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entrevista especial

- Publicada em 19 de Janeiro de 2020 às 21:52

Presidente da Famurs projeta que nova Previdência dos municípios será adiada

Presidente da Famurs, Eduardo Freire diz que eleições prejudicam debate sobre Previdência dos municípios

Presidente da Famurs, Eduardo Freire diz que eleições prejudicam debate sobre Previdência dos municípios


CLAITON DORNELLES /JC
Após o primeiro ano do governo Jair Bolsonaro, que concluiu a votação da reforma da Previdência e enviou à Câmara um projeto de revisão do pacto federativo, as impressões do presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), Eduardo Freire (PDT), são duas: de que os municípios deveriam já ter sido incluídos nas alterações previdenciárias, sem esperar pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Paralela, e de que houve pouca participação dos prefeitos na discussão e na composição do novo pacto.
Após o primeiro ano do governo Jair Bolsonaro, que concluiu a votação da reforma da Previdência e enviou à Câmara um projeto de revisão do pacto federativo, as impressões do presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), Eduardo Freire (PDT), são duas: de que os municípios deveriam já ter sido incluídos nas alterações previdenciárias, sem esperar pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Paralela, e de que houve pouca participação dos prefeitos na discussão e na composição do novo pacto.
O presidente da Famurs também antecipa o clima das eleições municipais, elogiando o fim das coligações proporcionais, mas também projetando que o pleito protelará as alterações da reforma da Previdência que já valem para os municípios, como a aplicação de alíquotas de contribuição progressivas. "Dificilmente, os municípios terão força nos Poderes Legislativos para fazer essas mudanças", prevê.
O dirigente municipalista lamenta a forma como foi discutido o pacto federativo. "Não tivemos o protagonismo na modelagem do projeto apresentado pelo governo." O resultado disso foi a surpresa com a proposta de extinção de municípios abaixo de 5 mil habitantes com menos de 10% de arrecadação própria. "A grande maioria desses pequenos municípios é viável", até mais do que os de porte médio, e são "geradores de riqueza", aponta.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o pedetista também avalia com preocupação alguns dos efeitos imediatos de uma iminente reforma tributária. "Tem a corrente que diz que, se você vai diminuir a carga, a economia vai ser alimentada e, no futuro, com a economia melhor, você arrecada mais. Mas para isso, precisa tempo, isso não pode ser tirado de uma hora para outra."
Jornal do Comércio - Quais são as expectativas para este ano quanto às bandeiras municipalistas?
Eduardo Freire - Temos dois pontos importantes que estão tramitando no Congresso e se iniciaram em 2019: um diz respeito ao novo pacto federativo. Hoje, menos de 17% de tudo que é arrecadado chega diretamente aos municípios, então buscamos há muito tempo esse pacto federativo mais justo. Ocorre que não tivemos o protagonismo na modelagem do projeto apresentado pelo governo; não houve muita oportunidade de opinar sobre sua elaboração. Ainda estamos buscando algumas modificações. Também fomos surpreendidos com a questão da possibilidade de extinção de pequenos municípios - menores de 5 mil habitantes que não atingem 10% da arrecadação própria. Até porque consideramos que arrecadação própria não é parâmetro para analisarmos a realidade socioeconômica desses municípios. Temos que analisar outras tantas receitas ou circunstâncias de cada município. A intenção é que esse projeto não vá à votação, que ele não avance na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
JC - Que pontos deveriam ser alterados?
Freire - A intenção é desburocratizar os trâmites de distribuição de recursos e também aumentar as parcelas que chegam diretamente aos municípios, ou que não seja necessário que esse recurso seja enviado ao estado, depois vá para a União e retorne ao município. Queremos facilitar esse processo, fazendo com que a burocracia diminua e também que esse percentual possa chegar a 25% ou 30% diretamente aos municípios. Mas há pontos positivos que vão diminuir a burocracia, como agora, quando foi aprovado, no final do ano, que as emendas parlamentares não precisarão mais ter gerenciamento da Caixa Econômica Federal ou outra instituição financeira: elas serão repassadas diretamente aos municípios. Isso facilita, os processos licitatórios saem mais rápido.
