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Publicada em 07 de Janeiro de 2024 às 20:37

Piratini planeja novos investimentos com receita da Corsan

Governador em exercício, Gabriel Souza informa que ideia é anunciar neste ano o destino de R$ 4,1 bilhões em investimentos

Governador em exercício, Gabriel Souza informa que ideia é anunciar neste ano o destino de R$ 4,1 bilhões em investimentos

FOTOS: FERNANDA FELTES/JC
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Diego Nuñez
Diego Nuñez Repórter
O governo do Rio Grande do Sul planeja uma nova rodada de investimentos no Estado com os recursos da privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), vendida por R$ 4,1 bilhões em 2023. O destino da verba deve ser anunciado neste ano, contemplando diversas áreas.
O governo do Rio Grande do Sul planeja uma nova rodada de investimentos no Estado com os recursos da privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), vendida por R$ 4,1 bilhões em 2023. O destino da verba deve ser anunciado neste ano, contemplando diversas áreas.
Sem receita extraordinária como a obtida com a alienação da estatal, o governador em exercício, Gabriel Souza (MDB), não vê capacidade de o Estado voltar a realizar investimentos robustos com recursos próprios nos próximos anos.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o vice-governador gaúcho fala sobre medidas estudadas para aumentar a competitividade dos setores afetados pelo corte de benefícios fiscais, alega inconstitucionalidade na proposta de revogar os decretos que revisam incentivos e mostra preocupação diante da decisão que o Congresso Nacional deve tomar neste ano em relação à distribuição do futuro Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
Jornal do Comércio - Quais serão as principais pautas do Palácio Piratini em 2024?
Gabriel Souza - Temos um recurso da privatização da Corsan, que vamos anunciar investimentos em várias áreas. Estamos trabalhando para que possamos anunciar esses investimentos em 2024. Temos também programas novos na área do capital humano, como o Todo Jovem na Escola, que foi remodelado e vamos pagar bolsas para jovens de baixa renda. Quanto menor a renda, maior será a bolsa. Vamos pagar um prêmio por engajamento aos alunos do Ensino Médio e pagar um auxílio-matrícula ao aluno. Por fim, caso passe de ano letivo, uma poupança-aprovação. É o maior programa de combate à evasão escolar do Brasil. Também estamos investindo na infraestrutura, prevenção e monitoramento de eventos climáticos.
JC - Em relação aos investimentos dos recursos Corsan, vão ser utilizados os R$ 4,1 bilhões? Já estão definidas as áreas?
Gabriel - Não está definido ainda quanto cada área receberá. O governador Eduardo (Leite, PSDB), na gestão anterior, fez a maior rodada de investimentos da história do Rio Grande do Sul, com R$ 6,5 bilhões no Programa Avançar. As áreas da infraestrutura, estradas, portos, rodovias receberam investimentos, cultura, educação, esporte e lazer, pavimentação urbana, turismo, segurança pública, saúde. Foram R$ 6,5 bilhões distribuídos em várias áreas. A ideia é repetir.
JC - O Estado reduziu despesas, mas esses investimentos ocorreram muito em função da venda de ativos. Sem novas privatizações, o Estado terá capacidade de investimento no futuro?
Gabriel - Falar de futuro para além do nosso governo talvez não seja o caso. Mas o governo do Estado tem passivos contraídos durante décadas. O déficit previdenciário, R$ 9 bilhões, o estoque de precatórios, de R$ 20 bilhões, e a dívida com a União, que por estarmos no Regime de Recuperação Fiscal (RRF), começa baixa e vai subindo escalonadamente a cada ano. Tem uma discussão em nível nacional sobre a possibilidade de autorizar estados endividados, cuja capacidade de endividamento ou se exauriu ou se está muito próximo de se exaurir pela regra da Lei de Responsabilidade Fiscal, para eventualmente até rediscutir esse impedimento de buscar financiamento para fazer investimentos. Eu não vejo, no curto prazo, o Rio Grande do Sul tendo recursos próprios para fazer investimentos vultuosos.
JC - Por quê?
Gabriel - Porque o Rio Grande do Sul tem um endividamento alto, uma despesa que foi cortada praticamente no limite com o pessoal, que representa quase 50% da nossa receita atualmente, e está, com as regras vigentes, sem condições de contrair financiamentos para investimentos. Temos ainda a queda das receitas ordinárias das alíquotas de ICMS. Quando tu me pergunta se é possível que o Estado faça investimentos com recursos próprios, bom, com o cenário atual de queda das alíquotas ICMS, com possibilidade de o Estado não ter a partir de 2029 uma média que lhe garanta receita importante, a situação só vai piorar.
