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Deltan Dallagnol questiona neutralidade de novo juiz da Lava Jato e cita doação a Lula
"Ele invoca buscar neutralidade, mas a neutralidade alegada com palavras é desmentida pelos fatos", disse Deltan
O deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) reagiu com fortes críticas nesta sexta-feira (17) às declarações do novo juiz responsável pelos casos remanescentes da Operação Lava Jato em Curitiba.
Para Deltan, que coordenou a força-tarefa do Ministério Público Federal na operação até 2020, o juiz Eduardo Appio não tem a neutralidade que prega para julgar os casos envolvendo corrupção na Petrobras e já teria demonstrado desprezo por integrantes da investigação e pelo ex-juiz federal Sergio Moro, hoje senador pela União Brasil-PR.
Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, Appio afirmou que, entre os seus objetivos à frente da 13ª Vara de Curitiba, está o de resgatar a credibilidade da Justiça Federal e assegurar a neutralidade "ideológica ou político-partidária" nos julgamentos, afastando o que classifica de "populismo judicial".
O magistrado assumiu no último dia 7 o posto que foi de Sergio Moro até 2018.
Para Appio, a Lava Jato trouxe coisas boas, como a devolução de dinheiro aos cofres públicos, mas também atropelou a Constituição, ao atender a anseios da sociedade em punir corruptos.
À reportagem e nas redes sociais, Deltan questionou a imparcialidade de Appio ao citar uma doação de R$ 13 que consta em nome do juiz e que foi feita à campanha do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no ano passado.
Nos registros da Justiça Eleitoral, constam dois pagamentos em nome do juiz -o outro é de R$ 40 para uma candidata a deputada estadual do PT no Paraná.
"Ele invoca buscar neutralidade, mas a neutralidade alegada com palavras é desmentida pelos fatos", disse Deltan à reportagem.
O ex-procurador também afirmou que o pai do magistrado, o ex-deputado federal do PP-RS Francisco Appio, que morreu em outubro, chegou a ser mencionado por um dos delatores da Odebrecht, em depoimentos tomados pela Procuradoria-Geral da República (PGR), em Brasília.
Deltan compartilhou em rede social reportagem de 2017 que abordava o suposto apelido do político em repasses eleitorais da empreiteira, "Abelha".
Até a noite desta sexta-feira, a PGR não informou se a citação ao nome de Francisco Appio chegou a gerar algum procedimento investigatório.
Procurado pela reportagem nesta sexta-feira, o juiz não quis comentar sobre os casos.
"Como que um juiz que consta como doador da campanha do Lula consegue convencer alguém de sua imparcialidade na Lava Jato?", disse Deltan à reportagem.
Deltan pediu exoneração do Ministério Público Federal no Paraná em 2021 e, antes de migrar para a política, se tornou um porta-voz da operação.
"Ele [juiz federal Eduardo Appio] é alguém que participou de um programa de caráter nitidamente ideológico, de esquerda, se aliando a pessoas que atacaram a Lava Jato nos últimos anos", afirmou Deltan, em referência a participações de Appio em um programa de debates sobre temas jurídicos, em canal no YouTube, do jornalista Luís Nassif. A Lava Jato era um dos principais alvos dos participantes.
Appio se apresenta como um juiz garantista e é abertamente um crítico dos métodos da Lava Jato, quando trata dos contextos de prisões e delações promovidas pela operação.
O senador Sergio Moro, que saiu em 2018 da 13ª Vara Federal de Curitiba para ser ministro de Jair Bolsonaro (PL), também foi procurado pela Folha para comentar as declarações de Appio, mas preferiu não se manifestar.
Deltan argumenta ainda que dizer que "a Lava Jato não morreu", como Appio declarou à Folha de S.Paulo, "revela uma ingenuidade ou uma falta absoluta de compreensão do mundo".
"Houve uma série de retrocessos no combate à corrupção que impedem que você alcance resultados concretos nas investigações e processos contra crimes praticados por poderosos", disse o deputado.
Para o ex-procurador, isso é só uma "questão semântica", já que, na sua visão, algumas mudanças dos últimos anos impediram a efetiva punição a corruptos, como o envio de casos à Justiça Eleitoral a partir de decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) em 2019.
"Não é o perfil institucional dela [Justiça Eleitoral] atuar em casos criminais, ainda mais de alta complexidade. Então, o sistema agora impede que exista uma efetividade no trabalho contra a grande corrupção", afirmou Deltan.
O deputado também inclui na lista de retrocessos para a Lava Jato a impossibilidade de prisão já após condenação em segunda instância. Para o ex-procurador, isso "desincentiva colaborações premiadas e acordos de leniência".
"Se você entende o trabalho da Lava Jato como um trabalho de colocar carimbos nos processos e tomar decisões que jamais vão ser efetivas, aí claro que os procedimentos burocráticos vão seguir em frente e aí a Lava Jato não morreu. Mas é uma questão semântica. O que é a Lava Jato? Eu vejo como uma ação efetiva de combate à corrupção que era capaz e foi capaz de colocar criminosos na cadeia, independente do poder deles, e recuperar milhões para os cofres públicos", diz Deltan.
Além de participar de debates jurídicos, Appio já manifestou críticas à Lava Jato em artigos em anos anteriores.
Em 2021, logo após o STF anular condenações do Lula, o novo magistrado da 13ª Vara Federal de Curitiba publicou um texto propondo "dez medidas para assegurar maior transparência" na atuação de autoridades judiciais e membros do Ministério Público.
Entre as dez propostas de Appio, estava a quarentena eleitoral, para proibir que "juízes, promotores e policiais assumam cargos públicos na administração direta ou indireta".