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Para Afonso Hamm, contrato da BR-116 freia desenvolvimento do RS
Deputado federal questiona preços dos pedágios na rodovia: "um dos mais caros do Brasil"
A finalização da duplicação da rodovia BR-116 e a redução do valor dos pedágios nela instalados é uma das principais bandeiras de Afonso Hamm (PP), reeleito deputado federal em 2022, com 109.123 votos.
O presidente da Frente Parlamentar da BR-116, que une forças estaduais e nacionais, afirma que as condições da estrada, que é um dos principais acessos ao Porto de Rio Grande, prejudica o desenvolvimento econômico do Rio Grande do Sul.
Segundo analisou Hamm nesta entrevista especial, as condições da rodovia encarecem o escoamento da produção gaúcha e, inclusive, tira capacidade competitiva do Porto, que perde cargas para outros portos do País.
O deputado ainda comenta a atuação do PP nas eleições estaduais e no governo Eduardo Leite (PSDB) e analisa o posicionamento do partido em nível federal, em relação ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Jornal do Comércio - Como ocorreu de a BR-116 ser uma bandeira para a sua atuação política?
Afonso Hamm - Sou natural de Bagé, engenheiro agrônomo e fiz uma política classista muito forte no setor rural. Trabalhei em uma cooperativa e aí ingressei na política partidária. Eu tomei a iniciativa. As obras tinham em torno de cinco, seis anos e não tinha nenhum quilômetro liberado. Então, tomei a iniciativa de coletar assinaturas para criarmos a Frente Nacional em Defesa da Conclusão da Duplicação da BR-116 do trecho Sul. Fui essa liderança por ter essa base política na Metade Sul. É a obra de infraestrutura mais demandada e priorizada pela sociedade gaúcha. Começou a ter protestos porque a obra praticamente foi desativada, porque o orçamento do governo previa em torno de R$ 50 milhões só, e a necessidade na época era de R$ 600 a R$ 700 milhões. Com um orçamento de R$ 50 milhões, íamos levar em torno de 14 a 15 anos para fazer a obra. Aí que começou uma mobilização de lideranças políticas, empresariais, comunidade como um todo e os meios de comunicação. E também uma mobilização muito forte com a bancada gaúcha. Pedimos apoio de Santa Catarina e Paraná. É uma obra de interesse nacional. Nos últimos quatro anos, conseguimos incluir a conclusão da BR-116 entre as cinco prioridades do Brasil. As cinco prioridades nacionais e do próprio Rio Grande do Sul.
JC - Por que ela é tão importante?
Hamm - É importante porque é o corredor de exportação e de acesso ao Porto do Rio Grande - porque a BR-116, trecho Sul, comunica o norte do Estado, toda Região Metropolitana e Porto Alegre. Toda a exportação de grãos, toda a formatação de fertilizantes… nós temos indústrias, temos o terminal de contêineres que movimenta aí em torno de 1.500 contêineres por mês. Então toda a matéria-prima que chega no RS para movimentar a nossa indústria, com os componentes que são importados, todos os produtos de exportação, além de grão, soja. Tem toda a movimentação dos veículos por estrada. O Porto de Rio Grande é o terceiro maior de movimentação de carga do País e estava perdendo capacidade competitiva.
JC - Por quê?
Hamm - Em função da qualidade da estrada. Não tem duplicação. Outra coisa: muitos acidentes. Muitas mortes. É o trecho em que mais morreu gente, que teve o maior número de acidentes no Estado. Então era a estrada mais perigosa. E estradas com baixa qualidade também têm gasto maior de combustível, de pneu. E além disso, a estrada é fundamental para chegar à praia do Cassino e à toda a Costa Doce, em função do turismo. Temos turistas andando no meio dos caminhões. Em torno de 26 milhões de veículos passam por ano nesse trecho da BR-116 e 75% são caminhões. A riqueza do Rio Grande do Sul e a própria capacidade competitiva do Estado dependem dessa BR duplicada. E agora nós vamos trabalhar nessa questão dos pedágios. Essa obra, que foi orçada em R$ 868 milhões lá em 2012, já teve investido R$ 1 bilhão, mas ainda precisa de em torno de R$ 500 milhões.
