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Publicada em 22 de Março de 2024 às 18:26

'A principal causa de insegurança é a falta de oportunidade', diz ex-prefeito de Palmira, na Colômbia

Ex-prefeito de Palmira, Oscar Escobar, falou sobre redução da violência na cidade

Ex-prefeito de Palmira, Oscar Escobar, falou sobre redução da violência na cidade

Michel Corvello/ Prefeitura de Pelotas/ Divulgação/ JC
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Bárbara Lima
Bárbara Lima Repórter
O ex-prefeito de Palmira, Oscar Escobar, esteve em Pelotas, no Sul do Estado, no mês passado, para o evento sobre segurança pública Connex 2024. Durante o evento, ele apresentou os principais dados relacionados à redução da violência na cidade sob sua gestão entre 2020 e 2023. Em 2022, segundo ele, Palmira teve a taxa mais baixa de homicídio em 17 anos, com 30,6 mortes para 100 mil habitantes. Em entrevista ao Jornal do Comércio, Escobar afirmou que o principal projeto contra violência desenvolvido na cidade, Pazos (Paz y Oportunidades para Palmira), foi desenhado a partir da premissa que a principal causa de insegurança é a falta de oportunidade para as populações em vulnerabilidade. "Além disso, podemos elencar a falta de respeito à autoridade, a falta de valor à vida, a normalização cultural de homicídios como algo quase aceitável em alguns bairros latino-americanos", disse.
O ex-prefeito de Palmira, Oscar Escobar, esteve em Pelotas, no Sul do Estado, no mês passado, para o evento sobre segurança pública Connex 2024. Durante o evento, ele apresentou os principais dados relacionados à redução da violência na cidade sob sua gestão entre 2020 e 2023. Em 2022, segundo ele, Palmira teve a taxa mais baixa de homicídio em 17 anos, com 30,6 mortes para 100 mil habitantes. Em entrevista ao Jornal do Comércio, Escobar afirmou que o principal projeto contra violência desenvolvido na cidade, Pazos (Paz y Oportunidades para Palmira), foi desenhado a partir da premissa que a principal causa de insegurança é a falta de oportunidade para as populações em vulnerabilidade. "Além disso, podemos elencar a falta de respeito à autoridade, a falta de valor à vida, a normalização cultural de homicídios como algo quase aceitável em alguns bairros latino-americanos", disse.
Leia abaixo a entrevista completa.
Jornal do Comércio - Palmira é considerada uma cidade referência no agronegócio colombiano. A cidade sofre com violência rural?
Oscar Escobar - Palmira é uma cidade que tem sua história ligada ao desenvolvimento da agroindústria da cana, especialmente na zona rural plana. Há também uma zona rural montanhosa, onde houve conflito armado com as guerrilhas colombianas, há 20, 30 anos. Hoje, ainda há presença de grupos armados nessa zonas, mas a verdade é que essas mortes que acontecem na zona rural representam apenas de 3% a 5% do total de homicídios da cidade durante o ano
JC - Quais eram as taxas de violência no auge? Qual era o principal tipo de violência? Quando os números começaram a reduzir?
Escobar - A cidade de Palmira esteve entre uma das 50 cidades mais violentas do mundo durante 10 anos. É importante destacar que essa lista leva em conta apenas cidades que tem mais de 300 mil habitantes. Outras cidades, às vezes mais violentas, não aparecem. Em 2011, a cidade de Palmira tinha um índice de 100 homicídios para 100 mil habitantes. Em 2022, a cidade reduziu a violência para 30,6 mortes para 100 mil habitantes. Foi a taxa mais baixa em 17 anos. Esse resultado foi consequência de diversos esforços conjuntos para inverter valores sociais. O principal tipo de violência urbana está relacionado ao trafico de drogas nos bairros.

