Mesmo com longos períodos de estiagem, nos últimos anos as culturas da uva e de azeitonas prosperaram, especialmente entre as regiões da Campanha e Fronteira Oeste. Mas os desafios com extremos de clima, que agora incluíram também vendavais, tempestades e cheias, criaram uma nova necessidade de investimentos para que os dois setores produtivos se adaptem o mais rápido possível.
A perspectiva é de que nos próximos anos, especialmente a partir de 2026, as culturas agrícolas das regiões da Fronteira Oeste e Campanha tenham aliados importantes na infraestrutura para a irrigação. Entre investimentos estaduais e federais, são previstos mais de R$ 300 milhões para finalizar os projetos das barragens de Taquarembó, entre Dom Pedrito e Lavras do Sul, Jaguari, entre Lavras do Sul e São Gabriel, e Arvorezinha, em Bagé.
A estimativa é de que, somente com Jaguari e Taquarembó, seja possível garantir 117 mil hectares irrigados - mais do que o dobro dos atuais 51 mil hectares -, com 238 milhões de metros cúbicos em capacidade de água armazenada. Já o investimento da barragem de Arvorezinha ainda terá a importância de garantir o abastecimento de água à população da região.
É neste cenário que a Miolo mantém 450 hectares de cultivo de uva em Santana do Livramento, na Vinícola Almadén, e outros 200 na Vinícola Seival, na Campanha, em Candiota. Em ambas as lavouras, o investimento em irrigação já é realidade para garantir o equilíbrio na produção.
"É uma região mais plana, tem um terroir diferente e exige um manejo bem diferente do que temos, por exemplo, na Serra. Temos verificado, especialmente entre a Fronteira e a Campanha, o clima com tendência de muita seca. A cada dez anos, são seis ou sete mais secos, então, o investimento em irrigação é necessário e já operamos", diz o diretor superintendente da Miolo Wine Group, Adriano Miolo.
Como resultado da produção entre as duas vinícolas, anualmente a Miolo processa 5,3 milhões de litros de vinhos.
Produtores da Campanha buscam uvas mais resistentes
Em 2024, depois de cinco excelentes safras em oito anos, os produtores de uvas da Campanha experimentaram uma redução que chegou a 40% da produtividade. No entanto, os relatos apontam alta qualidade nos futuros vinhos que resultarão das uvas mais resistentes.
De acordo com o presidente da Associação dos Vinhos da Campanha Gaúcha, Pedro Candelária, o padrão do vinho mantém-se, mesmo que para isso tenha sido preciso colher menos. A prioridade, ele salienta, está na qualidade do vinho reconhecido desde 2020 com o selo de identificação geográfica da região. A associação reúne 19 vinícolas locais e 267 rótulos reconhecidos.
"Os grandes vinhos são feitos justamente a partir do estresse das plantas, especialmente à falta de chuva. Percebemos que a frequência mais acelerada de eventos extremos, a partir das mudanças climáticas que vieram para ficar, nos obrigarão cada vez mais a antecipar movimentos. Precisamos monitorar o nível de estresse das plantas e, para isso, sabermos qual o déficit de água que ela terá é essencial. Exigirá maiores investimentos dos produtores não apenas no manejo, mas em tecnologia para a lavoura", explica o coordenador do curso de Enologia da Unipampa, Marcos Gabbardo.
Segundo o especialista, que presta acompanhamento técnico aos produtores da Associação Vinhos da Campanha, a irrigação, e principalmente a ciência para a produção serão palavras-chave nos próximos anos para a região. Hoje, há até 1,7 mil hectares de vinhedos plantados na Campanha. E há ainda os campos experimentais da Unipampa, onde são produzidas 90 cultivares sendo testadas justamente em relação ao clima.
"A Campanha é muito ampla, são mais de quatro milhões de hectares na região, e com mudanças climáticas específicas. Em relação ao vinho, podemos dizer que, com o provável maior aquecimento, teremos nos próximos anos maior teor alcoólico na bebida, mas tudo dependerá da forma como se controlará esses eventos climáticos", diz Gabbardo.
Ele acompanha a produção vitivinícola na Campanha desde a sua retomada, e não tem dúvida de que o atual ciclo foi o mais desafiador para os produtores locais. Ainda assim, ele aposta em aumento de qualidade na produção futura: "Hoje o vinho brasileiro tem sido muito desafiado pelos argentinos, por exemplo. Aqui na região temos o produto mais parecido com essa qualidade".
Preocupada com isso, a Salton desenvolveu um estudo próprio, em parceria com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), mapeando o solo e as vulnerabilidades, com indicações técnicas sobre fertilização e manejo para os seus produtores na Campanha. A região é considerada estratégica na meta da vinícola de chegar a R$ 1 bilhão de faturamento em 2030 - quase o dobro dos atuais R$ 567 milhões.
Cenário futuro também é difícil para olivais gaúchos
O cenário futuro também é desafiador para os olivais gaúchos. Depois de registrar a safra recorde de 580,2 mil litros de azeite produzidos no ano passado, com aumento de 29% em relação ao ano anterior, para este ano, a situação é oposta. Com uma combinação de fatores climáticos contrários à cultura, a Secretaria da Agricultura divulgou quebra de 73% em relação ao que era projetado para a produção deste ano, de 67% em relação aos resultados do ano passado. Foram produzidos 193,1 mil litros no Estado este ano, quando a projeção era chegar aos 696,2 mil litros de azeite.
De acordo com o presidente do Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva), Renato Fernandes, a produção já havia reduzido no verão passado, com a seca. Depois, com o inverno que não teve o frio necessário. Em setembro, com as chuvas, "dizimou a chance de uma nova supersafra".
"O momento é de aprendizado em uma produção relativamente nova na região. Estamos formando um grupo de trabalho para organizarmos dados e investirmos em pesquisas, especialmente na busca de variedades de azeitonas mais aptas ao estresse climático gaúcho. A ideia é termos dados como índices de chuva, temperatura e análises de regiões produtoras similares no mundo, para desenvolvermos cultivares resistentes", explica.
Atualmente, há somente dez variedades de azeitonas sendo cultivadas entre 110 municípios no Rio Grande do Sul, com 6,2 mil hectares produtivos. Áreas nas quais, como salienta o presidente da Ibraoliva, as ações de preservação do ambiente natural são constantes como forma de minimizar efeitos das mudanças climáticas e valorizar o produto gaúcho. Nos últimos dez anos, a estimativa é de que o setor investiu R$ 1 bilhão no Rio Grande do Sul para a sua expansão.
A produção de vinho e azeite
A produção de azeite no Rio Grande do Sul em 2024 foi de 193,1 mil litros, representando redução de 73% em relação a 2023.
As regiões da Campanha e Fronteira Oeste produziram, entre os cinco municípios com maior volume de produção na região, 7 milhões de litros de vinhos finos e de mesa, além de mosto de uva, em 2023. Neste ano, a produção de uvas teve quebra de 40% na região.
Maiores áreas de olivais nas regiões
Encruzilhada do Sul
Pinheiro Machado
Canguçu
Caçapava do Sul
Santana do Livramento
Fonte: Secretaria da Agricultura 2023
Maiores produtores de vinhos finos nas regiões
Santana do Livramento
(3º no RS)
Candiota (6º no RS)
Dom Pedrito
Bagé
Santa Margarida do Sul
Fonte: Secretaria da Agricultura 2023
Maiores produtores de uvas nas regiões
Santana do Livramento
Encruzilhada do Sul
Quaraí
Candiota
Pinheiro Machado
Fonte: Secretaria da Agricultura 2024