Guilherme Kolling e Diego Nuñez
O governador Ranolfo Vieira Júnior (PSDB) projeta que até o fim deste ano o Estado irá executar, com recursos próprios, R$ 5 bilhões em investimentos do Programa Avançar. São aportes em diversas áreas, como segurança, saúde, educação e infraestrutura, que vem sendo realizados desde 2021. O tucano ainda promete fechar 2022 com superávit no Estado e deixar R$ 1,5 bilhão em caixa para que o pacote de R$ 6,5 bilhões do Avançar seja concluído em 2023, no próximo governo.
Em uma semana difícil e tensa no pós-eleição, em que ficou envolvido com o desbloqueio de estradas, Ranolfo concedeu entrevista ao Jornal do Comércio na sexta-feira, quando projetou entregas que pretende finalizar ainda em 2022, como a privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), o leilão do Cais Mauá e a parceria público-privada (PPP) para o presídio de Erechim.
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Jornal do Comércio - Após a eleição, houve bloqueio de rodovias e atos pedindo intervenção em frente a comandos militares. Qual é o papel dos governadores para manter a estabilidade política do Brasil nesse cenário?
Ranolfo Vieira Júnior - As eleições se deram de maneira republicana, democrática, não há qualquer 'senão' ao funcionamento da urna eletrônica, da Justiça Eleitoral. Até podemos, individualmente, estarmos irresignados com uma derrota, seja do (candidato a) deputado estadual, federal, senador, governador ou presidente da República. Mas devemos obediência às urnas. E esses "movimentos democráticos" são contra a democracia. As pessoas podem se resignar. Daqui a dois anos tem eleições municipais e daqui a quatro anos tem nova eleição para governador e presidente da República.
JC - Respeito ao resultado...
Ranolfo - A premissa de respeitar o resultado da eleição, isso é democracia! No 1º turno, meu candidato, Eduardo Leite (PSDB), quase não foi ao 2º turno. O que fizemos? Trabalhamos muito para reverter a situação. Quem fez 26% passou a 57% (dos votos válidos) no 2º turno. Serve de exemplo para aqueles que não foram vencedores nesta eleição.
JC - E o papel dos governadores neste cenário?
Ranolfo - Cabe aos governadores o que fizemos aqui no Estado: dar condições para que as coisas transcorram dentro da mais absoluta normalidade. No domingo à noite, quando recebi, do secretário de Segurança Pública, a notícia de que na BR-470, em Garibaldi, havia o primeiro protesto, repassei que não iríamos admitir. Primeiro, criamos um gabinete de crise. Depois, autorizamos o batalhão de polícia de choque para desobstruir a BR-116 em Novo Hamburgo. Na terça, liberamos a Refinaria Alberto Pasqualini para normalizar a distribuição (de combustíveis). Fechamos a terça-feira à noite sem nenhuma rodovia mais bloqueada. Na quarta-feira ainda tivemos o episódio lamentável em que quatro equipes de profissionais da imprensa, acabaram sendo agredidas. Não podemos compactuar com isso. A imprensa é livre, um pilar da democracia. Um (dos agressores) foi autuado em flagrante, recolhido ao sistema (prisional), os outros identificados e vão receber processo. Nosso gabinete de crise permanece ativo. E agora, a Polícia Civil e a Polícia Federal, juntamente com os Ministérios Públicos estadual e federal, estão na fase final de identificação de lideranças, e aí vem a responsabilização criminal dessas pessoas. Então, o papel dos governadores é fazer com que a normalidade se reestabeleça, é o que todos desejamos para ir em frente.
JC - O senhor tem mais dois meses à frente do governo do Estado com vários projetos em andamento. Como projeta esses dois meses finais?
Ranolfo - Temos uma série de projetos a concluir no Avançar nesses quase 60 dias que temos pela frente. A segunda questão importante é manter o Estado equilibrado, sustentável do ponto de vista fiscal. Então quero devolver ao Eduardo Leite o governo do Estado com as contas todas em dia.
JC - Vai entregar um novo superávit neste ano?
Ranolfo - Vou entregar superávit nesse ano. Vamos deixar, inclusive, R$ 1,5 bilhão em caixa a fim de garantir a execução daqueles investimentos do projeto Avançar que não restarem concluídos neste ano.
JC - Isso significa que vai dar cerca de R$ 5 bilhões de projetos executados, considerando que o Avançar é de R$ 6,5 bilhões.