JC - Como avalia a atuação do governo na articulação do projeto de aumento do ICMS e na publicação dos decretos que revisam benefícios fiscais?
Gabriel - Conheço bem a Assembleia. Não é um assunto fácil. Claro, há pressão sobre parlamentares no sentido de evitar uma mudança na alíquota modal, que atinge 25% apenas dos produtos. Não atinge gasolina, diesel, gás de cozinha, alimentos. Seria o melhor caminho para recompor a arrecadação perdida a partir da decisão do Congresso, lá no meio de 2022, às vésperas da eleição. A assinatura de decretos, a outra opção, defendemos que não seria a melhor, mas foi a opção que restou ao Estado.
JC - Se considerava a melhor opção, por que não foi até o fim, colocando o projeto em votação?
Gabriel - Mas fomos até o final. O governador Eduardo foi anunciar a retirada do projeto no final da noite da véspera da votação. Quando percebemos que não havia maioria necessária para poder enfrentar em plenário, bom, já estava decidido. O plenário é soberano. Se não tem maioria, pode até apresentar o projeto, mas já se sabe previamente o resultado.
JC - A pressão dos setores econômicos segue neste ano?
Gabriel - Não há dúvida que sim, setores econômicos que podem vir a se sentir prejudicados vão apresentar argumentos para que o governo possa vir a rever. Estamos convictos de que este é o caminho alternativo às alterações da alíquota modal. O Estado perdeu R$ 4 bilhões em receitas. Nesse breve período de governador em exercício, tenho recebido demandas de prefeitos, vereadores, até mesmo empresários. E vêm solicitar demandas que, muitas vezes, geram custos. O Estado tem limites no acolhimento das demandas, sejam novos incentivos fiscais, investimentos em educação, saúde, segurança, infraestrutura. Para atender demandas da sociedade, temos que ter recursos e, para ter recursos, temos que ter receita. Cortamos todas as despesas grandes possíveis, mas não tem um botão que você aperta e corta R$ 4 bilhões. Para continuar prestando serviços públicos, precisamos, sim, recompor, senão totalmente, em grande parte, as receitas.
JC - Na Assembleia, tramita uma proposta para sustar os atos do Executivo e revogar os decretos. Preocupa o governo?
Gabriel - Tenho plena confiança que a Assembleia não aprovará um decreto legislativo inconstitucional. Por que inconstitucional? Porque se o governador não pode, por decreto, diminuir incentivos fiscais, então, por simetria, ele não poderia ter concedido esses incentivos fiscais por decreto. Se eventualmente fosse aprovado e resistisse às contestações judiciais que poderiam acontecer, se revogariam todos os incentivos fiscais do Estado. Não acredito que os deputados farão, mas mesmo que o fizessem, o Judiciário não manteria em virtude dessa flagrante inconstitucionalidade.
JC - O governador Eduardo Leite sinalizou a apresentação de alternativas para aumentar a competitividade de setores atingidos pelo corte de benefícios. Quais são essas alternativas?
Gabriel - O debate sobre competitividade, para alguns, é tributocêntrico. O tributo é um elemento na questão da competitividade. A alíquota modal tem menos a ver com isso do que alíquotas especiais praticadas sobre determinados setores específicos. Ao mesmo tempo, não podemos esquecer que há outros elementos tão importantes quanto o tributo na questão da competitividade, entre os quais a infraestrutura. Não teremos um Estado competitivo se não tivermos rodovias bem conservadas, hidrovias adequadas, aeroportos captando voos regionais, um porto capaz de exportar a produção e de importar produtos necessários. Ao mesmo tempo, todos os índices de segurança pública estão melhorando no comparativo dos últimos anos. Isso significa custos menores de seguro, mais vidas preservadas. Tem a questão da saúde, o Rio Grande do Sul é um centro nacional de saúde de excelência. Tem a educação, temos que melhorar cada vez mais. A competitividade não é apenas ligada à questão tributária. Tem um monte de outros elementos.
JC - O governo do Estado está preparando alternativas?
Gabriel - Essas questões complementares ou alternativas para gerar competitividade para determinados setores vão ser estudadas caso a caso nas conversas que vamos ter com os setores. Podem se basear em incentivos fiscais que não impactem abruptamente a receita ou algum tipo de ação desburocratizadora de algum processo licenciatório. Uma série de questões específicas de determinadas regiões que têm a ver com infraestrutura a serem resolvidas. Tudo isso vamos agora ouvir os setores e estar sempre abertos ao diálogo para não deixar cair a capacidade de competitividade. Reforço: a capacidade de competitividade dos estados não está apenas dependente da questão tributária. O Centro de Liderança Pública, entidade autônoma de São Paulo, tem 10 quesitos para fins de cálculo da capacidade de competitividade de cada estado. Considera saúde, educação, segurança, mas não considera a questão da alíquota modal de cada um dos estados. É um elemento, mas não o único, talvez nem o principal.
