Há mais de 60 dias sem operar em Porto Alegre em função das enchentes, o Trensurb é o principal transporte coletivo para quem precisa se locomover entre as cidades de Novo Hamburgo, São Leopoldo, Sapucaia do Sul, Esteio, Canoas e Porto Alegre. Em condições normais, a viagem entre a estação Novo Hamburgo e a estação Mercado levam cerca de uma hora. Em dias úteis, antes da enchente, mais de 110 mil pessoas utilizavam a linha de trem por dia.
Na última quarta-feira (10), uma equipe do Jornal do Comércio fez deslocamento entre Novo Hamburgo e o Centro Histórico de Porto Alegre para averiguar em que condições essas mais de 100 mil pessoas estão chegando à Capital.
Na última quarta-feira (10), uma equipe do Jornal do Comércio fez deslocamento entre Novo Hamburgo e o Centro Histórico de Porto Alegre para averiguar em que condições essas mais de 100 mil pessoas estão chegando à Capital.
As estações da Trensurb estão operando entre 5h e 22h todos os dias, com trens partindo em intervalos de 18 minutos. A linha, no entanto, está circulando apenas entre as estações Novo Hamburgo e Canoas. A equipe do JC chegou à estação as 9h30min e embarcou no trem que saiu da cidade às 9h35min. O trajeto total é de 43 km até a estação no centro de Porto Alegre.
No embarque, há diversas placas sinalizando que, a partir do próximo sábado (13), a passagem de R$ 4,50 voltará a ser cobrada, dando fim à operação nomeada de trilhos humanitários. Embora esteja operando até a estação Canoas, a equipe do JC desembarcou na estação Mathis Velho, onde está sendo realizado o embarque nos ônibus da empresa de transporte metropolitano Transcal, responsável pela execução do transporte entre Canoas e Porto Alegre. O embarque em Canoas ocorreu exatamente 40 minutos após o embarque em Novo Hamburgo.
A necessidade de baldeação para chegar à Capital trouxe diversos transtornos. O primeiro deles foi encontrado na hora de embarcar no coletivo da Transcal: a passagem de R$ 6,85 só pode ser paga em dinheiro ou no cartão TEU, diferentemente dos trens, em que o pagamento pode ser realizado nos cartões TRI, TEU, SIM, em dinheiro e até mesmo por pix nas estações. A diferença de R$ 2,35 por trecho e aumento de tempo foi um empecilho que quase levou Leonardo Blankenhain, morador de Novo Hamburgo e estudante de Biomedicina na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), a atrasar sua formatura, prevista para dezembro deste ano.
Estação Mercado Público ficou inundada na enchente
TÂNIA MEINERZ/JC
Utilizando o transporte diariamente, Leonardo conta que levava cerca de 50 minutos entre as estações Novo Hamburgo e Rodoviária. O estudante de 25 anos estava realizando seu estágio obrigatório na Santa Casa de Misericórdia, no centro da Capital, quando o Rio Grande do Sul foi assolado pelas enchentes. Ficando impossibilitado de chegar à Capital durante 45 dias, o retorno ao estágio quase foi impedido pelo tempo de deslocamento. “Com o trem, chegava ao centro em 50 minutos e caminhava mais 10 até o hospital. Agora tendo que descer em Canoas e pegar ônibus, o dia que menos demorou levou mais de duas horas para chegar”, relata.
Para conseguir concluir o estágio e continuar comparecendo às reuniões de orientação para a conclusão do bacharelado, Leonardo recorreu à uma colega que mora em Porto Alegre e cedeu um quarto em sua casa para que o estudante pudesse dormir próximo da UFCSPA durante os dias úteis. “Só estou voltando para casa às sextas-feiras ou nos sábados pela manhã, pois as opções, para mim são as duas horas no transporte público ou o transporte por aplicativo, que também ficou com um preço inacessível para mim”, conta. Prestes a iniciar o segundo estágio obrigatório exigido para se formar, Leonardo pretende seguir na casa da colega de curso até sua formatura, já que a previsão da Trensurb é que a estação Mercado volte a operar somente em 24 de dezembro.
