{{channel}}
'O povo palestino tem direito à resistência', afirma presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil
O Jornal do Comércio entrevistou o presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal) Ualid Rabah
Mais uma vez, a chamada Terra Santa é cenário de bombardeios, ataques, terrorismo e violência desmedida. O ataque realizado pelo grupo Hamas contra o estado de Israel no dia 7 deste mês causou mais de 1,4 mil mortes entre os israelenses, conforme a Embaixada de Israel. Por outro lado, a reação do governo de Benjamin Netanyahu já vitimou por volta de 4,6 mil palestinos, segundo dados de autoridades palestinas. O conflito atual é mais um - talvez o mais intenso - entre os vários que já envolveram os dois lados em uma disputa que envolve território e religião que parece não ter fim. O Jornal do Comércio entrevistou o presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal) Ualid Rabah. O Rio Grande do Sul tem a maior comunidade palestina brasileira e Rabah alerta para que as autoridades estejam atentas para que o conflito no Oriente Médio não gere reflexos nas comunidades que vivem no Brasil.
• LEIA TAMBÉM: 'Os responsáveis pelas mortes em Gaza são do Hamas', afirma presidente da Federação Israelita do Rio Grande do Sul
Jornal do Comércio - Quem é o Hamas e qual a relação dele no conflito entre Palestina e Israel? Como o Hamas é visto pelos palestinos?
Ualid Rabah - Primeiro de tudo, nós nunca vamos falar de conflito, nós vamos falar de ocupação da Palestina, de imposição do bloqueio, de colonização, de apartheid, de genocídio programado e de um projeto colonial ao povo palestino. Bom, mas o Hamas é como qualquer outra força política e de resistência no seio do povo palestino. O problema é a ocupação, se a ocupação acaba, as razões de existência e forma de luta dessa força também cessam. O povo palestino tem o direito de ter as suas divergências internas, de viver no seu território com compreensões múltiplas e visões múltiplas de mundo, de viver com vontades dispares inclusive em relação às suas visões de mundo, a sua forma de estado, a sua forma de governo, a sua forma de sociedade. Então o Hamas é um integrante do tecido social e político da resistência palestina que representa uma parcela dessa opinião. E ele (Hamas) é muito recente, ele começa a existir de fato a partir de 1988, portanto, no mínimo 41 anos após o início do extermínio do povo palestino, que começou em 18 de dezembro de 1947, quando inicia a limpeza ética promovida pelos estrangeiros portadores de uma ideologia colonial, racista e fascista. Essa é a causa verdadeira.
JC - Como a Autoridade Palestina se posiciona nessa situação?
Rabah - A AP integra o pensamento de que o problema é a ocupação, de que o povo palestino tem direito à resistência e de que as condições para recorrer ao direito de existir são muito claras: a restauração do estado da Palestina e a restauração dos direitos humanos, nacionais e civis do povo palestino. Isso implica o retorno do refugiados, desocupação de territórios ocupados, fim do colonato, fim do regime de apartheid, garantia de segurança à população e cessação dos ataques. E o grande problema para Gaza, na nossa visão, e na visão da Autoridade Palestina, é o bloqueio. A população na faixa de Gaza vive, segundo o relatório recente da ONU, em uma prisão à céu aberto.
JC - Quais os precedentes do conflito? O que estava acontecendo na região de Gaza antes do dia 7 de outubro?
Rabah - Bem, antes do dia 7 de outubro, nós temos uma realidade histórica que começou em 18 de dezembro de 1947 com a limpeza étnica. Os territórios palestinos foram sendo tomados progressivamente. Na faixa de Gaza, 73% da sua população é resultado da limpeza étnica e vive na miséria, sob bloqueio em um cerco desumano, vive num campo de concentração que é ao mesmo tempo um campo de extermínio programado para forçar que os palestinos abandonem essa Palestina.
JC - O conflito histórico entre Israel e Palestina tem várias causas: políticas, territoriais e religiosas. O Ocidente tem uma visão muito dicotômica dessa relação? Ela é mais complexa?