JC - O pedágio é um dos mais caros do País.
Hamm - A tarifa para um carro de passeio é R$ 15,20 para cada praça de pedágio. Esse pedágio é de 1998, que foi criado pelo Estado. Em 2000, passou a ser federalizado e tem um contrato que penaliza muito e teve aumentos frequentes. Hoje, ele está entre os três pedágios mais caros do Brasil e, proporcionalmente ao trecho, ele está muito caro. O veículo ao passar em cada praça de pedágio paga R$ 15,20. Onde tem pedágio nesse preço? Um caminhão grande, de nove eixos, gasta, por trecho, R$ 548,00. São R$ 1.097,00 de ida e volta. Tem também a RSC-392, que a gente chama as praças de pedágio do Sul. Então um caminhão que sai de Canguçu e vai a Rio Grande, ele viaja 110 quilômetros de ida, 110 quilômetros de volta e gasta R$ 731,60 de pedágio. Cada passagem, em cada pedágio, é R$ 182,00. É muito caro. A gente já está perdendo cargas para outros portos. Produções do Rio Grande do Sul que estão indo para acessos mais baratos. Estava perdendo carga por causa da qualidade da estrada e agora o que está onerando é o pedágio.
JC - Quando começou esse problema?
Hamm - É oriundo do contrato, que foi acumulando ganhos. Em 2001, um veículo pagava R$ 2,20. O grande problema está na origem desse contrato. Ele é de 26 anos. Só encerra com a concessionária, que é a Ecosul… ninguém é contra a concessionária, estamos questionando o valor que é cobrado pelo pedágio. Até porque pedágio é importante para fazer a manutenção, mas como essa obra foi feita toda ela pública, agora com a duplicação, até surgiu um estudo de novas praças de pedágio. Nós entendemos que não se pode fazer nenhum estudo de mais praças de pedágio sem revisar o preço das atuais praças de pedágio, que é exorbitante.
JC - Até quando vai esse contrato?
Hamm - Até 2026. O que nós estamos buscando nessa mobilização da frente parlamentar é que é muito importante a conclusão dessa obra, manter o ritmo para não parar.
JC - Com o contrato vigente até 2026, como o senhor vai tocar essa bandeira nos próximos anos?
Hamm - Nós recorremos ao Tribunal de Contas da União (TCU), que é um órgão de controle, que faz a contagem do faturamento dos próprios contratos e se esse contrato tem uma grande distorção… O governo executa as obras, tem a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que é uma agência teoricamente neutra, mas que quer cumprir contratos. Na última reunião que tivemos com o (ministro Augusto) Nardes, eu disse que esse tribunal, para isso ele existe, pode refazer os estudos. Ele faz o voto dele e aí precisa convencer os outros ministros. O fato de ter um contrato que foi elaborado há muitos anos, não pode simplesmente falar para seguir cumprindo contrato. Meu entendimento, como presidente da frente, é sensibilizar e fazer a análise técnica dos números. Já tem estudos. Alguém tem que reparar um contrato mal feito. O Rio Grande do Sul está pagando por isso. É capacidade competitiva do Estado. Quando onera transporte e mercadoria, gera um efeito em cadeia para todos.
JC - Já conversou esses temas com a concessionária?
Hamm - Conversamos nas audiências públicas, mas a concessionária não quer conversa. Ela quer o cumprimento do contrato. A ANTT está também nessa linha. Mas uma agência nacional de transportes não é só para cumprir contrato. Se o contrato tem uma distorção… já houve casos de concessionárias do próprio grupo deles e outros que tiveram pedágio superfaturados e tiveram que devolver recursos. Estamos preocupados com a nossa capacidade competitiva, com desenvolvimento, geração de emprego. Em tudo isso reflete. É preciso concluir as obras, e esse pedágio tem que se equilibrar. É uma injustiça com o Estado.
