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Publicada em 04 de Fevereiro de 2024 às 20:25

Bohn espera reação dos deputados ao corte de incentivos fiscais

Presidente da Fecomércio-RS, Luiz Carlos Bohn, acha que esse deverá ser um debate permanente durante o ano

Presidente da Fecomércio-RS, Luiz Carlos Bohn, acha que esse deverá ser um debate permanente durante o ano

fotos: Carlos Macedo/Fecomércio/Divulgação/JC
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Diego Nuñez
Diego Nuñez Repórter
Mesmo já passadas algumas semanas após a edição dos decretos do governo Eduardo Leite (PSDB) que revisam benefícios fiscais concedidos a 64 setores da economia gaúcha, as entidades empresariais não desistiram da tentativa de convencer Executivo e Assembleia Legislativa a revogarem o corte de incentivos.
Mesmo já passadas algumas semanas após a edição dos decretos do governo Eduardo Leite (PSDB) que revisam benefícios fiscais concedidos a 64 setores da economia gaúcha, as entidades empresariais não desistiram da tentativa de convencer Executivo e Assembleia Legislativa a revogarem o corte de incentivos.
O presidente da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS), Luiz Carlos Bohn, acha que esse deverá ser um debate permanente durante o ano. Ele não acredita que o Palácio Piratini retrocederá integralmente, mas tem esperança de que haja espaço para rever algum ponto da redução de incentivos.
Para isso, confia que a tentativa de convencimento de deputados estaduais surtirá efeito, e os empresários poderão ter, na Assembleia Legislativa, uma aliada. Contudo, vê um caminho mais difícil do que o movimento feito para rejeitar o projeto de aumento do ICMS, retirado de pauta pelo governo às vésperas da votação.
Segundo ele, no setor terciário, os produtos mais impactados devem ser os alimentos que compõem a cesta básica - alguns itens que recebiam isenção de imposto podem ser tributados em até 12% a partir de abril, quando entram em vigor os decretos publicados no ano passado.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Bohn também defende que os recursos oriundos da privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) devam ser destinados para investimentos, e não gasto corrente.
Jornal do Comércio - A Fecomércio e as demais entidades continuam acreditando que essa revisão de benefícios possa ser, de alguma forma, revista?
Luiz Carlos Bohn - Claro. Tem que ser. Tirar benefícios ou aumentar alíquota (do ICMS) é aumento de carga tributária. Não pode. A população do Rio Grande do Sul não pode pagar mais imposto. A secretária da Fazenda (Pricilla Santana) disse que tem superávit. Não conseguimos entender onde que vai faltar o recurso que o governador tanto se preocupa. Só porque o Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) disse que vai reduzir a receita do RS em relação a 2022? O ano de 2022 foi anormal, arrecadamos muito, houve transferências da União para o Estado. Isso não é motivo e, agora, começamos a perceber que há uma intenção de novos gastos - e gastos permanentes, como o aumento da folha de salários. Há quem diga que será pouco (aumento), mas é necessário cuidar dos pequenos gastos. Uma pequena fenda afunda um grande navio. Hoje, as contas do Estado cabem dentro da receita. O superávit financeiro anunciado pela Fazenda é, claro, fruto das privatizações, e o Estado não pode gastar dinheiro com folha, uma despesa permanente, que não é investimento. Nós já estamos em uma situação de competitividade prejudicada. O RS tem desvantagem em relação a outros estados, por sua localização geográfica, demografia, enfim. Temos que fazer o Estado caber dentro da arrecadação, e não aumentar a arrecadação. Arrecadação pelo aumento da produtividade, sim. Conceder melhores condições de empreendedorismo, liberdade econômica, baixo custo do Estado para que, por consequência, aumente o consumo, o PIB (Produto Interno Bruto) e aí a arrecadação.
JC - Acredita que o governo está fazendo esse movimento para contrair mais gastos correntes?
