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Publicada em 26 de Janeiro de 2024 às 08:19

Desvio de esgoto cloacal pode ser causa de praia imprópria para banho no RS

Tubulação que chega à beira das praias, como Rainha do Mar (foto), deveria escoar apenas água da chuva

Tubulação que chega à beira das praias, como Rainha do Mar (foto), deveria escoar apenas água da chuva

Mauro Belo Schneider/Especial/JC
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Mauro Belo Schneider
Mauro Belo Schneider Editor-executivo
* De Xangri-Lá
* De Xangri-Lá
O cheiro e a aparência das águas que desembocam na areia e chegam ao mar pelo sistema de drenagem de municípios do Litoral Norte geram preocupação entre veranistas e moradores. Embora, teoricamente, seja água da chuva escoada, ou seja, esgoto pluvial, o mau cheiro verificado em alguns pontos levanta questionamentos sobre a mistura também com esgoto cloacal.
Em meio a esta situação, cinco balneários do Litoral Norte estão impróprios para banho atualmente: Xangri-Lá (Rainha do Mar), Imbé (Santa Terezinha e Mariluz), Torres (Praia da Cal) e Tramandaí (Jardim Atlântico).
A Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) diz, através de nota, que a água que desemboca no mar é da chuva, proveniente de sistemas pluviais de responsabilidade das prefeituras. “Dentre as atribuições da Corsan estão as manutenções preventivas e corretivas das estruturas de esgoto cloacal.
Cabe informar que vistorias são realizadas sistematicamente, buscando identificar e inibir ligações irregulares provenientes de sistemas pluviais das edificações que acabam sobrecarregando o sistema”, diz a companhia, agora controlada pela empresa privada Aegea Saneamento. 
Darci Campani, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), conselheiro da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) e diretor da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes-RS), frequenta Xangri-Lá há 30 anos, e questiona o teor das águas que chegam ao mar pelo sistema de drenagem.
“Não pode ser apenas uma fantasia do povo, pois o cheiro que sentimos frequentemente nessas águas denuncia a presença de material fétido. Não só o cheiro, mas em algumas dessas saídas é visível a presença de material orgânico. Saliento que esse não é um problema de poucos anos, mas sim algo que se caracteriza claramente desde quando Xangri-Lá começou a crescer mais acentuadamente na última década”, observa. 
O município, aliás, a partir da aprovação do novo Plano Diretor em novembro passado, começará a promover audiências públicas sobre a atualização de seu Plano de Saneamento. A empresa Arvut, de Porto Alegre, é quem faz os estudos que serão apresentados à população na Câmara de Vereadores.  
Rafael Volquind, chefe da divisão de Infraestrutura e Saneamento Ambiental da Fepam (Fundação Estadual de Proteção Ambiental), confirma a suspeita de Campani. Segundo ele, as águas que chegam diretamente na praia após atravessar áreas urbanas têm potencial de estarem contaminadas com esgoto doméstico.
“Apesar da solução individual adotada, muitas instalações não são construídas adequadamente e também não recebem a manutenção adequada, podendo haver vazamentos ou lançamentos que chegam às drenagens. Para saber se são prejudiciais ou não, deveriam ser realizadas análises destas águas, buscando caracterizá-las de forma adequada, principalmente verificando se há indicativo de presença de esgoto acima dos padrões permitidos”, aconselha.
A Fepam lembra que a competência em implementar o saneamento básico é dos municípios, e o Estado entra como um norteador das ações. Municípios do Litoral concederam o serviço para a Corsan, que atua em 317 municípios gaúchos.
Xangri-Lá tem apenas 32% de seu esgoto tratado. Os 68% restantes ficam em fossas filtro e sumidouros. Essa matéria orgânica, quando não há rede, conforme a Corsan, é de responsabilidade da administração pública. O prefeito de Xangri-Lá, Celso Barbosa (PTB), conhecido como Celsinho, no entanto, não acha que se trate de vazamento. 
"Foi feita uma fiscalização da Secretaria do Meio Ambiente e da Vigilância Sanitária em todas as descidas para o mar e não foi encontrado nenhuma ligação clandestina de esgoto. O que a gente acha que pode ser é que as fortes chuvas sobre o lençol freático tenham levado para o mar. É a única explicação que tem", afirma, ao ser questionado sobre a condição de água imprópria em Rainha do Mar.
No balneário, há três desembocadores no mar. Em nenhum deles havia cheiro desagradável nesta quinta-feira (25). A coloração da água também era límpida. 
De acordo com o sexto boletim da temporada 2023/2024 do Projeto Balneabilidade, divulgado pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) no dia 19, dos 88 pontos analisados, 73 estão próprios e 15 estão em condição imprópria no Estado.
“O fato é evidente: Rainha do Mar está imprópria para banho por coliformes, não tem outra origem destes coliformes se não a falta de saneamento da cidade, resultados de muitos anos de descaso com o tema pelos órgãos não tão competentes”, reclama Campani.
Mauro Belo Schneider/Especial/JC


A Fepam cita que a presença da bactéria Escherichia coli (E.coli) é o que define a balneabilidade. “É uma bactéria naturalmente encontrada no intestino das pessoas e animais de sangue quente, sem que sejam percebidos sintomas. Sua presença em abundância na água indica a possibilidade de haver, naquele local, micro-organismos intestinais capazes de provocar doenças. O monitoramento da E.coli é realizado em todos os pontos da balneabilidade”, descreve a Fepam. 
A Corsan, agora, investe em aprimorar o sistema. “A nova controladora (Aegea) entrou há pouco mais de seis meses e, após estudos técnicos, desenhou um plano especial para o Litoral focado em acabar com a falta d’água e em expandir a cobertura da rede de esgoto. Esse é um dos temas prioritários para os primeiros anos de atuação com investimento previsto de mais de R$ 550 milhões”, detalha a Corsan através de nota enviada pela assessoria de imprensa.
Esta é a primeira reportagem da série sobre saneamento no Litoral Norte.

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