JC - O que acontece após 2026? Haverá nova concessão?
Hamm - Aí vai haver uma nova chamada. Mas não vamos ficar cruzando os braços como parlamentares. Temos a frente parlamentar, temos representação para brigar. Essa é uma luta que não tem bandeira político-partidária. Segundo o (ex) ministro Tarcísio (Freitas, REP), agora governador (de SP), botou a nossa frente parlamentar como um exemplo de mobilização para fazer uma obra andar no Brasil.
JC - O que defende em um eventual novo contrato?
Hamm - Tem que abrir uma nova licitação e abrir concorrência. Não existe domínio. A livre concorrência, quem fizer a melhor proposta, leva. Aí poderemos baixar. Mas vamos ter que esperar mais quatro anos. Quatro anos é uma vida, nós queremos reduzir o máximo que pudermos. Ainda estamos nessa briga.
JC - No Rio Grande do Sul o PP teve candidato próprio ao governo do Estado e no segundo turno apoiou Onyx Lorenzoni (PL). Mas na primeira gestão Leite teve cargos importantes e agora voltou para a base do governo. O senhor acredita que foi um equívoco do partido ter apoiado o Onyx?
Hamm - Não. O apoio ao Oxyx foi em função do alinhamento com o presidente (Jair) Bolsonaro (PL). A participação do PP no governo Leite foi importante. Os deputados estaduais votaram todas as mudanças e os votos do PP foram fundamentais. Mas tínhamos projeto de candidatura própria. Foi natural que quem participou do governo Leite acabou apoiando o próprio Eduardo Leite (no segundo turno). O partido, de uma maneira ampla, optou por esse alinhamento de apoio ao Bolsonaro.
JC - O senhor participou desse apoio por estar em Brasília, mais presente na política nacional?
Hamm - Com certeza. Foi esse vínculo que levou. Porque o PP passou a fazer parte do governo (Bolsonaro) e esse era um ponto de referência. Passadas as eleições, isso são águas passadas. Agora, o partido tem uma participação no governo (Leite). É um novo momento. Eu mesmo não tenho nenhum constrangimento de apoiar o governo Leite. É o nosso governador. Já me coloquei à disposição. A gente precisa apoiar quem está fazendo a gestão, dar sugestões, contribuir, viabilizar recursos. Deputado federal e senadores têm uma participação muito grande. As emendas são impositivas. Vão ter projetos estruturantes
JC - Como avalia o posicionamento do PP no Congresso Nacional em relação ao novo governo federal?
Hamm - Do ponto de vista do presidente (do partido), o Ciro Nogueira, é uma situação de oposição.
JC - Mas tem parlamentares migrando para a base do governo.
Hamm - Tem muitos parlamentares que já constituíram a afinidade. No meu caso, sou oposição, mas o que for importante para o País, para os brasileiros e para o Estado, eu vou apoiar. Acho excessivo o número de ministérios e também falta componente técnico nos ministérios. É a crítica que eu faço.
JC - O que a bancada gaúcha vai levar de questões estratégicas para o desenvolvimento do Rio Grande do Sul?
Hamm - Nos últimos tempos, priorizamos obras fundamentais, a conclusão da segunda ponte do Guaíba, que era um gargalo, a travessia de Santa Maria, o contorno de Pelotas e a própria BR-116. Agora já tem a RSC-386, que está sendo duplicada. A BR-190 vai ter que se mobilizar, porque é o eixo do corredor do Mercosul, é fundamental, une o sul e o norte do Estado. A saúde vai continuar sendo fundamental. Essa questão da irrigação, do armazenamento de água, das políticas de impacto e enfrentamento às estiagens. Essa é uma política que vai precisar de uma atenção. O que a gente faz são políticas emergenciais e acredito que temos que ter uma política permanente de enfrentamento às estiagens e preservação de água, irrigação. Aí entram poços artesianos, cisternas, açudes, equipamento de irrigação, créditos, capacitação. Tem um mundo a fazer nesse aspecto.