Rabah - Não, ela não é complexa na verdade, o Ocidente simplesmente é responsável por esse projeto. É bom lembrar que quem assumiu esse projeto e o implementou na prática foi o império colonial britânico a partir de 1917, ao assumi-lo formalmente na Declaração Balfour, de 2 de novembro de 1917. Ela promete uma terra que não é sua, a Palestina, que havia sido prometido aos árabes em troca dos esforços de guerra ao lado de ingleses e franceses na derrota do Império Otomano, mas isso foi descumprido. Na declaração, inclusive, é prometida a Palestina exclusivamente para os judeus, o chamado Lar Nacional Judeu, onde inclusive não é citado o povo palestino uma só vez, o que já diz muita coisa. O Ocidente é que sustenta com armas e munições Israel, sem isso nada disso aconteceria na Palestina. Nesse momento quem está de fato travando a guerra contra o povo palestino são os Estados Unidos - os aviões são estadunidenses, a munição estadunidense, os sistemas de satélite. Então, o Ocidente na verdade é o principal responsável pelo genocídio palestino nesse momento.
JC - Do ponto de vista internacional, a situação palestina gera empatia, mas pouca ação real das potências e das Nações Unidas. Como a comunidade internacional pode agir concretamente e onde ela vem falhando?
Rabah - A gente pode falar em comunidade Internacional e em Nações Unidas, mas se não houver vontade política das nações preponderantes, não tem solução. Os Estados Unidos, em especial, não querem solucionar, pelo contrário querem agravar a situação. Eles põem veto a todas as resoluções da ONU no Conselho de Segurança, e é por isso que Israel não está obrigada, na prática, a cumprir nenhuma regra de direito internacional. O Ocidente, especialmente os Estados Unidos - e também a OTAN - impedem isso. Existem centenas de resoluções da ONU para a questão Palestina e todo o direito internacional favorece a Palestina, Israel entretanto não o cumpre. A ONU e ONGs de direitos humanos já possuem relatórios que atestam o apartheid que é imposto por Israel, que dizem que há uma situação de prisão a céu aberto e que parte da população palestina, especialmente que reside em Gaza, vive em situação análoga de campo de concentração. Então, não falta direito internacional, falta a vontade política de resolver.
JC - Como representante da comunidade palestina no Brasil, quais os reflexos do conflito dentro do território brasileiro? Esta relação pode mudar com este conflito?
Rabah - Aqui no Brasil, há uma máquina de propagandas sionista, evidentemente, e ela passa a indústria cultural, a indústria da comunicação e midiática, e ela perpassa também escolas de universidades, por exemplo em livros didáticos. Atualmente, também temos um certo aumento de um protagonismo pseudo-religioso propagando uma versão pro-israelense, pro-sionista, anti-palestina, anti-árabe e que promove a islamofobia no Brasil. Há uma narrativa distorcida dos grandes meios de comunicação no Brasil, de uma propaganda de perseguição sionista, colocando, por exemplo, judeus contra árabes. O judaísmo é credo religioso, no qual há árabes que o professam, e nós não temos problema com o judaísmo, nós não temos que ter problema com pessoa de fé religiosa judaica no Brasil porque não estamos vivendo o apartheid israelense no Brasil, os brasileiros judaicos não estão nos matando. Mas, neste momento, percebemos que todas as entidades sionistas no Brasil se comportam como "guerreiros de Israel" e acreditamos que o Brasil precisa enxergar isso.
JC - E no Rio Grande do Sul, podemos ter algum reflexo nessas relações?
Rabah - Onde está mais concentrada a comunidade brasileiro-palestina é no Rio Grande do Sul, é claro que aqui está o centro das preocupações. E no Rio Grande do Sul também há uma comunidade sionista avassaladoramente fascista - tentaram, por exemplo impedir o jogo do Inter pela Copa Libertadores com o Palestino alegando que a camiseta do time chileno trazia nos números 1 e 11 e o mapa da Palestina inteiro.
JC - Como a Fepal vê o posicionamento brasileiro sobre a atual crise?
Rabah - O governo brasileiro tem buscado uma solução pacífica para Palestina, que é o que nós também buscamos, a Fepal tem essa essa visão. Acreditamos que o governo brasileiro não adotou a melhor forma de expressar o que acontece na Palestina. Começar dizendo que os palestinos são, na locução pelo Hamas, terroristas foi um péssimo início num primeiro momento, mas a esmagadora maioria das comunicações oficiais que dizem respeito ao governo brasileiro buscaram apontar para a solução do problema e buscaram informar que de fato o que impede que haja normalidade e que os ciclos de violência se reproduzam é a negação dos direitos nacionais civis do povo palestino. Então, estamos felizes com isso e esperamos que o Brasil faça mais.
