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Publicada em 14 de Junho de 2024 às 12:35

Criminalista afirma que projeto que equipara aborto a homicídio é uma "demasia"

Manifestação de protesto contra o PL 1904/24, que equipara aborto a homicídio, com pena de até 20 anos, reuniu mulheres na Cinelândia, no Rio de Janeiro

Manifestação de protesto contra o PL 1904/24, que equipara aborto a homicídio, com pena de até 20 anos, reuniu mulheres na Cinelândia, no Rio de Janeiro

Fernando Frazão/Agência Brasil/Divulgação/JC
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Cláudio Isaías
Cláudio Isaías Repórter
"É uma demasia uma pena de seis a 20 anos para uma mulher que fizer o aborto resultante de estupro. É muito grande para o delito que se propõe", avalia o advogado criminalista Lissandro Sampaio, sócio da Sampaio Advogados e Especialista em Direito Penal pela Universidade de Coimbra, em Portugal, ao analisar o projeto de lei 1904/2024 que prevê que o aborto realizado acima de 22 semanas de gestação, em qualquer situação, passará a ser considerado homicídio, inclusive no caso de gravidez resultante de estupro. A pena será de seis a 20 anos para mulher que fizer o procedimento.
"É uma demasia uma pena de seis a 20 anos para uma mulher que fizer o aborto resultante de estupro. É muito grande para o delito que se propõe", avalia o advogado criminalista Lissandro Sampaio, sócio da Sampaio Advogados e Especialista em Direito Penal pela Universidade de Coimbra, em Portugal, ao analisar o projeto de lei 1904/2024 que prevê que o aborto realizado acima de 22 semanas de gestação, em qualquer situação, passará a ser considerado homicídio, inclusive no caso de gravidez resultante de estupro. A pena será de seis a 20 anos para mulher que fizer o procedimento.
Segundo Sampaio, os legisladores costumam exacerbar as penas por vezes com o objetivo de trazer a sociedade para o seu lado. "Os partidos de esquerda têm o interesse em descriminalizar o tema. Porém, os deputados de direita tem a intenção de aumentar essas penas por entender que apenas a pena de um a três anos não leva ninguém a prisão", explica. Porém, de acordo com advogado criminalista, é preciso entender que estamos falando de uma mulher - um ser humano que merece todo o cuidado e respeito.
O advogado criminalista disse que o PL 1.904/2024 vai para o plenário da Câmara dos Deputados e para o Senado - onde uma mulher será a relatora e deverá haver um cuidado para avaliar a questão. "Acredito que vão colocar as coisas no seu devido lugar. A pena de seis a 20 anos é um exagero", destaca. Para Sampaio, o Senado brasileiro vai ter o cuidado de constituir uma comissão para realizar a avaliação com cuidado tanto pelo lado jurídico quanto pela medicina para apurar os fatos com conhecimento.
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) afirma que projeto de lei é um retrocesso aos direitos de criança e adolescentes
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) afirma que projeto de lei é um retrocesso aos direitos de criança e adolescentes Fernando Frazão/Agência Brasil/JC
Na quarta-feira (12), a Câmara dos Deputados aprovou a urgência de um projeto legislativo que altera o Código Penal e equipara a pena de aborto em fetos com mais de 22 semanas à aplicada ao crime de homicídio simples. Com isso, a pena partiria do mínimo de seis e chegaria ao máximo de 20 anos de reclusão.
O deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), autor do projeto e membro da bancada evangélica, espera que o texto seja analisado diretamente no plenário da Câmara em até duas semanas. A proposta prevê a pena de homicídio simples para as hipóteses de aborto em fetos com mais de 22 semanas, desde que a gestante provoque o aborto em si mesma ou consinta que outra pessoa lhe provoque, caso em que que a pena passa de prisão de 1 a 3 anos para 6 a 20 anos.
Entre o dia 1º de janeiro até 13 de maio deste ano, foram feitas 7.887 denúncias de estupro de vulnerável ao serviço Disque Direitos Humanos (Disque 100). A média de denúncias nos primeiros 134 dias do ano foi de cerca de 60 casos por dia ou de dois registros por hora. O projeto de lei, assinado por 32 deputados federais, equipara aborto a homicídio e prevê que meninas e mulheres que vierem a fazer o procedimento após 22 semanas de gestação, inclusive quando vítimas de estupro, terão penas de seis a 20 anos de reclusão - punição maior do que a prevista para quem comete crime de estupro de vulnerável (de oito a 15 anos de reclusão. 
De acordo com o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), o projeto de lei é inconstitucional, viola o Estatuto da Criança e do Adolescente e contraria normas internacionais que o Brasil é signatário. Em nota, a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, lembra que as principais vítimas de estupro no Brasil são meninas menores de 14 anos, abusadas por seus familiares, como pais, avôs e tios.
"São essas meninas que mais precisam do serviço do aborto legal, e as que menos têm acesso a esse direito garantido desde 1940 pela legislação brasileira." Em média, 38 meninas de até 14 anos se tornam mães a cada dia no Brasil. Em 2022, último período disponível nos relatórios do Sistema Único de Saúde (SUS), foram mais de 14 mil gestações entre meninas com idade até 14 anos.
Em média, 38 meninas de até 14 anos se tornam mães a cada dia, segundo levantamento do Sistema Único de Saúde (SUS)
Em média, 38 meninas de até 14 anos se tornam mães a cada dia, segundo levantamento do Sistema Único de Saúde (SUS) Fernando Frazão/Agência Brasil
O Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), contabiliza que 56,8% das vítimas de estupro (adultos e vulneráveis) em 2022 eram pretas ou pardas; 42,3% das vítimas eram brancas; 0,5% indígenas; e 0,4% amarelas. A advogada Juliana Ribeiro Brandão, pesquisadora sênior do FBSP destaca o recorte racial e social do projeto de lei e pondera que quem tem possibilidade de custear os procedimentos para aborto seguro, no exterior ou mesmo clandestino no Brasil, “não vai mudar nada”.

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