JC - Enquanto prefeito da cidade, quais foram suas ações que contribuíram para a redução da violência? Em que período isso aconteceu?
Escobar - Fui prefeito entre 2020 e 2023. Montamos estratégias para compor o programa Pazos, que tinha como objetivo reduzir a violência. Consiste em uma visão integral de segurança, com cinco componentes: interrupção, intervenção, prevenção, bairros seguros e acesso à justiça. Foi um acordo firmado entre governo e setores empresariais. Em 2021, a fundação Open Society Foundations financiou um estudo de impacto com a Pontificia Universidad Javeriana - Cali, que mostrou que a redução  de homicídios na cidade tinha ligação direta com as estratégias do programa.
 JC- Como é a cidade atualmente?
Escobar - Atualmente, Palmira é uma cidade vibrante, com atividade econômica intensa, está a 25 minutos de Cali, a terceira maior cidade da Colômbia. Apesar disso, a média de homicídios na Colômbia é 22 por 100 mil habitantes, enquanto Palmira segue acima de 30. É uma necessidade seguir reduzindo. 
JC- Quais fatores você considera que causam violência em uma cidade, especialmente em cidades latino-americanas? 
Escobar - Nosso programa foi desenhado a partir da premissa de que a principal causa de insegurança é a falta de oportunidade. Apesar disso, é possível ver cidades com índices mais altos de pobreza e menor taxa de homicídios. Por isso, também é importante considerar o contexto de atuação dos grupos criminosos nas cidades. No caso de Palmira não há um grupo grande, mas muitos grupos pequenos que lutam pelo controle do território e isso gera violência. Além disso, podemos elencar a falta de respeito à autoridade, a falta de valor à vida, a normalização cultural de homicídios como algo quase aceitável em alguns bairros latino-americanos.
JC - Desde o fim do ano passado, a Colômbia tem visto um aumento de violência no País. O que pode estar causando isso?
Escobar - A Colômbia iniciou um processo chamado Paz Total, que implica uma negociação com todos os grupos armados que desejassem no país, incluindo a antiga guerrilha do Exército de Libertação Nacional da Colômbia (ELN), mas também das dissidências da Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Acontece que muitos outros grupos criminosos quiseram entrar nas negociações com reconhecimento politica. Esse incentivo perverso incrementou a violência, porque esses grupos querem se mostrar fortes para negociar e eles fazem isso provocando violência. 


JC - A guerra contra as drogas é uma das razões que contribuem para o aumento da violência? Acredita que mudanças na legislação poderiam contribuir para uma cultura de paz?
Escobar - Sem dúvidas. As drogas são tão lucrativas e, ao mesmo tempo, por serem ilegais, se tornam um dos principais motivos que geram a violência. Drogas se vendem em todo o mundo, Amsterdam, em lugares da Coreia do Sul, por exemplo. Essas sociedades têm taxas inferiores de violência, porque, apesar de terem organizações criminosas, essas não entendem o assassinato como um mecanismo para organizar o seu negócio e porque, em alguns casos, já existem regras dentro da legalidade, ainda que isso não seja uma solução definitiva. Nos Países Baixos, por exemplo, tem se percebido um aumento da violência associada ao tráfico de outras drogas, como as sintéticas, em particular com o porto de Roterdã. É importante ver o que está dando certo e o que não está.

JC - A violência afeta o desenvolvimento econômico? Como se relacionam estes dois fatores?
Escobar - Sim. É uma perda social muito grande, com danos econômicos às famílias e à sociedade como um todo. Atrair empresas é muito difícil se a cidade é muito insegura. O mesmo acontece com o turismo. Ainda que haja correlação e não casualidade, necessariamente. Mas, por exemplo, desenvolver plenamente o turismo de uma cidade é difícil se há muita violência. 

JC- Temos visto um aumento da violência geral e política na América Latina desde o ano passado, com eleições turbulentas no Equador, uma onda de violência na Argentina e assassinatos recordes no país mais pacífico da América Latina, a Costa Rica. Em termos gerais, como avalia o futuro da segurança no nosso continente?

Escobar - As más noticias sempre chegam primeiro. Geram escândalos. Mas também há muitos casos de exitosos, que não são espetaculares, mas que são, sim, fruto de processos de anos e décadas. É preciso mostrar com evidência o que está funcionando e o que não está nas politicas de segurança, com respeito aos direitos humanos. Estamos vivendo um contexto mundial de maiores conflitos com a guerra entre a Ucrânia e a Rússia, Israel e Hamas. Mas é preciso notar que a maioria dos homicídios está nas principais cidades do mundo, onde há, em tese, "paz". Precisamos ter em mente essas cifras e saber onde devemos por os recursos para que tenhamos desenvolvimento sustentável, que reduza as mortes violentas pela metade até 2030, conforme objetivo da Organização das Nações Unidas (ONU). 

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