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Publicada em 08 de Maio de 2024 às 18:38

Máquina do tempo

ARTE/JC
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Valny Giacomelli Sobrinho
Valny Giacomelli Sobrinho
"Tempo é dinheiro" — assevera um dos aforismos mais populares da economia. Trata-se, porém, do tempo cronológico, não do meteorológico. Embora não controle nem um nem outro, a ciência econômica esteve, tradicionalmente, muito mais voltada para o primeiro.
Durante sua era clássica, os recursos e serviços da natureza eram considerados gratuitos. Mais adiante, para piorar, as vertentes ditas sociais da economia dissociaram as questões humanas das ambientais. Ideologicamente orientados, os pensadores sociais da economia consideravam as preocupações ambientais um desvio reprovável da luta (de classes) por condições básicas de sobrevivência. Para eles, o meio ambiente seria um "bem de luxo", cuja demanda aumentava com a renda e cujo interesse se identificava, portanto, com o das classes mais ricas.
Os ventos da mudança só sopraram mais fortes lá pelos anos 1970, depois do colapso em série de várias economias centralizadas e planificadas. O enfraquecimento político-ideológico dessas experiências malsucedidas vislumbrou nos problemas ambientais, que elas tanto mascararam, uma perspectiva de desenterrar a propaganda da planificação econômica. Foi, então, que a agenda verde se tingiu de vermelho, no rastro da propriedade comum dos bens ambientais.
Daí por diante, o ambientalismo corroeu a economia, que, como ciência, já bem antes havia desenvolvido técnicas quantitativas para internalizar custos e benefícios externos ao mercado. Tal corrosão não só desfavoreceu a difusão das técnicas oferecidas pela economia ambiental, como também cristalizou o descaso da economia convencional com os riscos climáticos, que sempre existiram. Por conseguinte, as perdas econômicas causadas por eventos climáticos ficaram, em boa medida, fora do cálculo dos custos dos investimentos, inclusive dos investimentos públicos e privados em infraestrutura (pontes; estradas; redes de esgoto, eletricidade e comunicação; reservatórios d'água etc).
Rígida e mal-adaptada, a infraestrutura dominante oferece baixa resistência aos espasmos do clima. Não obstante, como os custos climáticos são subestimados, o mercado acaba favorecendo os investimentos mais vulneráveis, enganosamente mais baratos. Então, à medida que os custos verdadeiros começam a elevar-se dos escombros deixados pelas catástrofes, percebe-se que o tempo do dinheiro se mede mais pelo céu que pelo relógio.
Economista ambiental
 

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