JC - E em relação à extinção de pequenos municípios?
Freire - Foi o que nos deixou mais apreensivos. Se formos considerar o critério que foi utilizado (para determinar a extinção), de atingir 10% de arrecadação própria, mais de 80% dos municípios do Brasil não atinge 10%; não são só pequenos municípios: a grande maioria, 82% de todos os municípios do Brasil não atingem 10% de arrecadação própria, porque eles consideram apenas IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), ITBI (Impostos de Transmissão de Bens Imóveis) e ISS (Imposto Sobre Serviços), e esses impostos não são suficientes para medir a realidade financeira e socioeconômica desses municípios.
JC - Isso poderia resultar em judicialização.
Freire - Não só isso: causaria injustiça, porque a grande maioria desses pequenos municípios é viável, e até muito mais viável do que municípios de porte médio. Eles são geradores de riqueza. Por exemplo, 75% do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) de um município industrializado de 5 mil habitantes vai para o estado, então ele está gerando riqueza; apenas 25% retorna para ele, e o ICMS não é considerado uma receita própria, não entra nessa análise. Do IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores), 50% retorna para o município, mas não é considerado uma receita municipal. No Rio Grande do Sul, 90% desses municípios são autossustentáveis, mesmo não atingindo esses 10% de receita própria. Além disso, os municípios-sede que incorporariam esses pequenos municípios receberia uma cota apenas de 0,2% (do Fundo de Participação dos Municípios) por município. As outras seis cotas (disponibilizadas aos pequenos municípios atualmente) seriam distribuídas em regiões mais populosas, então faria com que muitas regiões perdessem dinheiro público. Em nossa região, lá no Noroeste do Estado, se 12 municípios incorporassem outros três, teríamos R$ 100 milhões anuais a menos de dinheiro público naquela região.
JC - Como fica a aplicação dos itens da reforma da Previdência, das adequações imediatas por parte dos municípios?
Freire - Há um prazo de dois anos agora (para as adequações), então este ano de 2020 é muito difícil; os prefeitos dificilmente vão optar por fazer essa mudança agora, em ano eleitoral... Da alíquota progressiva, de todas (as mudanças). Por isso era importante que fossem incluídos (na reforma), em 2019, os municípios que possuem fundo próprio (de Previdência), porque vão protelar provavelmente essa discussão para 2021. Dificilmente os municípios terão força nos Poderes Legislativos para fazer essas mudanças. Os servidores acabam se mobilizando.
JC - Em relação ao período de estiagem e seca que o Estado vem enfrentando, como a Famurs está agindo?
Freire - Um dos pontos a ser abordado é a facilitação dos trâmites desses processos (de declaração de emergência e calamidade) junto à Defesa Civil, junto ao governo do Estado, porque você tem que comprovar o prejuízo para que seja aceita a situação de emergência. O município decreta, faz um levantamento e apresenta ao governo do Estado. Ele vai homologar ou não, considerando a comprovação daqueles prejuízos. Após a homologação, isso tem que tramitar rapidamente também no governo federal.
JC - No médio prazo, a crise climática tende a se intensificar. Como a Famurs trabalha a questão da prevenção com os municípios?
Freire - Primeiramente, precisamos ter a consciência com relação ao meio ambiente, ter a responsabilidade de saber que, muitas vezes, ações que podem melhorar a produção hoje, podem prejudicar o mercado ali na frente. Então devemos fazer com que o aumento da produtividade ocorra junto com a responsabilidade ambiental. Defendemos uma legislação ambiental que realmente proteja o meio ambiente, que pense não só no momento, como também no futuro, isso é importantíssimo.
JC - Nesse sentido, como avalia as mudanças no Código Estadual do Meio Ambiente?
Freire - Foram positivas, mas esperávamos que essas discussões tivessem um tempo mais condizente com aquilo que foi mudado. Mais de 400 pontos foram alterados, e isso foi discutido apenas em 35, 40 dias. Esperávamos que houvesse mais debates, que pudéssemos discutir mais com as entidades, dar mais subsídios aos legisladores, não com essa ânsia de buscar investimentos a qualquer custo. Muitos pontos podem ser positivos agora, mas, ali no futuro, podem acabar prejudicando.
JC - Como está a questão dos repasses da saúde aos municípios? Está sendo cumprido o acordo para o pagamento de R$ 200 milhões?