Bohn - Acredito que sim, mas não foi explicitado isso em nenhum momento. Os benefícios não estão aí por favor. Houve razões para as concessões. Cito sempre a GM (General Motors). Se pretendia fazer um novo grande polo de indústria automobilística no Estado. Infelizmente não se concretizou. Mas foi um benefício de redução de alíquota por um período, que veio, se instalou aqui e aumentou o PIB. É um exemplo de benefício comedido, com muita justiça.
JC - De que maneira a revogação de benefícios pode ser revista?
Bohn - Exatamente através da pressão que estamos fazendo. Estamos mobilizando, a sociedade econômica vai se levantar, as empresas, os próprios cidadãos, nós queremos que entendam que a cesta básica vai aumentar, vai gerar inflação, vai aumentar o custo para as famílias menos favorecidas. Não digo que temos convicção que vamos conseguir, mas vamos trabalhar para evitar. Precisa que aconteça de novo o que ocorreu quando não aumentou a alíquota (do ICMS), a Assembleia vai ter que se revoltar contra isso.
JC - O governo argumenta que tem o poder de tomar a decisão em relação aos benefícios.
Bohn - Claro que sim. Ele tem o poder. Toda autoridade tem poder. Mas tem um limite até onde a sociedade aguenta. Não estamos dizendo que o governo não tem o direito ou o poder de fazer isso. Mas queremos mostrar que não é bem assim.
JC - Outro argumento do governo do Estado é que a prestação de serviços públicos seria muito prejudicada, como investimento em logística, que impacta na competitividade. Que alternativas haveria para incrementar a arrecadação?
Bohn - Investimento em equipamentos permanentes como estrada, logística, pontes, isso pode se recorrer à venda das estatais que foram feitas. Não se pode gastar com o orçamento.
JC - Quais devem ser os impactos a partir de abril, quando entra em vigor a revisão de benefícios?
Bohn - Nós já temos uma carga tributária de 7,3%, que é maior do que a média nacional, de 6,7%. Não pode aumentar acima disso. Vai ser muito difícil para os gaúchos.
JC - Quais produtos podem sofrer maior reajuste?
Bohn - São diversos. Atinge principalmente a indústria gaúcha, que tem alguns incentivos por conta da competitividade entre estados. Mas no setor terciário, que nós representamos, a cesta básica é o que mais preocupa. Produtos da cesta básica que tinham isenção passarão a ter 12%. Imagina a alface, batata, feijão, arroz, hortifrutigranjeiro, frutas.
JC - O consumidor vai sentir na ponta?
Bohn - Claro, vai sentir no supermercado. Direto. E vai de novo colocar a culpa no dono do supermercado, que não tem nada a ver.
JC - Vai ser um aumento perceptível?
Bohn - O que é perceptível é muito relativo. Um centavo aqui, dois centavos ali não são perceptíveis. Para isso nós estamos aqui, para alertar de que isso é um peso grande para a sociedade gaúcha como um todo. Dez centavos em uma semana, um mês, um ano… isso que temos que olhar sempre. Talvez não seja perceptível para a própria população. A carga tributária vai aumentando como uma doença silenciosa. Ninguém vê. Por isso devemos estar sempre presentes.
JC - As federações vão continuar pressionando os deputados até o último momento? Acredita que é esse o caminho?
Bohn - Eu não usaria a expressão pressionando. Eu usaria conscientização. Falei para um deputado na posse do novo presidente da Assembleia: "Você sabe que agora que os caminhões que iam para o Ceasa, com laranja, que nunca o fiscal parava porque não tinha tributo, vai trancar o caminhão e exigir nota? Isso é bem difícil". Temos que conscientizar os deputados da realidade da situação. O deputado é um generalista. Foi eleito para ouvir as duas partes, a do governo e a nossa. Temos essa missão.
JC - O governo não teve votos para aprovar o aumento do ICMS. Será que agora há votos suficientes para revogar os decretos?
Bohn - É bem pior. Agora não é tão fácil como antes, que era simplesmente se abster. Agora, o deputado precisa se mobilizar no sentido de fazer os decretos legislativos que anulem. Acho que isso é bem mais difícil. A gente precisa fazer com que o governo do Estado entenda que ele não deve fazer isso.
JC - Que ações as federações podem fazer nesse sentido?
Bohn - O que já estamos fazendo. Isso entra em vigor em abril, mas nós estamos já no início de fevereiro falando com os deputados, conscientizando a sociedade, fazendo um movimento no sentido de dizer que isso não é bom para o Rio Grande do Sul. Nada contra o Estado, contra o funcionalismo, todos devem ter seu lugar, fazer seu trabalho com vontade e orgulho, mas o Estado está pesado demais. Precisamos frear isso. Aumentar não pode.