JC - Esse debate passou pela divisão do IBS, durante a aprovação da reforma tributária, que deve ser regulamentada neste ano. Como o Rio Grande do Sul pode participar desse debate?
Gabriel - Temos dois motivos para ter apresentado a proposta da mudança de alíquota modal. O primeiro foram as leis complementares 192 e 194 de 2022, que diminuíram as alíquotas. O segundo é, mesmo com a retirada da emenda condicional na reforma tributária, a forma como será o cálculo para os próximos cinco anos de arrecadação dos tributos dos entes subnacionais. Ainda é preocupante, porque agora ficou para lei complementar. Achamos ainda pior ser lei complementar, porque não demanda duas votações como a PEC, mas uma votação em cada Casa, de maioria absoluta dos votos, 50% 1. Se a maioria dos estados brasileiros, ou boa parte, que têm ampla representação no Congresso, tiveram aumento de alíquotas modais neste ano ou no ano passado e sabem que a regra que estava prevista na então PEC da reforma tributária se favorece, me parece lógico que vão lutar para manter esta regra na lei complementar. O governador certamente vai liderar movimentos no sentido de evitar que isso aconteça. Temos grande preocupação. Se tivermos uma média a partir dessa regra, o gaúcho vai pagar a alíquota nacional e esse dinheiro não entrará no caixa do Estado. O gaúcho vai pagar X e receber menos do que X de volta.
JC - No início do ano, houve aumento de pedágios em rodovias da Zona Sul em quase 30%, gerando protestos. Como o governo do Estado pode auxiliar na busca de uma solução?
Gabriel - É uma questão bastante técnica, um contrato concebido na década de 1990, completamente desatualizado perante às boas práticas atuais de concessões. Os contratos atuais são baseados no fator do índice de correção do IPCA. O contrato da EcoRodovias é uma cesta de insumos dos custos da operação, sempre superior ao IPCA. Por fim, um contrato que, inacreditavelmente, tem trechos da rodovia que o Dnit, ou seja, o próprio governo federal e não a concessionária, tem que fazer investimentos. Mesmo numa rodovia concedida. Isso não existe atualmente. O ideal seria encerrar o contrato e abrir nova licitação, o que não é possível. Uma solução técnica que poderia ser viabilizada é a extensão de mais 6 meses do contrato, talvez seja a única possibilidade administrativa. Agora, é um assunto da União, que teria muito mais condições para eventual solução. Telefonei ao ministro Renan Filho (Transportes), no sentido de dizer que isso incorreria num aumento significativo da tarifa, se tornando o pedágio mais caro do Brasil, assimétrico à qualidade da rodovia.
JC - Como está o clima no MDB para a eleição municipal? O partido se dividiu em 2022...
Gabriel - O MDB vai fazer uma grande eleição municipal. Temos uma conjuntura de muita polarização na política e o MDB tem uma importância enorme porque, como não é radical, consegue fazer melhores entregas para a população, é mais efetivo nas suas ações. Eu sempre apoiei as candidaturas do MDB e vou continuar apoiando.
JC - Mesmo de quadros que não apoiaram o senhor em 2022?
Gabriel - Não costumo fazer política para revanche, para briga. Sou do MDB há 24 anos e sempre apoiei meu partido. Nunca pratiquei infidelidade partidária, não seria agora que praticaria.
 

Perfil

Gabriel Vieira de Souza tem 40 anos e é natural de Tramandaí. Veterinário formado pela Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), possui especialização em Gestão Pública pela Universidade Católica Dom Bosco. Iniciou a militância política aos 14 anos, ao ingressar na Juventude do PMDB. Aos 17 anos, já integrava o diretório municipal do partido em Tramandaí e, aos 20 anos, se tornou assessor do então deputado federal Eliseu Padilha (PMDB). Entre 2013 e 2014, foi secretário municipal do Planejamento e Desenvolvimento em Tramandaí. Nas eleições de 2014, obteve vaga de deputado estadual com quase 40 mil votos. Entre junho de 2016 e dezembro de 2018, foi o líder do governo de José Ivo Sartori (MDB) na Assembleia Legislativa. Reeleito deputado, presidiu o Parlamento estadual em 2021. Nas eleições de 2022, foi eleito vice-governador do Rio Grande do Sul na chapa de Eduardo Leite (PSDB), com 3.687.126 votos. É governador em exercício do Estado, desde 26 de dezembro até hoje.

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