Freire - O acordo de R$ 200 milhões está sendo cumprido. O último pagamento deve ocorrer em setembro de 2020. Só que esses R$ 200 milhões não fazem parte dessa dívida; há R$ 550 milhões a receber. Estamos tratando com o governo, principalmente, através de um projeto que está tramitando na Assembleia Legislativa que autoriza a dação de imóveis do governo do Estado para abater essas dívidas.
JC - E em que estágio está esse projeto?
Freire - Assinamos um protocolo de intenções em julho, montamos um grupo de trabalho que elaborou o projeto em conjunto com a Secretaria de Apoio aos Prefeitos, a Secretaria de Saúde e membros da Famurs, apresentamos ao governador, que protocolou esse projeto na Assembleia Legislativa no mês de novembro, e ele está tramitando. Agora, na volta do recesso, estaremos conversando com os líderes e com o futuro presidente da Assembleia, Ernani Polo (PP), a fim de que, no máximo, até o final de março, possamos fazer as operações necessárias. Cerca de 90 municípios têm interesse em imóveis do Estado. A maioria deles são municípios de médio e grande portes, aqueles que mais têm recursos a receber; se nesses 70 municípios conseguirmos fechar, pode baixar até 80% dessa dívida. Agora, é correr contra o tempo e fazer com que essas operações possam ocorrer ainda em 2020, porque isso é muito importante para o fechamento de contas dos prefeitos no final do ano. Também existe a possibilidade de que pequenos municípios, de até 5 mil habitantes, que não têm imóveis, os consórcios de saúde de que esses municípios fazem parte poderão receber o imóvel do Estado e realizar leilões.
JC - Qual a expectativa sobre as eleições municipais, principalmente com o fim das coligações proporcionais?
Freire - Pessoalmente, acho positiva essa alteração com relação às coligações proporcionais. Muitos partidos são utilizados como balcão de negócios, partido de aluguel, então, com essa nova legislação, isso tende a diminuir a quantidade de partidos. Notamos que, nos municípios, muitos partidos não estão preparados para essa mudança, pois ainda existe uma incógnita muito grande sobre como será a movimentação das lideranças nesses municípios. Outro ponto que é importante também é com relação à participação das mulheres, com uma fiscalização mais efetiva da Justiça Eleitoral e do próprio Ministério Público Eleitoral em relação às candidaturas-laranja.
JC - O que a entidade espera da reforma tributária?
Freire - Existem três projetos de reforma tributária tramitando, mas há um que já está mais avançado, e é um projeto que nos causa muita apreensão. A expectativa da população é uma reforma não só que desburocratize, transformando quatro, cinco impostos em apenas um, mas também é diminuir a carga (tributária). Só que, diminuindo a carga, consequentemente, diminui o repasse (a estados e municípios). Tem a corrente que diz que, se você vai diminuir a carga, a economia vai ser alimentada, e, no futuro, com a economia melhor, você arrecada mais. Mas, para isso, precisa tempo, isso não pode ser tirado de uma hora para outra, especialmente em um momento de crise. E outro ponto também é que consideramos que não pode ser deixada de lado a valorização daqueles municípios produtores, dos estados produtores, que era o objetivo, lá atrás, da Lei Kandir. Estamos contratando um pessoal aqui pela Famurs, a CNM (Confederação Nacional dos Municípios) também está em parceria para fazer uma análise geral, para que possamos ter um quadro específico de cada município do Estado. Vamos saber qual região perde, qual região ganha, e de que forma podemos compensar.

Perfil

Eduardo Russomano Freire nasceu em 18 de dezembro de 1977, no município de Palmeira das Missões. Residiu nessa cidade durante toda a vida, onde concluiu não só os ensinos Fundamental e Médio, mas também a faculdade de Direito. Em 2002, tornou-se bacharel pela Universidade de Passo Fundo (UPF), no campus instalado em Palmeira das Missões. Inspirado na trajetória política do pai - o pedetista José Américo Freire, que foi prefeito da cidade entre 1993 e 1996 -, filiou-
-se ao PDT aos 16 anos. Iniciou a trajetória política militando na Juventude Socialista, órgão partidário destinado aos jovens pedetistas. Foi procurador-
-geral do município de 2005 a 2008. Quando deixou a Procuradoria-Geral, concorreu pela primeira vez a vereador da cidade. Na estreia, elegeu-se com votação recorde, recebendo mais de 10% dos votos do eleitorado municipal. Em 2012, venceu a eleição para a prefeitura de Palmeira das Missões. Em 2016, foi o primeiro prefeito a se reeleger na cidade. Em 2019, assumiu a presidência da Famurs pelo biênio 2019-2020.