JC - Qual papel o Brasil tem como atual presidente do Conselho de Segurança da ONU?
Rabah - Na posição de presidência rotativa, ele pode chamar uma conferência internacional de paz, pedir proteção ao povo palestino da comunidade internacional, forças de paz que protejam o povo palestino. Essa conferência deve buscar uma solução definitiva para a questão Palestina, com a restauração do Estado palestino, com Jerusalém oriental sua capital, o retorno dos refugiados, o fim da ocupação, da colonização e do regime de apartheid. Esperamos que o Brasil tenha condições de sugerir e buscar consenso para essa agenda.
JC - Como você avalia que está sendo feita a cobertura do conflito?
Rabah - A cobertura do conflito pelos grandes veículos comunicação no Brasil é vergonhosa, é o primeiro genocídio programado televisionado. Os veículos de comunicação estão implicados diretamente no assassinato de cada palestino, estão implicados na desaparição da Palestina programada, estão implicados em crimes de guerra, porque estão promovendo propaganda de guerra, que é crime de guerra definido pela ONU. Nós estamos diante neste momento da mais nefasta cobertura que já existiu.
JC - Como a Autoridade Palestina se posiciona nessa situação?
Rabah - A AP integra o pensamento de que o problema é a ocupação, de que o povo palestino tem direito à resistência e de que as condições para recorrer ao direito de existir são muito claras: a restauração do estado da Palestina e a restauração dos direitos humanos, nacionais e civis do povo palestino. Isso implica o retorno do refugiados, desocupação de territórios ocupados, fim do colonato, fim do regime de apartheid, garantia de segurança à população e cessação dos ataques. E o grande problema para Gaza, na nossa visão, e na visão da Autoridade Palestina, é o bloqueio. A população na faixa de Gaza vive, segundo o relatório recente da ONU, em uma prisão à céu aberto.
JC - Quais os precedentes do conflito? O que estava acontecendo na região de Gaza antes do dia 7 de outubro?
Rabah - Bem, antes do dia 7 de outubro, nós temos uma realidade histórica que começou em 18 de dezembro de 1947 com a limpeza étnica. Os territórios palestinos foram sendo tomados progressivamente. Na faixa de Gaza, 73% da sua população é resultado da limpeza étnica e vive na miséria, sob bloqueio em um cerco desumano, vive num campo de concentração que é ao mesmo tempo um campo de extermínio programado para forçar que os palestinos abandonem essa Palestina.
JC - O conflito histórico entre Israel e Palestina tem várias causas: políticas, territoriais e religiosas. O Ocidente tem uma visão muito dicotômica dessa relação? Ela é mais complexa?
Rabah - Não, ela não é complexa na verdade, o Ocidente simplesmente é responsável por esse projeto. É bom lembrar que quem assumiu esse projeto e o implementou na prática foi o império colonial britânico a partir de 1917, ao assumi-lo formalmente na Declaração Balfour, de 2 de novembro de 1917. Ela promete uma terra que não é sua, a Palestina, que havia sido prometido aos árabes em troca dos esforços de guerra ao lado de ingleses e franceses na derrota do Império Otomano, mas isso foi descumprido. Na declaração, inclusive, é prometida a Palestina exclusivamente para os judeus, o chamado Lar Nacional Judeu, onde inclusive não é citado o povo palestino uma só vez, o que já diz muita coisa. O Ocidente é que sustenta com armas e munições Israel, sem isso nada disso aconteceria na Palestina. Nesse momento quem está de fato travando a guerra contra o povo palestino são os Estados Unidos - os aviões são estadunidenses, a munição estadunidense, os sistemas de satélite. Então, o Ocidente na verdade é o principal responsável pelo genocídio palestino nesse momento.
JC - Do ponto de vista internacional, a situação palestina gera empatia, mas pouca ação real das potências e das Nações Unidas. Como a comunidade internacional pode agir concretamente e onde ela vem falhando?