Ranolfo - Exatamente. Em torno de R$ 5 bilhões vamos conseguir executar (até o fim de 2022). Então, primeiro é o pagamento de fornecedores e dos nossos servidores - aliás, a segunda e última parcela do 13º salário vamos pagar no dia 30 de novembro. Além de honrar todos os pagamentos, a segunda questão é a transição, que já abrimos nesta semana, para repassar tudo ao próximo governador. E temos ainda a votação da Lei Orçamentária Anual (LOA) 2023 na Assembleia Legislativa.
JC - Deve passar dentro do prazo regimental...
Ranolfo - Dentro do prazo regimental, normal. E temos algumas privatizações importantes.
JC - A privatização da Corsan sai ainda neste ano?
Ranolfo - Se tudo ocorrer como estamos planejando, deve sair a Corsan nesse ano. Temos também o (leilão do) Cais Mauá que deve sair esse ano, outro grande projeto que vai mudar a cara de Porto Alegre e do Estado, a concessão do Cais Mauá. Foi remarcado para 12 de dezembro. E temos a PPP do presídio de Erechim, em dezembro também.
JC - A concessão dos outros blocos de rodovias também?
Ranolfo - Não, em um dos blocos temos que retirar a (rodovia ERS-) 118. A questão é a sustentabilidade (financeira) desse bloco sem a 118, isso demanda estudos. Enfim, vai diminuir obras, depende desse reestudo, audiência pública, uma série de requisitos.
JC - E qual é a expectativa para as três agendas de privatizações do Estado nesse ano?
Ranolfo - Nosso parceiro que faz a modelagem, o BNDES, tem nos passado que a expectativa é muito positiva, tanto para Corsan, quanto Cais Mauá e também a PPP de Erechim.
JC - Ter passado o período de eleições ajuda a avançar nesses pontos?
Ranolfo - A eleição é definidora. Se o vencedor não fosse o governador Eduardo Leite, eu não colocaria a Corsan a privatizar. Suspenderia tudo, porque durante a campanha, o opositor do Eduardo (Onyx Lorenzoni, PL) dizia que era contrário. Então, qual investidor que viria? Diferentemente do investidor que se apresentar agora, que sabe que há continuidade do mesmo governo e que não vai haver sobressaltos com relação a esses desses leilões.
JC - Outro ponto previsto para ser encaminhado neste ano é o empréstimo de US$ 500 milhões com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Ranolfo - Para o pagamento de precatórios. Já foi aprovado pela Comissão de Financiamentos Externos (do Ministério da Economia), depende de outros trâmites, mas está encaminhado.
JC - Outro projeto importante é o complexo com a usina térmica a gás em Rio Grande, pode ser o maior investimento privado da história no Estado, mais de R$ 6 bilhões.
Ranolfo - Tenho participado ativamente desta discussão com a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), estive duas ou três vezes na Aneel, e também conversando com o Superior Tribunal de Justiça a respeito desta questão. Saí muito otimista de lá, até o final deste mandato devemos ter algum posicionamento da Aneel, pela questão da sustentabilidade energética, e seria o maior investimento, R$ 6 bilhões para a Zona Sul do Estado.
JC - O senhor ainda não concluiu o mandato, tem mais dois meses. Mas poderia fazer uma avaliação, de forma geral, desse seu mandato como governador do Rio Grande do Sul?
Ranolfo - Na realidade não é um novo governo, é a sequência de um mesmo governo. Fomos eleitos juntos em 2018, Eduardo e eu. Como vice-governador participei de todas as decisões mais importantes do Estado, embora acumulasse a Secretaria de Segurança Pública. Então, isso me deu tranquilidade no momento que eu assumi (como governador). Não mudamos um milímetro daquilo que tínhamos planejado lá em 2017/2018 quando fomos eleitos. Segundo, cada um tem o seu jeito pessoal de conduzir o governo. Mas isso não mudou o rumo do governo. Demos seguimento ao que estava posto, tendo a responsabilidade fiscal como o objetivo principal do governo, não gastar mais do que arrecada. E as entregas do projeto Avançar. O Estado do Rio Grande do Sul ficou durante muito tempo sem ter a possibilidade de investir.
JC - Enferrujou a máquina...
Ranolfo - Perdeu a vocação de fazer as coisas andarem, ter projetos. A máquina ficou desajeitada, porque por muito tempo o Estado não teve recurso. Tivemos que fazer um forte monitoramento dentro do Avançar, com a nossa secretária adjunta de Planejamento, Governança e Gestão, Izabel Matte, que foi fundamental nisso. Diuturnamente, com as secretarias, secretários, com a área técnica, cobrando, fazendo, para isso acontecer. Vamos conseguir executar em torno de R$ 5 bilhões dos R$ 6,5 bilhões. Foi um embate diário para que efetivamente as coisas acontecessem. Então, se eu fizer o somatório, eu vejo que foi positivo (o governo). Seguiu na mesma linha.
