Produzir bebidas é uma tradição da faixa central do Rio Grande do Sul. E foi este peso histórico que levou um grupo de três empresários de Santa Maria a recuperarem a produção da Cyrilla há quatro anos.
Para quem não sabe, o guaraná produzido na cidade da Região Central foi o primeiro do Brasil, em 1906. Em 2005, porém, a empresa faliu, e três anos depois os empreendedores iniciaram o projeto de retomada, que se concretizou em 2018 para, dois anos depois, reiniciar a produção.
"Compramos o terreno e a marca em leilão, e retomamos do zero, construindo uma nova fábrica, moderna. Hoje, estamos trabalhando na conquista de mercado, primeiro, apostando na faixa que vai de Santa Maria em direção à Fronteira Oeste, mas em breve queremos estar nos mercados da Região Metropolitana e Litoral. A nossa aposta está no tripé de qualidade de fornecedores, produção e entrega. Produto diferenciado e de qualidade, nós temos", diz um dos sócios da Cyrilla, Luiz Antônio Marchezan Bagolin.
Além do guaraná, saem de Santa Maria a Cyrillinha, que é a bebida, também única, produzida a partir do óleo essencial da casca de laranja. Em breve, em busca das oportunidades de crescimento, a empresa que hoje tem 30 funcionários espera ter a licença de operação para a produção de água mineral.
Essa tradição, que agora impulsiona oportunidades na retomada, ganha ainda mais força no Vale do Taquari. A Fruki Bebidas é uma das empresas da região que apontam a oportunidade de crescimento futuro. Depois de abrir o ano produzindo em sua segunda fábrica, em Paverama, além da matriz, em Lajeado, em agosto, a empresa anunciou a antecipação do seu plano de expandir a produção, com aporte de R$ 130 milhões. Cada uma das fábricas receberá uma nova linha de envase.
Em Paverama, a nova linha produzirá os SKUs (rótulos) 500 ml, 2 litros e 3 litros, com um aumento de 14 mil metros quadrados de área construída na nova fábrica. Já em Lajeado, haverá uma nova linha de envase para produtos 5 litros, com capacidade de produção de 5 mil garrafas por hora. A perspectiva é de que as produções ampliadas estejam a pleno no início de 2026.
De acordo com a diretora-presidente da Fruki, Aline Eggers, o investimento é resultado do planejamento de expansão pelos próximos 10 anos, que inclui até mesmo a produção em suas estruturas para terceiros. "O que oferecemos em Paverama, além de uma oportunidade de empregos e de manutenção de recursos na região, com novos negócios, é uma evolução industrial que faz a diferença no mercado. Nesta nova planta, conseguimos gerar uma redução de 30% no consumo de energia por litro de bebida produzida, da mesma forma, há redução de 50% no desperdício de água no processo, além do ciclo fechado no tratamento de efluentes, que retorna como água para uso interno, nos nossos processos. Em relação aos produtos, também evoluímos, por exemplo, com o desenvolvimento de garrafas PET mais leves, que reduzem o consumo de plásticos em 10%", conta a empresária.
Segundo ela, no momento de construir essa planta em Paverama, fatores como vendavais, cheias e novas técnicas construtivas estiveram na pauta. A segurança fez a diferença no momento mais crítico das cheias. Partiam da fábrica da Fruki milhões de litros de água potável, em uma adaptação das suas linhas de produção para aquela situação, em direção às regiões mais atingidas. Uma cadeia de colaboração que também fortaleceu empresas em crescimento no setor.
A partir da cervejaria da Salva Craft Beer, às margens da BR-386, em Bom Retiro do Sul, por exemplo, passaram a ser produzidas cervejas de outras quatro microcervejarias gaúchas, principalmente da Região Metropolitana de Porto Alegre, que haviam sido diretamente impactadas pela cheia.
"Na semana anterior à enchente, estávamos na Copa Sul-Americana de cervejas, fomos premiados e, quando voltamos, de um dia para o outro, tudo alagou. Não fomos atingidos e, com um gerador, conseguimos salvar quase tudo. Então começamos a fazer esse contato com outras cervejarias, porque, no final das contas, todo o setor acabaria prejudicado por uma quebra na produção. Eles traziam o insumo e usavam as nossas instalações. O último lote saiu em setembro", conta o diretor de marketing da Salva, Marcus Outemane.
Não foi a primeira vez que a empresa mobilizou-se diante de uma emergência. No auge da pandemia, as máquinas foram usadas para produzir álcool líquido. Em setembro, a Salva completou oito anos, com capacidade de produção de até 500 mil litros de cerveja por mês em sua planta em Bom Retiro do Sul.
Há dois anos, a empresa foi apontada pela Receita Estadual como a maior microcervejaria do Rio Grande do Sul. Com 80 funcionários, tradicionalmente, metade das vendas da cervejaria é feita no próprio Vale do Taquari. O cenário da calamidade fez a empresa antecipar alguns passos no seu plano de investimentos de crescimento no mercado. Trataram de avançar em direção a Santa Catarina e aumentar a presença em redes de varejo. A cerveja Bairrista, por exemplo, hoje responde por 80% da produção.
"Em agosto, conseguimos empatar novamente os números das vendas. Tínhamos a previsão, neste ano, de crescer, e vínhamos conseguindo mês a mês bons resultados, com a intenção de estreitar a curva entre as vendas de inverno e verão. E aí aconteceu isso. Aqui no Vale, onde temos muita identificação, muitos vendedores perderam tudo. Não tinha o quê nem para quem vender na região. A expansão, que estava nos nossos planos para mais adiante, precisou ser antecipada. Não podíamos parar a produção e comprometer as 80 pessoas que trabalham conosco", explica o diretor.
E não é que, já em setembro, os cervejeiros do Vale do Taquari trouxeram de Florianópolis mais uma coleção de reconhecimentos. Foram seis premiações na Brasil Beer Cup.