está sendo feito nesse momento para recuperar os projetos?
Heinze - O que estamos fazendo agora é recuperar o que foi feito naquela ocasião, atualizando os projetos. Hoje, em 2024, temos uma cota (de inundação) diferente do que foi em 1941, 2010 e 2012. Essas empresas que têm essa expertise podem fazer isso. Nós não queremos recomeçar um projeto, pela premência do tempo, e daqui a pouco não tem mais o que fazer. Ninguém mais fala nesse assunto. Aproveitando o momento, estamos reativando com as empresas que foram contratadas para fazer esse serviço. Já estamos conversando com o governo federal, com o (ministro) Rui Costa (Casa Civil, PT), com o vice-presidente (Geraldo) Alckmin (PSB), com o (Paulo) Pimenta (da Secretaria da Reconstrução, PT). Então todo mundo sabe. O governador (Eduardo Leite, PSDB) esteve conosco. Colocamos a ele também. Temos que juntar forças, com o Busato, da bancada federal, o Rossetto, da bancada estadual, que apoiam esses projetos.
JC - Quais seriam essas empresas?
Heinze - Eu juntei as quatro empresas que haviam sido contatadas para fazer as propostas que são a Magna Engenharia, a STE, a Engeplus e a Encop. Conversei com eles, já conversamos com os prefeitos e já conversamos aí para os árbitros do Ministério Público também. O promotor que cuida desse assunto também é parceiro nessa história para fazer com que isso aí ande.
JC - Como seria possível reativar essas obras com os projetos feitos há mais de 10 anos?
Heinze - Agora eles têm que decidir se vão aportar isso para a Metroplan ou pode ser até o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Existem os processos todos, financiados com o dinheiro do governo federal. E não evoluíram. Agora, a possibilidade existe, sim. Falaram que vão contratar uma empresa holandesa, alemã. Para quê? Se tem quatro empresas gaúchas que já fizeram esses estudos e mostram que isso é solução? O que precisa fazer agora é atualizar a cota de 1941 para cota de 2024. Temos que fazer com que a sociedade saiba que tem solução e não é uma solução cara perto do tamanho do prejuízo que nós tivemos.
JC - Há uma estimativa do investimento necessário para essas cinco obras em Eldorado do Sul, Arroio Feijó, Rio Gravataí, Vale dos Sinos e Vale do Caí?
Heinze - Na faixa de R$ 8 bilhões, mais ou menos. Só no projeto de Eldorado do Sul, a projeção é de R$ 3 bilhões. E também tem o projeto do (Arroio) Feijó, que é para Porto Alegre e Alvorada. Prevê, inclusive, remoção de pessoas e reassentamento em outro local. Então tudo está planejado. Não só as obras de casas de bombas, diques, enfim, tem também drenagens e remoção de famílias.
JC - O senhor comentou que a burocracia atrapalhou o processo no passado. Acredita que agora, com este momento que o Rio Grande do Sul está passando, o processo deva ser acelerado?
Heinze - Eu estive reunido com a doutora Ana Marchesan (Ministério Público) para falar sobre o assunto da agricultura, recuperação de propriedades rurais. Ela me passou uma série de medidas que já podem ser implementadas. O "bicho papão" que era desassoreamento já estão mandando fazer, pode fazer porque não é mais problema. O Busato me traz o doutor Felipe (Teixeira Neto), promotor do MP na parte ambiental, que também contatou com as empresas. E ele está super a fim, ele quer fazer. Então o Ministério Público não é problema. Pelo contrário.
JC - O senhor acredita que os impactos da enchente, principalmente na Região Metropolitana de Porto Alegre, teriam sido minimizados caso esses projetos já tivessem saído do papel?
Heinze - Se (os projetos) tivessem ocorrido naquela ocasião, muito do que se perdeu, as vidas em primeiro lugar, as empresas, as casas... enfim, milhares de problemas não teriam ocorrido nessa magnitude.
JC - Já há algum indicativo do governo federal sobre intenção de executar essas obras?
