O Rio Grande do Sul conviveu em maio com as enchentes que devastaram parte do Estado. Entre agosto e setembro, foi a vez da fumaça das queimadas que cobrir o céu gaúcho. A Fundação Estadual de Meio Ambiente (Fepam), responsável, entre outras funções, pela fiscalização e monitoramento ambiental e controle de concessão de licenças, atuou em ambos os períodos.
Em entrevista ao jornal do Comércio, o diretor-presidente do órgão, Renato das Chagas e Silva, aponta que entre as medidas do órgão para mitigação dos danos das cheias estão principalmente o modelo exclusivo de Licença Única para empresas que queiram sair da mancha de inundação. Já no que diz respeito à qualidade do ar, o gestor público destaca ações para reforçar o monitoramento da qualidade do ar no RS. O objetivo do órgão é focar em contratação de serviços e não estações, visando evitar descontinuidade de peças e dependência de fornecedores.
Confira abaixo a entrevista:
Jornal do Comércio - A questão da qualidade do ar esteve muito presente na vida dos gaúchos recentemente. Com Porto Alegre chegando a registrar a quinta pior qualidade do ar entre as capitais, segundo a IQar que é uma plataforma da Suíça. Quais as políticas públicas da Fepam em relação a isso?
Silva - Cumprimos a legislação nacional, número 506 do Conama, de julho deste ano. No final do ano passado, iniciamos a confecção de termos de referência para contratar um aumento das estações de monitoramento da qualidade do ar que temos no estado. Temos previstas mais três estações, para cobrir toda a região. Uma será para Porto Alegre, uma para Santa Maria e uma para Caxias do Sul. Devido a um evento que não pegou o Estado, mas que fomos atingidos, que são as queimadas, buscamos agilizar, e estamos contratando por seis meses uma estação de qualidade do ar para colocar aqui em Porto Alegre. Temos que trabalhar com licitação, não é uma entidade privada que tira o dinheiro do bolso e compra. Pela tomada de preços que tivemos, é provável que o vencedor (da licitação) coloque em outubro, início de novembro (os equipamentos). Então, digamos, no próximo mês já vamos ter mais uma estação dentro de Porto Alegre. As outras cinco do RS cobrem a Região Metropolitana, que é a mais pressionada que diz respeito à qualidade do ar, inclusive Porto Alegre.
JC - No momento, temos as estações na Região Metropolitana, em Canoas, Esteio, Gravataí, Guaíba e Triunfo. Isso não causa um vazio de dados para o Interior em questão de qualidade do ar?
Silva - Não. O ar, onde não tem nenhuma pressão antrópica, como uma rodovia, uma grande cidade, uma grande indústria, uma grande mineração, ele tem boa qualidade. Se eu não tiver uma pressão antrópica, eu não preciso ter uma estação operando 24 horas. Preciso ter onde eu tenho a pressão, onde eu tenho mais gente morando. Então, por isso que essas três foram escolhidas estrategicamente. Uma para cobrir Porto Alegre, que não tinha uma dentro da própria capital, e as outras duas nas outras grandes cidades e que também tem fluxo de rodovias do Estado. Depois, o 'crescer mais', ou não, a gente vai avaliando. Também estamos abrindo um outro processo agora. Vamos contratar o serviço de uma estação móvel. Ela é exatamente igual às fixas, só que essa a FEPAM vai poder definir onde fica.
JC - E qual é a previsão de estar em funcionamento essa outra estação móvel?
Silva - As estações fixas para contratação permanente já estão com processo correndo. A móvel é um novo projeto, e ainda não abrimos para a tomada de preço. Pretendemos estar em torno de 60 dias com a tomada de preço. Vamos buscar a verba no Fundo Estadual de Meio Ambiente que é feito para esse tipo de processo. Eu diria que teremos essa estação no ano que vem.
JC - O Estado já contou com dezessete equipamentos de monitoramento do ar. Porque a maioria foi descontinuada?
Silva - São diversos motivos. Acho que não chegou nunca há dezessete. Algumas foram descontinuadas porque viram que elas tinham de ser relocalizadas. Mas essas estações foram compradas com uma tecnologia francesa, na época, e essa tecnologia foi descontinuada, uma vez que o fabricante oferecia peças de reposição, e não tenho como colocar outras porque não consigo. Como a Fepam conseguiu não deixar de ter totalmente? Essas estações que nós temos atualmente são contrapartidas de licenciamentos ambientais. Quem adquiriu elas posteriormente a esta data foram as empresas, que são as responsáveis, e elas são interligadas com a rede Ar do Sul. Os profissionais da Fepam acompanham, mas o Estado não é quem arca com o ônus.
JC - Essas novas três estações de monitoramento vão ser do Estado?
Silva - O Estado vai pagar. Mas essa dificuldade que coloquei fez surgir uma alternativa que antes não existia. Hoje eu posso comprar o serviço de monitoramento, e não a estação, que me deixa amarrado na tecnologia ou no fornecedor que pode descontinuar. Eu contrato o monitoramento e o resultado, e digo que devem seguir os métodos americanos da EPA (U.S. Environmental Protection Agency). Como é um serviço pago, eu garanto que não tem descontinuidade e que não tenho a questão de tecnologia.
JC - E existe algum plano de ampliar o monitoramento atual além dessas três, para ter uma cobertura similar à antigamente?
Silva - Essa cobertura não é inferior à que teve. Essas três estações fixas, mais a móvel, resultarão em uma boa cobertura no Estado, e estamos também avaliando outras áreas onde seja possível colocar. Eu posso te dizer: hoje o Estado do Rio Grande do Sul está servido.
JC - O período das enchentes, ocorridas em maio, chegou a causar um atraso significativo nas demandas, que vai precisar ser recuperado agora?
Silva - Óbvio que ele causou um atraso, mas esse atraso nós praticamente buscamos. Fomos impactados a nível de licenciamento e fiscalização, que também se voltou, em um primeiro momento, à ajuda humanitária. Por exemplo, a nossa embarcação que é para coleta de água nos recursos hídricos ou de efluentes nas atividades industriais foi utilizada para salvamento. Nossos veículos também saíam com nossos profissionais onde a água ia baixando para orientações técnicas, de modo a reduzir o impacto. Em um terceiro momento, agora, nós voltamos ao nosso trabalho de rotina em todas as áreas. Também continuamos com ações vinculadas ao evento: criamos, através de uma Portaria, uma licença ambiental única. O licenciamento ambiental se divide em três etapas: licença prévia, licença de instalação e licença de operação. Nós criamos uma licença única para aquela atividade que quiser realocar a sua atividade para fora da mancha (de inundação). O prazo de validade é o mesmo, que é regrado pelo Conselho Estadual, cinco anos. Mas são cinco anos para construir a nova, e depois volta à normalidade pedindo outra licença de operação quando vencer.
JC - No processo de licenciamento, dependendo do porte industrial ou dos riscos, a empresa tem, ou não, a necessidade de diferentes estudos. Quando ela faz essa realocação, essa necessidade continua a mesma, ou é um processo facilitado?
Silva - Os estudos são os mesmos. Uma planta química que trabalha com produtos inflamáveis vai precisar fazer uma análise de risco. Ela faria uma análise de risco mesmo se tivesse se mudando porque é uma opção dela. Ela não foi inundada, mas quer crescer e está indo para uma outra cidade. Nós não mudamos as exigências técnicas e as avaliações ambientais que a Fepam faz. Nós apenas reunimos 3 etapas de licenciamento em uma única.