A União Europeia adotou, nesta terça-feira (28), um pacote de medidas em resposta à lei de segurança nacional aprovada pela China para o território de Hong Kong.
Entre as ações, o bloco decidiu limitar a exportação de equipamentos e tecnologias que possam ser usados pela China para "repressão interna, interceptação de comunicações ou vigilância cibernética". Além disso, a UE anunciou que não vai iniciar quaisquer novas negociações com Hong Kong.
O bloco afirmou ainda que pretende aperfeiçoar as políticas para imigração e para concessão de vistos aos honcongueses e que vai monitorar atentamente a condução dos julgamentos de ativistas pró-democracia, de oposição a Pequim.
"O objetivo das várias medidas e do pacote como um todo é expressar apoio político à autonomia de Hong Kong sob o princípio 'um país, dois sistemas' e solidariedade ao povo de Hong Kong", diz o comunicado europeu.
Responsável por aprovar a medida, o Conselho de Relações Exteriores do bloco (formado pelos ministros de Relações Exteriores de cada país) disse em comunicado que está preocupado com o conteúdo da nova legislação e com a forma como ela foi adotada.
"No que diz respeito ao conteúdo, a UE está particularmente preocupada com a extensa erosão de direitos e liberdades que deveriam permanecer protegidos até pelo menos 2047."
Colônia britânica até 1997, Hong Kong é uma Região Administrativa Especial na qual há liberdades política e econômica, inexistentes na China continental. O acordo com o Reino Unido que permitiu que o território fosse devolvido para Pequim determina que essas condições só podem ser revistas a partir de 2047.
A aprovação da nova lei de segurança nacional, entretanto, tem sido alvo de críticas por representar uma ameaça contra as liberdades democráticas em Hong Kong.
Sancionada pelo Congresso da China no final de maio, a lei permite a repressão de quatro tipos de crime contra a segurança do Estado: atividades subversivas, secessão, terrorismo e conluio com forças estrangeiras, com sentenças que podem chegar a prisão perpétua.
Nesta quarta-feira (29), a China classificou as decisões do bloco europeu como um conjunto de "movimentos errados" e disse que a UE "não tem o direito de fazer observações irresponsáveis".
"Instamos a UE a respeitar verdadeiramente a posição da China em salvaguardar a segurança nacional em Hong Kong e a parar de se intrometer nos assuntos de Hong Kong e nos assuntos internos da China de qualquer forma", disse, em comunicado, a missão da China na União Europeia.
Segundo o porta-voz, "a grande maioria dos residentes de Hong Kong é de opinião que a lei de segurança nacional contribuirá para a proteção de seus direitos e para a manutenção da prosperidade e estabilidade a longo prazo".
O território, entretanto, tem sido palco de protestos de ativistas pró-democracia. Em resposta às tentativas de Pequim de reforçar o controle sobre a região, houve enormes protestos que se estenderam por meses ao longo de 2019. O regime chinês cedeu em algumas demandas, mas os atos foram agregando novas questões.
As manifestações arrefeceram quando a pandemia de coronavírus começou, mas ganharam novo fôlego após a aprovação da lei de segurança nacional. Além da UE, diversos países questionaram a mudança e adotaram medidas.
Os EUA, que vivem uma Guerra Fria 2.0 com a China, encerraram a política de tratamento econômico especial à ex-colônia britânica e lideram o uso da situação de Hong Kong no discurso contra o país asiático no campo dos direitos humanos.
Também nesta terça, a Nova Zelândia suspendeu o tratado de extradição que mantinha com Hong Kong, sob a alegação de que não pode mais confiar que o sistema de justiça criminal da ex-colônia britânica seja "suficientemente independente" do chinês.
No mesmo dia, a China anunciou o fim dos acordos de extradição com Austrália, Canadá e Reino Unido, países que já haviam suspendido unilateralmente os pactos, também em protesto à nova legislação.
Além das mudanças de exportação, a União Europeia também afirmou estar acompanhando de perto o processo eleitoral em Hong Kong. Marcado para 6 de setembro, o pleito deve determinar os novos membros do Conselho Legislativo, hoje dominados por parlamentares pró-Pequim.
Os democratas, entretanto, precisarão enfrentar um duplo obstáculo para tentar formar maioria no Conselho.
Primeiro, a própria nova lei de segurança nacional proíbe que pessoas que se oponham a ela ou à Lei Básica (espécie de Constituição do território) concorram ou ocupem qualquer cargo público.
Além disso, há ainda a pandemia do coronavírus. O ressurgimento de novos casos da Covid-19 levou Hong Kong a adotar novas restrições a partir desta quarta-feira e pode, de acordo com a imprensa local, adiar as eleições para 2021.
O adiamento do pleito pode ser um duro golpe contra os democratas, devido ao risco de arrefecimento da reação pública às medidas controversas adotadas por Pequim.
"Usar a pandemia como desculpa para adiar a eleição é definitivamente uma mentira", escreveu em uma rede social o ativista pró-democracia Joshua Wong.
Para ele, as mesmas medidas de segurança adotadas durante as primárias podem ser aplicadas nas eleições principais para diminuir o risco de contaminação. "Mas o governo quer interferir nas eleições, que costumavam ser livres e justas", escreveu Wong.
Segundo a Lei Básica de Hong Kong, o governo pode adiar as eleições se o chefe-executivo for de opinião que o voto "provavelmente será obstruído, interrompido, prejudicado ou seriamente afetado por distúrbios ou violência aberta ou por qualquer perigo à saúde ou segurança pública". A atual detentora do cargo, Carrie Lam, é apoiada por Pequim e alvo dos protestos pró-democracia.
A legislação, datada do período colonial, determina que, nesses casos, uma nova data seja estabelecida em no máximo de 14 dias após a original, mas concede ao governo amplos poderes em casos de emergência.