Um ataque de Israel contra um acampamento de deslocados internos em Rafah, no sul da Faixa de Gaza, deixou pelo menos 45 mortos no domingo (26), afirmou o Ministério da Saúde do território palestino, controlado pelo Hamas.
O bombardeio, feito no mesmo dia em que o grupo disparou foguetes contra Tel Aviv pela primeira vez em quatro meses, causou indignação na comunidade internacional. Dois dias antes, na última sexta-feira (24), a CIJ (Corte Internacional de Justiça) havia ordenado que Israel interrompesse a ofensiva na cidade, o que não ocorreu.
Questionado, o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, não confirmou o número de mortes e disse que Tel Aviv tem tentado manter os civis de Rafah em segurança por meio de operações de retirada. Admitiu, no entanto, que o ataque pode ter saído do controle.
"Apesar dos nossos esforços para não feri-los [os civis], houve um acidente trágico. Estamos investigando o incidente. Para nós é uma tragédia, para o Hamas é uma estratégia", disse o premiê.
O comentário de Netanyahu enfraquece o argumento prévio do Exército de Israel, segundo o qual o ataque aéreo teria se baseado em "inteligência precisa". A pressão internacional fez a principal promotora militar do país, a major Yifat Tomer Yerushalmi, dizer que o ataque foi "muito grave".
"Os detalhes do incidente ainda estão sob investigação, e estamos comprometidos a conduzi-la da maneira mais completa", disse ela em uma conferência organizada pela Ordem dos Advogados de Israel. "O Exército lamenta qualquer dano a não combatentes durante a guerra."
Os Estados Unidos voltaram a pedir que Israel tome todas as precauções para proteger civis após "imagens devastadoras" do ataque militar em Rafah. "Israel tem o direito de ir atrás do Hamas, e entendemos que este ataque matou dois terroristas seniores do Hamas responsáveis por ataques contra civis israelenses", disse um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional. "Mas, como temos sido claros, Israel deve tomar todas as precauções possíveis para proteger civis."
Em uma sequência de publicações na rede social X, o Crescente Vermelho Palestino, como as sociedades da Cruz Vermelha são denominadas em países de maioria muçulmana, publicou "cenas horríveis de equipes de resgate transportando vítimas" no ataque contra o acampamento.
A organização falou em vários mortos e feridos no bairro de Tel Al-Sultan, embora não tenha especificado o número. "Indivíduos permanecem presos sob as chamas e nas tendas destruídas pelo bombardeio", afirmou a entidade. "É importante notar que este local foi designado pela ocupação israelense como área humanitária, e os cidadãos foram coagidos a se refugiar ali."
Ao amanhecer, o acampamento era uma ruína de metal retorcido e pertences carbonizados sob fumaça. Diversas famílias palestinas correram para hospitais para preparar seus mortos para o enterro - uma cena que já se tornou familiar no território, palco de uma guerra há oito meses.
Sentado ao lado dos corpos de seus parentes, Abed Mohammed Al-Attar disse que Israel mentiu quando disse aos moradores que eles estariam seguros nas áreas ocidentais de Rafah. Seu irmão, sua cunhada e vários outros parentes foram mortos no incêndio.
"O Exército é mentiroso. Não há segurança em Gaza. Não há segurança nem para uma criança, um homem idoso ou uma mulher. Aqui está meu irmão com sua esposa, eles foram martirizados", disse Al-Attar. "O que eles fizeram para merecer isso? Seus filhos estão órfãos."
De acordo com o Hamas, mais de 36 mil palestinos já foram mortos em Gaza desde o início do conflito. Por meses, Rafah foi o último refúgio da guerra para mais de 1 milhão de moradores do território -quase metade da população total. Nas últimas semanas, porém, Israel concretizou as ameaças que fazia de avançar sobre essa cidade na fronteira com o Egito, fazendo com que cerca de 800 mil pessoas fugissem dali, segundo a UNRWA, agência da ONU para refugiados palestinos.
As que foram atingidas neste domingo estavam em uma área designada pelo próprio Estado judeu para deslocados na cidade, o que causou consternação em parte da comunidade internacional. Segundo a facção, 23 dos mortos são crianças, mulheres ou idosos. "Nós vimos corpos carbonizados, casos de amputações, crianças, mulheres e idosos feridos", disse à AFP Mohammad al-Mughayyir, funcionário da agência de Defesa Civil palestina.
De acordo com ele, os trabalhos de emergência enfrentam desafios causados pela destruição da campanha militar de Israel, que deixou partes de Gaza em ruínas, e pelos bloqueios impostos por Tel Aviv. "Há escassez de combustível, e estradas foram destruídas, o que dificulta a circulação de veículos da Defesa Civil nas áreas que são alvos", afirmou. "Também falta água para apagar os incêndios."
O Egito condenou o que chamou de "bombardeio deliberado das forças israelenses contra tendas de deslocados" em Rafah e pediu, em um comunicado, que Tel Aviv "aplique as medidas determinadas pela CIJ em relação ao fim imediato das operações militares" na cidade.
Na última sexta-feira (24), o tribunal determinou que Israel interrompesse imediatamente sua ofensiva terrestre em Rafah em resposta a um pedido da África do Sul -o que não aconteceu. A audiência é parte do processo que começou em dezembro do ano passado, quando o país africano acusou Israel de descumprir a Convenção Internacional contra o Genocídio em sua guerra na Faixa de Gaza.
Capitais europeias, como Madri e Paris, tornaram-se nesta segunda palco de novas manifestações em apoio à causa palestina. Dezenas de milhares de pessoas exibiam cartazes contendo frases como "parem o genocídio" e defendendo a imposição de sanções contra Israel.
Folhapress