Durante o trecho do deslocamento de ônibus realizado pela equipe do JC, diversos usuários relataram situações como ônibus lotados e viagens exaustivas, passando das três horas entre o bairro Mathias Velho, em Canoas, e o Centro Histórico de Porto Alegre durante os horários de pico.
O aumento no tempo de deslocamento e a necessidade de baldeação também criaram uma barreira para Mellissa Pires, estudante de Direito que reside em Porto Alegre e é membro da comunidade da Igreja Católica da Comunidade de Louvor e Adoração Emanuel, em Novo Hamburgo. A estudante de 21 anos se deslocava até a cidade a cada 15 dias, embarcando na estação Mercado e desembarcando na estação Novo Hamburgo. Desde maio, Mellissa foi à cidade da região do Vale dos Sinos apenas duas vezes, sendo uma delas para levar doações para membros da comunidade atingidos pela enchente.
Trabalho de limpeza incluiu diversos trabalhadores
TÂNIA MEINERZ/JC
Por conhecer pouco da Região Metropolitana e pela distância do embarque dos ônibus em Porto Alegre, Mellissa optou por realizar as duas viagens até Novo Hamburgo utilizando transporte por aplicativo e dividindo o valor com uma amiga, também membro da comunidade. “Meu gasto está sendo bem maior, então estou dividindo com uma amiga. Não criamos coragem para ir até Canoas e pegar o trem lá, pois não conhecemos a cidade”, conta. Utilizando transporte por aplicativo, as corridas custam em média R$ 60,00, mas Mellissa relata que chegou a pagar mais de R$ 100,00 em uma corrida somente para ir até a Capela da comunidade.
Com as doações entregues, a estudante decidiu que só irá para Novo Hamburgo em grupo, para poder dividir o valor da tarifa do transporte por aplicativo, ou quando o trem retornar à alguma estação de Porto Alegre. De acordo com as projeções da Trensurb, a estação Farrapos deve voltar a operar em 20 de setembro.
Quando a equipe do JC embarcou no ônibus em Canoas, foi informado que o ponto final para desembarque seria no viaduto abaixo do Túnel da Conceição, na esquina da avenida Farrapos com a avenida Voluntários da Pátria. Essa informação, no entanto, não se concretizou, uma vez que o desembarque foi realizado às 11h25min, já na avenida Voluntários da Pátria, próximo do terminal de embarque de outra empresa de transporte metropolitano.
Longe da estação Rodoviária e da estação Mercado, a reportagem do JC fez o deslocamento até o Mercado Público de Porto Alegre a pé, em cerca de 10 minutos. Para voltar à redação do Jornal do Comércio, localizada na avenida João Pessoa, nº 1.282, seria necessário utilizar a linha de ônibus municipal 353 - Ipiranga / PUC / UFRGS. O embarque no ônibus poderia ser realizado, antes da enchente, próximo da rodoviária, na avenida Júlio de Castilhos, o que agora é inviabilizado em função do corredor humanitário que elevou a pista de acesso ao Túnel da Conceição, levando diversas linhas municipais a realizarem o acesso à avenida Loureiro da Silva pela avenida Mauá.
Duas horas após o embarque em Novo Hamburgo, a equipe de reportagem chegou à entrada da estação Mercado às 11h35min. No caminho inverso, moradores da Região Metropolitana e do Vale dos Sinos relatam uma dificuldade ainda maior, alegando que para retornar de Porto Alegre a disponibilidade de ônibus é menor no sentido Capital-Interior.
O que diz a Trensurb
De acordo com o planejamento divulgado pela Trensurb na última segunda-feira (8), a ampliação da operação até Porto Alegre está prevista para 20 de setembro, com o retorno do transporte até a estação Farrapos, na Zona Norte da Capital. Para a estação Mercado, a projeção é que a operação seja retomada em 24 de dezembro, ainda este ano. Ainda em julho, a cobrança da tarifa de R$ 4,50 deve ser retomada no próximo sábado (13). A empresa ainda não informou como será feito o pagamento da integração para quem não possui o cartão TEU.