Após aprovação de projetos de autoria do governo do Estado que trancavam a pauta na Assembleia Legislativa, a sessão ordinária desta terça-feira foi encerrada em meio aos debates sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 295/2023, que propunha tornar imutáveis os símbolos oficiais do Rio Grande do Sul - o hino, a bandeira e o brasão de armas.
Com alguns aliados fora do plenário, o deputado Rodrigo Lorenzoni (PL), autor da matéria, e outros deputados que assinaram a PEC decidiram derrubar o quórum da sessão.
A PEC dos Símbolos, como é chamada, originalmente propõe "tornar imutáveis" os símbolos estaduais. Após articulações, a expectativa é pela aprovação de uma emenda proposta pelo deputado Luiz Marenco (PDT) em que retira a imutabilidade, mas condiciona as alterações à realização de um referendo público.
O debate acontece principalmente em torno do hino, que carrega uma estrofe apontada como racista por movimentos sociais ligados ao movimento negro - uma reflexão que já existia e que foi reforçada a partir da eleição da primeira bancada negra da história do Parlamento gaúcho.
"Povo que não tem virtude acaba por ser escravo", diz a letra composta por Francisco Pinto da Fontoura, o Chiquinho da Vovó, com música do Comendador Maestro Joaquim José Mendanha e harmonização de Antônio Corte Real. A versão atual é adotada como hino oficial desde 1966.
"Todo o tradicionalismo gaúcho, a simbologia do nosso Estado, é pensado através de um evento histórico - a Guerra dos Farrapos. Naquele momento, existiam pessoas negras escravizadas, que lutaram na guerra com a promessa de alcançar a liberdade e não tiveram. O Massacre de Porongos, que eliminou o batalhão dos Lanceiros Negros, foi a expressão disso. Essa história precisa estar presente também na simbologia do Estado", afirma o deputado Matheus Gomes (PSOL), um dos representantes da bancada negra.
Autor da PEC, Lorenzoni quer a proteção dos símbolos do Estado: "O objetivo do projeto é garantir uma camada maior de proteção aos nossos símbolos. Se for para fazer uma discussão de alteração, que possa ser feito num âmbito de maior número possível de parlamentares e de cidadãos". A legislação vigente permite alterações nos símbolos através de projetos de lei.
O parlamentar aceita a emenda que retira o trecho da imutabilidade e estabelece a condição do referendo, que é uma forma de plebiscito. "Parece razoável, garante o objetivo inicial e vemos com bons olhos essa possibilidade", disse.
Lorenzoni acredita que a acusação é ideológica. "Acho que isso é uma interpretação legítima, que eu respeito, feita pela extrema esquerda. Mas acho uma forçação de barra, uma tentativa de ideologização descontextualizada de um trecho do nosso hino, em que pese a PEC não quer discutir se há racismo ou não. Quer aumentar o grau de segurança dos nossos símbolos", declarou.
Já Gomes acredita que a PEC busca cercear um debate que ainda nem foi provocado legislativamente. "Ele tenta impedir que a gente avance na discussão sobre a questão racial, que envolve essa crítica à frase. É uma ideia para barrar a discussão. (O adiamento da votação) mostra que o Parlamento gaúcho não está em condições de aprovar uma proposta desta envergadura, que tinha um caráter altamente autoritário, que busca criar uma cláusula pétrea de imutabilidade nos símbolos do RS, que não existe em qualquer regime democrático em nível mundial", disse o deputado.
Apesar disso, admite que uma possível proposta de alteração do hino está no horizonte. "Pode partir, sim. É algo que está na nossa perspectiva. Mas queremos amadurecer o debate na sociedade. Não vamos fazer um processo afoito, apressado, improvisado. Queremos estimular a pesquisa e a reflexão da sociedade gaúcha", disse Gomes.
Na próxima terça-feira, a sessão ordinária da Assembleia Legislativa obrigatoriamente se inicia na discussão da PEC dos Símbolos. Por se tratar de uma emenda à Constituição do Estado, são necessários 33 votos para aprovação em dois turnos.