Daniela Garcia Giacobbo
Pichação não é manifestação de arte ou de expressão: o art. 65 da Lei 9.605/98 a considera crime contra o "ordenamento urbano, patrimônio cultural e meio ambiente", sujeito à detenção e multa. As penas são baixas, de difícil execução e não há a devida fiscalização. O §2º do mesmo artigo não mais considera grafite crime, desde que valorize um patrimônio, público ou privado. E se aprovado pelo órgão público responsável, ou pelo proprietário.
Mas "valorizar um patrimônio" é um conceito jurídico aberto. Valor artístico, estético, cultural, econômico? Do ponto de vista de quem vê ou de quem executa a arte? Mesmo no mundo atual, arte tem valoração e concepção particular e uma intervenção urbana reconhecida, como a de Eduardo Kobra, com seus murais no mundo inteiro, pode não ser uma unanimidade. Principalmente onde se inserem.
Se inserido em um ambiente histórico, com muitos prédios e monumentos tombados, como o centro de Porto Alegre, o muralismo pode não ser apropriado. O Decreto Lei 25/37 é claro quanto à necessidade de consulta ao Iphan, que, na Portaria 420/10 (intervenções em bens edificados tombados e no entorno), dispõe que a inserção de pinturas artísticas em muros e fachadas é reforma simplificada, sujeita à autorização, não podendo incluir novos elementos.
A prefeitura de Porto Alegre autorizou a intervenção artística na Travessa Passarinho, no entorno da Casa de Cultura Mário Quintana, esse tombado pelo Iphae. As pinturas em homenagem ao poeta tiveram resultado excelente, transformando o local antes abandonado, como no "Beco do Batman" (SP), mas, em certos contextos históricos podem não funcionar, como no entorno dos icônicos Ponte dos Açorianos e Viaduto Otávio Rocha, cujas revitalizações têm consumido muito tempo e recursos públicos.
Já o muralismo em bens não históricos (não tombados) inibe pichações mas não é a única solução para locais abertos e de grande fluxo. Sem falar que o conteúdo político ou de engajamento social pode ser um problema ao gestor público, além das cores e traços de gosto às vezes duvidoso, como a intervenção no Viaduto Tiradentes, que homenageia um cachorro.
As coberturas vegetais adotadas pela prefeitura de São Paulo, desde 2000, seriam solução simples, permitindo jardins verticais, até como medida de compensação ambiental. Lá, muros e paredes de bens públicos, como viadutos, são revestidos por heras , além de outras plantas.
Não só para viadutos, essa seria uma solução perfeita para parques, por se inserir devidamente na paisagem. No Parque Moinhos de Vento, houve um início disso, encobrindo pichações em um muro, por iniciativa de particulares, mas a prefeitura precisa dar continuidade. O verde, sim, pode ser uma unanimidade.
Advogada especializada em Direito Ambiental e Direito de Energia e professora universitária