O formato das eleições dos Estados Unidos comumente causa dúvidas aos brasileiros, tendo em vista que o sistema de governo adotado é diferente daqui. Ainda que ambos os países sejam repúblicas federativas presidencialistas, com presidentes eleito democraticamente, as semelhanças são poucas, a começar pela forma que essas figuras são escolhidas. O pleito, encerrado em 3 de novembro, pode afetar o Brasil e, por isso, surge o interesse de entender como se dá o processo por lá.
Nos EUA, a escolha do presidente acontece pelo Colégio Eleitoral, sistema no qual cada um dos 50 estados ganha um peso de votação baseado no tamanho da sua população. "Antes de tudo, precisamos ter em mente que os EUA, como o nome já diz, é uma República de Estados. Não é a República da América ou a República das Pessoas da América", explicou o fundador e presidente da Capital Communications Group, Inc., Akram Elias, em palestra promovida pela Embaixada e Consulados dos EUA no Brasil para falar sobre o funcionamento do sistema.
Para entender como o colégio eleitoral funciona e qual o papel dos delegados, é importante saber que os EUA tem um governo não centralizado. Ou seja, o poder não está na mão de apenas um grupo de pessoas. A potência conta com um governo federal, 50 governos estaduais e cerca de 89 mil governos locais. De acordo com Elias, os estados delegam autoridade a populações locais em cidades, distritos e municípios, para criar pequenos governos locais.
"O governo federal é responsável somente pelos assuntos que envolvem segurança, moeda e relações exteriores. Todo o resto - saúde, educação, meio ambiente e transporte - é responsabilidade dos governos estaduais", acrescentou o analista. Sendo assim, os EUA contam com 50 constituições, sistemas judiciais, economias, orçamentos e parlamentos diferentes.
Lá, o Congresso é organizado pelos estados e para os estados. É através dele que são definidas leis federais para garantir o mínimo em termos de segurança, economia e direitos humanos, por exemplo. Mas, caso os estados julguem necessário, podem criar leis para aumentar a segurança ou impor normas mais rígidas à economia.
O Congresso é dividido em duas câmaras: o Senado e a Câmara dos Representantes - no Brasil, se aproximaria à Câmara dos Deputados. Cada estado conta com dois senadores que, entre várias outras funções, são responsáveis por nomear membros do gabinete, juízes federais e embaixadores. A Câmara dos Representantes, por sua vez, é o elemento democrático do governo e é responsável por decidir coisas como o impeachment. Ao total, são 435 membros e a representação por estado varia de acordo com o tamanho da população. Michigan, por exemplo, conta com 14, e a Califórnia, com 53.
A partir disso, é possível entender a lógica do colégio eleitoral. Nos EUA, quem escolhe o presidente são os delegados de cada estado. Ao total, são 538 delegados e, para vencer as eleições, o candidato precisa ter o voto de 270. O número de delegados por estado é igual a soma de senadores e membros na Câmara dos Representantes. A Califórnia é o estado como maior número de delegados, totalizando 55.
As eleições são divididas em duas fases. Na primeira, que já começou e será encerrada no dia 3 de novembro, todos os estados e a capital votam para escolher o presidente. Nesse caso, o voto de um cidadão em um candidato não vai diretamente para ele, mas sim para uma chapa de delegados que representa aquele partido. Sendo assim, o voto popular determina quem os delegados vão escolher como presidente, na segunda fase das eleições, em dezembro. "Muitos acham que o voto popular não importa, mas ele é fundamental. É ele que determina quem aquele estado vai escolher", enfatizou Elias.
O analista explicou que o sistema faz sentido porque é balanceado. Ele exemplificou com as eleições de 2016, na qual a Califórnia - estado mais populoso -, historicamente democrata, votou em Hillary Clinton. "Se não tivéssemos esse sistema de colégio eleitoral, o que teria acontecido? Os mais de dois milhões de votos populares do estado iriam silenciar a voz de outros", explicou.
Número de casos de fraude pode variar por conta da pandemia
Ainda que muitos acreditem que o voto impresso dos EUA é pouco confiável, o analista Akram Elias defende a credibilidade do sistema. Lá, cada estado fica responsável por cuidar da fraude dos seus próprios votos e, para isso, possuem leis específicas. Elias explicou, porém, que costuma existir uma parceria entre a sociedade civil e o estado. "Os cidadãos são convidados a assistir as votações. É como se eles fossem os juízes do pleito", acrescentou.
Durante a pandemia, a prática do voto pelo correio foi flexibilizada por alguns estados, que mandam de forma automática as cédulas aos eleitores, e em outros, os votantes devem solicitar. Assim, os cidadãos recebem o documento em casa, preenchem e, em seguida, enviam pelo correio.
Elias afirmou que existe um número de casos de fraude esperado todos os anos, mesmo que pequeno. "É normal. Mas agora, com o voto pelo correio e a pandemia de Covid-19, não sabemos o quanto de fraude esperar. É um território desconhecido", defendeu. Segundo ele, os estados estão convidando os eleitores a assistir a abertura dos envelopes e criando normas para garantir que nenhum cidadão votou em dobro ou fraudou a eleição de alguma outra forma.
"Existem muitos mecanismos para a lidar com a fraude. Mas o quanto eles deverão ser usados e o quanto a fraude vai estressar o sistema, teremos que esperar para ver. Os estados estão dando o melhor para evitar fraudes", finalizou.