Na vinícola Miolo, que é considerada a maior exportadora de vinhos do Brasil, e hoje produz também na Campanha Gaúcha e até na Bahia, o desenvolvimento do vinho em Bento Gonçalves, na Serra, é tratado como artigo de alta qualidade, justamente pelo desenvolvimento de variedades mais adaptadas ao terroir local.
"Fica na Serra a nossa matriz, a nossa origem. Temos cinco propriedades no Vale dos Vinhedos, portanto, são todos vinhedos certificados. Produzimos nesta unidade principalmente os espumantes pelo método tradicional, de envelhecimento na garrafa. São espumantes ícones. E, em anos muito bons, produzimos o Lote 43, que é da nossa linha de vinhos lendários, produzidos em safras excepcionais", diz o diretor superintendente da Miolo Wine Group, Adriano Miolo.
Neste ano, por exemplo, não houve produção deste vinho, que é o de maior notoriedade da Miolo no exterior, para onde é destinado em torno de 10% da produção da vinícola. Mas mesmo com o excesso de chuvas no último ciclo, Miolo ressalta que esta não tem sido a tendência. Desde a década de 1990, ele recorda que foram pelo menos 13 safras consideradas excelentes, justamente pelo baixo volume de chuvas. As duas últimas, em 2022 e 2023. O que não significa o cenário perfeito para o vinho do futuro.
As mudanças climáticas – e a tendência de repetição de fenômenos extremos – exigem melhorias no trato dos parreirais, em uma espécie de retorno às origens mais naturais, mas com ferramentas mais modernas. A cobertura permanente do solo abaixo do vinhedo, os cuidados com a criação de patamares em áreas de declive, como é o cultivo das uvas na Serra e, cada vez mais, o desenvolvimento de métodos naturais de cultivo completam o pacote da vitivinicultura de precisão.
"Já estamos usando 30% de todos os produtos de controle de pragas com origem biológica. Temos agido para que o cultivo seja cada vez mais sustentável, como forma de reduzir os efeitos negativos dos extremos do clima. Com a cultura de precisão, conseguimos determinar as áreas boas para o plantio e, por consequência, aumentamos também as áreas de preservação junto aos vinhedos, e isso representa controle da temperatura, de nutrientes e de água no solo. Conseguimos determinar também as exposições adequadas do solo, com cobertura vegetal, para cada variedade de uva plantada, e elas são bem específicas quando falamos de vinhos finos", detalha Adriano Miolo.
Projeto semelhante foi adotado pela Salton, que aponta ter reduzido em 99% o uso de herbicidas nos seus vinhedos.
Pouco mais de 10% das exportações totais de Bento Gonçalves no primeiro semestre deste ano foram em vinhos e no chamado mosto da uva – sumo da uva fresca, ou o primeiro subproduto das uvas antes de dar origem ao vinho –, correspondendo a cerca de US$ 6 milhões comercializados no exterior. O que garante boa parte deste prestígio fora do País é justamente a forma de cultivo e as características únicas na produção da região.
Entre as mais de 40 vinícolas da Associação de Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale), por exemplo, é estimulado o cultivo de uvas em espaldeiras. Esta é a tradição do cultivo na região, que garante, além do melhor manejo, com a melhor qualidade na uva, maior valor agregado ao produto.
O cuidado com a colheita também recebe atenção especial das vinícolas, com o aumento da mecanização deste serviço. Desde a retirada das uvas dos vinhedos até o descarregamento na indústria, o processo, entre as principais vinícolas da Serra, é automatizado. Isso tem gerado menos danos às uvas, já pré-selecionadas desde o plantio.
A atenção com a qualidade do vinho local é reconhecida pelo mercado. No Vale dos Vinhedos está o primeiro reconhecimento oficial de vinhos e espumantes com indicação geográfica e denominação de origem no Brasil. Hoje, a Serra já concentra cinco indicações geográficas de vinhos.
Neste ano, para valorizar o que é produzido no Vale, a Aprovale lançou o 10 Lotes D.O.V.V., o primeiro vinho coletivo com denominação de origem no Brasil.