JC - É ano de eleições municipais. Acredita que o pleito pode influenciar nessa pauta?
Bohn - É pauta de agora. Da forma como está, vai ter que se fazer um movimento contínuo, no sentido de ir aos poucos, não integralmente. Eu não acredito que haja um recuo integral do governo. Acredito sim em sensibilização, em entendimento de que assim como está simplesmente não pode ficar.
JC - O governo prepara a aplicação dos recursos da Corsan. São R$ 4,1 bilhões que devem ser distribuídos. Quais áreas considera serem fundamentais para a competitividade do Estado e que o governo deveria focar em uma nova rodada de investimentos?
Bohn - Infraestrutura. O que o governo tem feito. Não vamos aqui criticar o governador Eduardo Leite no sentido de ele não estar fazendo investimentos em infraestrutura. Está fazendo. Pequenas obras por aqui, por ali. Eu ando esse Estado de ponta a ponta e vejo como algumas coisas estão melhorando com recursos do Estado. Existem muitas coisas a serem feitas. A Fecomércio tem uma agenda de infraestrutura que foi levantada através de pesquisas. Se elencou e entregamos para o próprio governador. Tem muita coisa que a sociedade pede de melhor em infraestrutura rodoviária, fluvial, a própria questão da melhora da qualidade das escolas na educação. Governador faz sim um movimento muito certo em melhorar as escolas, mantê-las com qualidade para os alunos. Esses investimentos são muito saudáveis e precisam ser feitos. Nisso a gente concorda. E achamos que o Estado tem recursos para fazer, com fonte nas privatizações que fez.
JC - Há os recursos da Corsan, mas para os próximos anos não há estatais com previsão de serem vendidas.
Bohn - A secretária da Fazenda disse que termina o ano com R$ 3,6 bilhões em recursos. É bastante dinheiro isso. Nós achamos que tem que haver o entendimento de que assim como está, a retirada dos benefícios da maneira como foi feita… claro que o governador conversou, demonstrou, disse que faria e fez. Mas entendemos que tem que haver uma acomodação disso. Assim está muito alto; R$ 3,6 bilhões, que é o que diz que vai aumentar de arrecadação com a retirada de incentivos, é muito alto. Sobe a carga tributária demais.
JC - Outro tema: recentemente, tivemos a falta de energia, que prejudicou diversos comércios, principalmente na Região Metropolitana de Porto Alegre, mas em diversas partes do Estado também. Como foi para o setor do comércio essa questão?
Bohn - Na Região Metropolitana foi pior, mas diversas pessoas foram prejudicadas. Mas a economia se ajusta. É um fator da natureza que acontece. Mas se a gente pudesse ter cuidado um pouco mais da infraestrutura, no sentido de que os danos fossem mais rapidamente recuperados, as concessionárias talvez precisem ser mais rápidas, precisam enfrentar a correção do problema com mais eficiência. Mas posso dizer que isso é o de menos. Por mais que tenha prejudicado, não é o pior que pode se sentir no Estado. É normal que fenômenos climáticos ocorram. Temos que estar preparados para isso.
 

Perfil

O empresário Luiz Carlos Bohn é natural de São Sebastião do Caí e bacharel em Ciências Contábeis. Bohn dirige a L C Bohn Contabilidade Ltda, empresa com mais de 50 anos com sede em São Sebastião do Caí e filiais em Vale Real e Feliz. Atuante e presente nas entidades representativas, foi eleito à presidência do Sistema Fecomércio-RS/Sesc/Senac em 2014 e reconduzido em 2018 e 2022. Antes disso, foi 1º vice-presidente da federação e passou pela vice-presidência financeira da entidade em anos anteriores. Foi eleito presidente do Conselho Deliberativo Estadual do Sebrae RS para a gestão 2023/2026. Antes de começar sua atuação na Fecomércio, Bohn ganhou experiência e teve a oportunidade de mostrar o seu trabalho no meio sindical presidindo, de 2004 a 2010, o Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis (Sescon-RS). Atualmente, é o 2º vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), participa como conselheiro dos Conselhos Nacionais de Sesc e Senac e é coordenador das Câmaras Brasileiras do Comércio da CNC.

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