Rabah - A gente pode falar em comunidade Internacional e em Nações Unidas, mas se não houver vontade política das nações preponderantes, não tem solução. Os Estados Unidos, em especial, não querem solucionar, pelo contrário querem agravar a situação. Eles põem veto a todas as resoluções da ONU no Conselho de Segurança, e é por isso que Israel não está obrigada, na prática, a cumprir nenhuma regra de direito internacional. O Ocidente, especialmente os Estados Unidos - e também a OTAN - impedem isso. Existem centenas de resoluções da ONU para a questão Palestina e todo o direito internacional favorece a Palestina, Israel entretanto não o cumpre. A ONU e ONGs de direitos humanos já possuem relatórios que atestam o apartheid que é imposto por Israel, que dizem que há uma situação de prisão a céu aberto e que parte da população palestina, especialmente que reside em Gaza, vive em situação análoga de campo de concentração. Então, não falta direito internacional, falta a vontade política de resolver.
JC - Como representante da comunidade palestina no Brasil, quais os reflexos do conflito dentro do território brasileiro? Esta relação pode mudar com este conflito?
Rabah - Aqui no Brasil, há uma máquina de propagandas sionista, evidentemente, e ela passa a indústria cultural, a indústria da comunicação e midiática, e ela perpassa também escolas de universidades, por exemplo em livros didáticos. Atualmente, também temos um certo aumento de um protagonismo pseudo-religioso propagando uma versão pro-israelense, pro-sionista, anti-palestina, anti-árabe e que promove a islamofobia no Brasil. Há uma narrativa distorcida dos grandes meios de comunicação no Brasil, de uma propaganda de perseguição sionista, colocando, por exemplo, judeus contra árabes. O judaísmo é credo religioso, no qual há árabes que o professam, e nós não temos problema com o judaísmo, nós não temos que ter problema com pessoa de fé religiosa judaica no Brasil porque não estamos vivendo o apartheid israelense no Brasil, os brasileiros judaicos não estão nos matando. Mas, neste momento, percebemos que todas as entidades sionistas no Brasil se comportam como "guerreiros de Israel" e acreditamos que o Brasil precisa enxergar isso.
JC - E no Rio Grande do Sul, podemos ter algum reflexo nessas relações?
Rabah - Onde está mais concentrada a comunidade brasileiro-palestina é no Rio Grande do Sul, é claro que aqui está o centro das preocupações. E no Rio Grande do Sul também há uma comunidade sionista avassaladoramente fascista - tentaram, por exemplo impedir o jogo do Inter pela Copa Libertadores com o Palestino alegando que a camiseta do time chileno trazia nos números 1 e 11 e o mapa da Palestina inteiro.
JC - Como a Fepal vê o posicionamento brasileiro sobre a atual crise?
Rabah - O governo brasileiro tem buscado uma solução pacífica para Palestina, que é o que nós também buscamos, a Fepal tem essa essa visão. Acreditamos que o governo brasileiro não adotou a melhor forma de expressar o que acontece na Palestina. Começar dizendo que os palestinos são, na locução pelo Hamas, terroristas foi um péssimo início num primeiro momento, mas a esmagadora maioria das comunicações oficiais que dizem respeito ao governo brasileiro buscaram apontar para a solução do problema e buscaram informar que de fato o que impede que haja normalidade e que os ciclos de violência se reproduzam é a negação dos direitos nacionais civis do povo palestino. Então, estamos felizes com isso e esperamos que o Brasil faça mais.
JC - Qual papel o Brasil tem como atual presidente do Conselho de Segurança da ONU?
Rabah - Na posição de presidência rotativa, ele pode chamar uma conferência internacional de paz, pedir proteção ao povo palestino da comunidade internacional, forças de paz que protejam o povo palestino. Essa conferência deve buscar uma solução definitiva para a questão Palestina, com a restauração do Estado palestino, com Jerusalém oriental sua capital, o retorno dos refugiados, o fim da ocupação, da colonização e do regime de apartheid. Esperamos que o Brasil tenha condições de sugerir e buscar consenso para essa agenda.
JC - Como você avalia que está sendo feita a cobertura do conflito?
Rabah - A cobertura do conflito pelos grandes veículos comunicação no Brasil é vergonhosa, é o primeiro genocídio programado televisionado. Os veículos de comunicação estão implicados diretamente no assassinato de cada palestino, estão implicados na desaparição da Palestina programada, estão implicados em crimes de guerra, porque estão promovendo propaganda de guerra, que é crime de guerra definido pela ONU. Nós estamos diante neste momento da mais nefasta cobertura que já existiu.