JC - E enfrentou desafios extraordinários, como agora…
Ranolfo - Desafios temos todos os dias, é o que mais se tem aqui (no Piratini). E em meio a um período eleitoral... É importante que se diga isso, a dificuldade que é conseguir governar de maneira equilibrada num período eleitoral e se conseguiu fazer isso. Mas tenho dito e vou repetir aqui para vocês: talvez o Estado não tenha reelegido ninguém até este momento exatamente pela dificuldade que deve ser governar e ser candidato. Talvez, um dos maiores acertos que nós tenhamos tido, o Eduardo e eu, foi termos feito dessa forma, o Eduardo é candidato e o Ranolfo é governador.
JC - Qual é o seu futuro político depois desses dois últimos meses de mandato como governador do Estado?
Ranolfo - O que me move nesse momento e o que faz eu pensar e acordar e trabalhar todos os dias, fazer a minha caminhada, é concluir o mandato como tem que ser, fazendo as entregas que tem que fazer. E aí repassar, lá dia 1º de janeiro de 2023 ao governador Eduardo Leite. O governador Eduardo tem dito que eu posso escolher o local que vou trabalhar, tenho ouvido isso da imprensa e dele também, mas nós não sentamos ainda para conversar sobre isso. Então, o futuro a Deus pertence. Não vou deixar a vida pública e a vida política. Mas isso não quer dizer que eu vá para o lugar A, B ou C. Enfim, não há conversa, não há absolutamente nada definido. Como disse, não é o que me move neste momento. Vamos concluir (o mandato) e depois a gente vê.
JC - Uma questão partidária do PSDB: o partido diminuiu pela metade a bancada no Senado e diminuiu de 23 para 13 cadeiras na Câmara de Deputados, além de perder o governo do estado com maior eleitorado do País que é São Paulo, governado pelo PSDB há 28 anos seguidos. Mas teve sucesso no Rio Grande do Sul...
Ranolfo - Tivemos sucesso no Rio Grande do Sul, em Pernambuco, com a primeira mulher eleita governadora daquele estado, a querida amiga Raquel Lyra, e ainda conseguimos a sucessão no Mato Grosso do Sul, do governador Reinaldo Azambuja, que fez seu sucessor, a exemplo do que estamos fazendo no Rio Grande do Sul.
JC - Como fica o PSDB gaúcho em relação ao PSDB nacional? Cresce em importância?
Ranolfo - Sem dúvida, o PSDB gaúcho cresce em importância... Lamento os equívocos do PSDB nacional, os números falam por si. O primeiro passo talvez seja reconhecer esses equívocos. O segundo: o Rio Grande do Sul sai fortalecido, porque a exemplo de Mato Grosso do Sul, está fazendo o seu sucessor. Sai fortalecido também porque o nosso governador Eduardo é uma figura nacional já hoje. E sendo uma figura nacional, com essa reeleição, com essa quantidade e percentual de votos, novamente aparece nesse cenário nacional como uma grande liderança do País. Então, o PSDB tem condições, sim, de voltar a crescer e ter o mesmo lugar que teve em tempos passados.
Perfil
Ranolfo Vieira Júnior, 56 anos, nasceu em Esteio. Servidor público há mais de 30 anos, é delegado de Polícia desde 1998 e dirigiu o Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) por seis anos. Entre 2011 e 2014, foi chefe de Polícia na gestão do governador Tarso Genro (PT), período em que criou o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa. No período, presidiu o Conselho Nacional de Chefes de Polícia Civil do Brasil. Em 2014, concorreu à Assembleia Legislativa, ficando como suplente. Coordenou a bancada do PTB no Parlamento. Foi secretário de Segurança Pública e Cidadania de Canoas em 2017, na gestão de Luiz Carlos Busato (PTB). É formado em Direito, tem especialização em Gestão de Segurança na Sociedade Democrática e foi professor da Ulbra em Canoas e da Academia da Polícia Civil (Acadepol-RS). Eleito vice-governador em 2018, acumulou o cargo de secretário de Segurança Pública de 2019 a 2022. Filiou-se ao PSDB em 2021. Em 31 de março deste ano, após a renúncia de Eduardo Leite (PSDB), assumiu o cargo de governador do Rio Grande do Sul.