Celebrado em 25 de dezembro, o Natal é uma festa historicamente marcada pelo nascimento de Jesus nas religiões cristãs, figura que é vista de diferentes formas a depender da religião. Seja sob o nome hebraico Yeshua, na religião muçulmana como Issa, ou ainda sincretizadas como Oxalá, a figura de Jesus pode ter diferentes representações, mesmo que, por vezes, fora de ritos.
Um levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010 (última amostra disponível da pesquisa) mostra que o Rio Grande do Sul é um estado de grande diversidade religiosa.
De acordo com os dados do IBGE, o RS conta com maior predominância de autodeclarados praticantes de Umbanda e Candomblé no Brasil. Também é predominante em outras declarações de religiosidades afrobrasileiras, que podem englobar a Nação de Batuque, tradição de matriz africana amalgamada no RS dedicada aos Orixás.
O Rio Grande do Sul também tem forte parcela de praticantes de religiões judaico-cristãs, sendo o terceiro estado com maior presença de praticantes de judaísmo, e quarto maior no número de pessoas que seguem a doutrina espírita. Ainda sim, é majoritariamente católico, com 70% da população adepta ao catolicismo.
Por outro lado, o território gaúcho é o quarto com maior número de denúncias ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania relacionadas à violação de direitos de liberdade à religião ou crença. Foram formalizadas 151 ocorrências em 2024 até o dia 22 de dezembro.
Jesus no Cristianismo
O Cristianismo, que abarca diversas religiões com presença majoritária no RS, como protestantismo e catolicismo, vê a figura de forma ancorada na Bíblia. Segundo a crença, Jesus foi um profeta nascido na Palestina, filho de Deus. Fez o sacrífico de morrer para expiar os pecados da humanidade.
A figura, considerada fundação das religiões cristãs, deixou escritos apenas de forma póstuma, por meio de seus seguidores. Tais considerações foram aprimoradas e se transformaram nas religiões que conhecemos atualmente.
Sincretização em Oxalá
Segundo o Babalorixá do culto de Nação de Batuque e também Pai de Santo de Umbanda, Baba Diba de Iyemonja, a sincretização é uma antiga estratégia de defesa, adotada por pessoas que viviam tradições de matriz africana, que associaram os orixás aos santos católicos para não serem perseguidos e mortos pela Igreja. Historicamente, o processo ocorreu durante a diáspora forçada de povos escravizados, de diversas nações, trazidas ao País durante o período do Brasil Colônia e Império.
Há, por exemplo, a relação do orixá Ogum como São Jorge, Iansã como Santa Bárbara, Xangô como São Miguel Arcanjo ou São Jerônimo, Iemanjá como Nossa Senhora dos Navegantes e Oxalá como Jesus.
Na linha da Umbanda seguida por Babalorixá há a ancoragem na teologia cristã. Sempre antes de abrir algum trabalho espiritual, por exemplo, se realiza uma prece, citando Jesus como Oxalá. “É uma tradição essencialmente africana, mas nela nós visitamos a história e reconhecemos o papel dele como grande humanista", explica.
Ele esclarece que o Sincretismo pode ou não estar presente em certas casas do Batuque. Em casas antigas ainda há Oxalá, relacionado a figura de Jesus. “De alguns anos para cá, houve esse rompimento com o sincretismo, essa influência mais cristã e católica, que sempre foi uma tentativa de embranquecimento das religiões de matriz africana”, afirma.
Espiritismo
O Espiritismo vê a figura do profeta bíblico de uma forma muito mais aproximada ao ser humano. A doutrina se baseia no estudo do espírito e em uma filosofia própria, com a presença de pluralidade de existências e reencarnações, todas buscando um auto aperfeiçoamento. E Jesus seria o norte moral da religião.
A professora de Doutrina Espírita Camila Quintana explica que a figura bíblica existe como um espírito mais evoluído que passou pela terra, local dedicado a provas e expiações.
Segundo Camila, na crença espírita, o papel de Jesus é como uma mostra do que se deve buscar ao longo de todas as reencarnações. “Isso nos bota em uma mesma condição, de luta, de esforço, de melhoria. Na igreja católica não temos isso, ele era um santo, é filho de Deus e nunca iríamos nos igualar a ele”.
Islamismo
No Islamismo, há a concepção da figura de Jesus como Issa, nome em árabe. Ele, porém, não é filho de Deus, chamado no islamismo como Allah, que não seria nem homem, nem pessoa. A religião acredita que o profeta não morreu na cruz. "Antes dele ser crucificado e morto, Deus elevou ele aos céus e colocou outra pessoa em seu lugar", descreve o Sheik da mesquita islâmica de Porto Alegre, Mahmoud Ibrahim. Por isso, acredita-se que ele está vivo.
Também difere do Cristianismo a crença de que a sua morte não resultou em expiação dos pecados da humanidade. Isso porque um indivíduo não pode carregar os pecados de outros.
Não existe, porém, qualquer adoração a sua figura ou imagem, já que na fé islâmica, segundo o líder religioso, se adora apenas Allah, e não se comemora comemorado o Natal. "Temos duas festividades durante o ano: o fim do mês do Ramadã e o fim da peregrinação em Meca", explica. Sendo a data do dia 25 de dezembro, apenas um dia comum.
Judaísmo
No Judaísmo, Jesus aparece como Yoshua, seu nome em hebraico, segundo explica o Rabino Marcos Perelmutter, da Sinagoga Centro Israelita Porto-alegrense. Os cultos judaicos acreditam que o cristianismo como conhecemos é um desprendimento dessa religião. A figura, pontua o rabino, nasceu, viveu e morreu como judeu, seguindo esses costumes.
“Foi uma pessoa nascida do povo judeu que teve um olhar diferente da sua própria religião e a sua prática e suas lições mudaram um pouco, e ele alterou visões e práticas”, explica. Isso foi levado adiante pelos apóstolos, dando início ao Cristianismo e se distanciando do Judaísmo. Os ritos e práticas da religião não envolvem sua figura.
Mesmo assim, ressalta o rabino, “foram os discípulos que elaboraram muito mais. Não foi ele que viveu e morreu dizendo ‘vamos criar uma nova religião’. Foi correndo o tempo e com diversas interpretações dos primeiros cristãos.”
Budismo
A professora de Budismo Tibetano, ou Vajrayana, Lama Sherab explica que o caminho dessa doutrina, de um modo geral, tem como propósito alcançar o estado iluminado de ser. "Estado que você está completamente livre de qualquer tipo de experiência que te traga algum nível de sofrimento", diz. No Budismo, acredita-se que a figura cristã atingiu esse patamar.
O sofrimento, nessa concepção, existe no sentido de medo, ansiedade, insegurança, tristeza ou dúvidas. O budismo considera que uma pessoa tem múltiplas vidas, e esse processo de desprendimento acontece ao longo de várias delas. Também pode ser definida como um estado ou realização de onisciência e completa sabedoria.
A professora descreve que, historicamente, o Budismo não conhece a figura de Jesus. Mesmo assim, explica que, quando se lê as características da vida dele e de seus seguidores, há a visão de que ele seja um Bodhisattva, um ser nobre ou com qualidades especiais que, ao longo do caminho, adquiriu esse nível de iluminação. "Já saiu do ciclo de existência comum, em que nós estamos, é alguém que já conseguiu eliminar qualquer causa para experiência de sofrimento. Até mesmo sofrimentos naturais, como nascimento, morte e velhice."