O cheiro de café recém-passado se mistura ao aroma das bancas de especiarias. No vai e vem pelos corredores do Mercado Público, as vozes se cruzam entre pedidos, cumprimentos e conversas casuais. Mas, para além das mercadorias expostas, o lugar carrega histórias de quem faz Porto Alegre acontecer todos os dias. No aniversário de 253 anos da cidade, a reportagem conversou com alguns desses personagens que, há pouco menos de um ano, viam o espaço fechado devido a maior enchente da história do Rio Grande do Sul.
O Mercado Público, tombado como patrimônio histórico e cultural, foi reaberto em 18 de junho de 2024, após 41 dias fechado, um período de limpeza e recuperação dos danos causados pela cheia de maio. Para muitos, sua reabertura simbolizou um passo fundamental na retomada da cidade.
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"A gente sofreu muito com a enchente. Foi um baque ver tudo destruído, o Mercado submerso", relembra o comerciante João Silveira, de 58 anos, que há mais de uma década vende temperos em uma das bancas. "Agora é gratificante ver o movimento todo de volta, o fluxo retornando à normalidade. Aqui é um coração pulsante de Porto Alegre".
A movimentação intensa pelos corredores reflete a conexão dos porto-alegrenses com o espaço. A estudante Mariana Acosta, 23 anos, voltou a frequentar o Mercado no inicio deste ano e diz que sente ali um pedaço da identidade da cidade. "Desde pequena venho aqui com meus avós comprar peixe e frutas. Mas, há uns anos me mudei para longe do Centro e, por consequência, parei de vir. É bom voltar. É um lugar que une gerações", conta.
Apesar de estar localizado no Centro Histórico, o Mercado Público possui como característica mais marcante a reunião de moradores de toda a cidade e até mesmo da Região Metropolitana. E cada um tem um lugar especial quando pensa em Porto Alegre.
Moradora da Lomba do Pinheiro, Zona Leste da Capital, a técnica de enfermagem Ana Paula Nascimento, 37 anos, classifica a Orla do Guaíba como a melhor representação do que é o município. "Acho que não tem outro lugar que marque tanto a cidade como a Orla. Desde os bares e as bicicletas até as pessoas só sentadas vendo o pôr do sol. É Porto Alegre sendo Porto Alegre", reflete.
O professor Ricardo Almeida, também de 37 anos, residente do bairro Independência, vê no Jardim Botânico um refúgio dentro da cidade. "Eu adoro lá. É tranquilo, cheio de verde, dá para esquecer um pouco a correria, mexer com as tartarugas. Acho que Porto Alegre precisava cuidar mais desses espaços. O pessoal fala muito da Orla, das áreas centrais, mas a cidade tem outros cantinhos especiais", diz.
A aposentada Lúcia Fernandes, 67 anos, do Bom Fim, sorri ao falar do Brique da Redenção. "O passeio de domingo, as banquinhas, os músicos tocando. A Redenção tem uma energia que é só dela. Mesmo com tudo que mudou na cidade nos últimos anos, aquele espaço continua sendo um ponto de encontro", ri, contando se reunir com as amigas ali aos finais de semana.
No fundo, porém, se há algo que une e constrói Porto Alegre, de Norte a Sul, é quem a habita. O motorista de aplicativo Cláudio Mendes, 48 anos, diz que gosta de rodar com o veículo por todas as regiões e resume esse sentimento. "Porto Alegre é cheia de defeitos, como qualquer cidade grande, porém é aquilo: a gente reclama, mas ama. E sempre dá um jeito de seguir em frente", relata durante uma breve parada no Mercado para almoçar.