Heinze - O Rui Costa foi o primeiro com quem eu falei, no dia que ele estava lá na Unisinos. Ele disse: "Se tens esses projetos, passa para nós que nós queremos operacionalizar". É o cara que tá com a "chave do cofre" junto com o (ministro Fernando) Haddad (Fazenda, PT). E o Alckmin: "Eu já fiz isso no Tietê, em São Paulo", quando ele foi governador. Então ele já fez obras e conhece o necessário. Ele já veio várias vezes ao Rio Grande do Sul, sabe que precisa fazer e disse que ajuda. Da mesma forma, o Rui Costa. Está tudo alinhado. Temos que acertar, dar um start para que essas empresas possam atualizar esses projetos, orçamentar e iniciar o processo. Dois já estão praticamente prontos, com licença prévia. É só licitar e atualizar a cota.
JC - Falou do tema ao Alckmin quando ele esteve no Rio Grande do Sul?
Heinze - Isso. Foi lá em Caxias do Sul. Foram entregues os documentos, foi falado com Alckmin sobre esse documento. O Rui Costa, o Pimenta, o Waldez Góes (ministro do Desenvolvimento Regional) e também o próprio Jader Barbalho Filho (ministro das Cidades). Todos sabem agora. Quero que comprem a ideia e nos ajudem. O (senador Paulo) Paim (PT) trouxe os senadores da comissão especial na semana retrasada. Nós fizemos a reunião lá em Canoas. Estava o governador e lá apresentei para eles, mostrando que eu tenho essa proposta de solução. Então, nós temos que juntar a força do Senado, da Câmara, o deputado estadual Miguel Rossetto já tem um trabalho também na Assembleia Legislativa na mesma direção. Então, todos nós estamos trabalhando. Se envolve Assembleia, envolve Câmara, envolve o Senado, o governador, e envolve os prefeitos para poder buscar essa solução com eles.
JC - O senhor comentou que o governador Eduardo Leite está ciente desses projetos. Como foi a resposta dele? O Palácio Piratini estará junto nessa iniciativa?
Heinze - Sim. Eu vou tratar com o (secretário estadual da Reconstrução do Rio Grande do Sul, Pedro) Capeluppi também. Ele é um cara do governo do Estado para tratar desse assunto aqui.
JC - Como está o seu estado de saúde?
Heinze - Tudo bem. Já estou me arrumando. Sem problema nenhum. Enfiado nesse "abacaxi" das lavouras e das enchentes. Eu sigo em tratamento médico e tenho realizado mobilizações nos intervalos da fisioterapia. Mas não posso me concentrar apenas na minha recuperação e ignorar as necessidades urgentes do Rio Grande do Sul. Entre as sessões e consultas médicas, estou coordenando essas iniciativas cruciais para o nosso Estado.
JC - O senhor já tem uma data de retorno da licença para voltar a ocupar a sua cadeira no Senado Federal?
Heinze - Está marcado para agosto.
Perfil
Luis Carlos Heinze (Candelária, 1950) é senador do Rio Grande do Sul eleito em 2018, e engenheiro agrônomo graduado pela Universidade Federal de Santa Maria em 1973. Em 1974 e 1975, foi professor em São Borja. Na cidade da fronteira, constituiu sua família e tornou-se produtor rural. Foi fundador e o primeiro presidente da Associação dos Arrozeiros de São Borja, entre 1988 e 1990. Em 1989, foi secretário municipal de Agricultura. Em 1992, filiou-se ao PDS (hoje, PP), partido pelo qual se elegeu prefeito da cidade naquele ano. Depois disso, conquistou cinco vezes a cadeira de deputado federal: em 1998, 2002, 2006, 2010 e 2014, quando foi o mais votado do Rio Grande do Sul. No pleito de 2018, inicialmente por indicação de seu partido, concorreria ao governo do Estado, porém, devido a coligações partidárias, abriu mão da disputa e buscou uma vaga no Senado Federal, elegendo-se com a maior votação do Estado. Em 2022, concorreu ao Palácio Piratini e não foi ao segundo turno, com 271.540 votos (4,28%). Em abril deste ano, precisou se licenciar da cadeira de senador para tratar pré-Parkinson. Em seu lugar, assumiu o senador Ireneu Orth (PP). Heinze deve retornar ao Senado Federal em agosto.