O 28 de julho foi instituído pela Assembleia Geral das Nações Unidas como o Dia Mundial da Conservação da Natureza. A data é uma forma de conscientizar a sociedade sobre a importância de se preservar os recursos naturais. Para isso, trabalhos de educação ambiental e de combate à poluição dos mares são essenciais para a manutenção de espécies que dependem dos oceanos para viver, como aves marinhas e costeiras. As mudanças climáticas - que influenciam, por exemplo, a reprodução desses animais - e a captura incidental durante pescarias são outras ameaças a essas espécies.
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No Brasil, o esforço de organizações como o Instituto Albatroz - que atua no RS por meio de um acordo de colaboração acadêmica com a Universidade Federal do Rio Grande (Furg) - e a BirdLife International tem se traduzido na formulação de medidas para proteção de aves e a sensibilização da sociedade quanto à importância da preservação. Entre as quase 350 espécies de aves marinhas e costeiras catalogadas no mundo, pelo menos 145 transitam pela faixa litorânea do País. No RS, são ao menos 11 espécies de albatrozes - sete dos quais são observados com frequência por pesquisadores em alto mar -, entre as quais, o Albatroz de Nariz Amarelo e a Pardela de Óculos.
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A semente do Projeto Albatroz foi lançada ainda na década de 1990, quando um aluno de mestrado da Furg desembarcou de um cruzeiro de pesquisa a bordo de um barco de pesca com espinhel no porto de Santos (SP). Ele trouxe consigo alguns albatrozes e petréis mortos, capturados durante a pescaria. Em 2003, o Projeto Albatroz estabeleceu-se como a primeira instituição do mundo a dedicar-se à conservação de albatrozes e à redução da captura incidental dessas aves marinhas migratórias, que passam a maior parte de sua vida em alto mar, onde interagem com a pesca de espinhel. Atualmente, possui bases em Santos (SP), Itajaí e Florianópolis (SC), Itaipava (ES), Natal (RN), Cabo Frio (RJ) e Rio Grande (RS).
Na cidade do Sul do Estado são desenvolvidas pesquisas, ações de monitoramento de portos e educação ambiental com pescadores. Os estudos realizados na Furg contribuem para subsidiar políticas públicas e a promoção de ações de educação ambiental junto aos pescadores e às escolas.
Gabriel Sampaio é doutorando pela Universidade Federal de Rio Grande (Furg), vinculado ao Laboratório de Tartarugas Marinhas e Aves Aquáticas e pesquisador associado ao Projeto Albatroz. Sampaio explica que a base de Rio Grande é bastante focada na pesca em si. O trabalho é feito em duas principais frentes. “Uma é o monitoramento do porto, que inclui conversas com pescadores sobre onde foi realizada a pescaria, em que posições foram feitos os lances de pesca e se ocorreram capturas não intencionais de aves.” O objetivo é reunir informações sobre a pescaria e a interação dela com as aves.
Na cidade do Sul do Estado são desenvolvidas pesquisas, ações de monitoramento de portos e educação ambiental com pescadores. Os estudos realizados na Furg contribuem para subsidiar políticas públicas e a promoção de ações de educação ambiental junto aos pescadores e às escolas.
Gabriel Sampaio é doutorando pela Universidade Federal de Rio Grande (Furg), vinculado ao Laboratório de Tartarugas Marinhas e Aves Aquáticas e pesquisador associado ao Projeto Albatroz. Sampaio explica que a base de Rio Grande é bastante focada na pesca em si. O trabalho é feito em duas principais frentes. “Uma é o monitoramento do porto, que inclui conversas com pescadores sobre onde foi realizada a pescaria, em que posições foram feitos os lances de pesca e se ocorreram capturas não intencionais de aves.” O objetivo é reunir informações sobre a pescaria e a interação dela com as aves.

Gabriel Sampaio é doutorando pela Universidade Federal de Rio Grande (Furg). FOTO: Gabriel Sampaio/Arquivo Pessoal/JC
A outra frente é o trabalho embarcado, sensibilizando os pescadores sobre as aves e as medidas mitigadoras da captura incidental. “Eventualmente, acompanhamos os pescadores nessas viagens de pesca para fazermos um monitoramento ‘mais fino’, com a contagem de aves a bordo, e ter uma ideia de como está a assembleia de aves ao largo da costa”, conta o pesquisador.
Com as informações coletadas em campo, os pesquisadores desenvolvem pesquisas que ajudam a entender os albatrozes e petréis que visitam o Brasil e interagem com as embarcações pesqueiras, agregando informações relevantes para a conservação das espécies junto a criadores de políticas públicas e instituições que protegem essas aves. Sobre a desconfiança dos pescadores com o trabalho que realizam, Sampaio diz que nada ocorre “da noite para o dia”. “É preciso adquirir confiança e mostrar que nosso trabalho não é contra o deles.”
Aves marinhas precisam que os mares estejam “saudáveis” e sejam locais “seguros” para se alimentarem. Saudáveis porque qualquer tipo de material que cause reflexo, como plástico, engana esses animais, que os ingerem achando que estão comendo peixes. Seguros porque pescarias com espinhel de superfície ou pelágico utilizam milhares de anzóis e não capturam apenas as espécies-alvo, peixes de alto valor comercial, como atuns, tubarões e espadartes. O brilho do metal atrai albatrozes e petréis, que acabam afundando juntamente com as armadilhas.
“Nas pescarias de espinhel de fundo, pelágico, comuns no Sul, de modo geral, as aves vêm mortas. Essas capturas acontecem no momento da largada. Então, quando esse material é lançado, conforme vai afundando, as iscas estão disponíveis ali para as aves roubarem. quando a ave é fisgada - é quando mais acontecem capturas, inclusive as medidas mitigadoras tentam evitar justamente isso - o bicho afunda junto com o material de pesca e morre afogado. Só vemos isso quando o material é recolhido”, explica Sampaio.
No Brasil, a legislação determina que pescarias de espinhel no Sul e no Sudeste devem usar três medidas: largada noturna do material de pesca, uso de toriline (linha com fitas coloridas que espanta as aves da área de afundamento dos anzóis) e uso do regime de peso, que ao reduzir a distância entre os pesos e os anzóis faz com que o material afunde mais rápido. O uso das três medidas é obrigatório e, se feito corretamente, praticamente elimina o risco de captura de aves.
Avistar um albatroz em terra é tarefa quase impossível

Depois de usufruirem do que o litoral gaúcho tem a oferecer, os albatrozes migram para áreas como as Ilhas Malvinas, na Argentina, para colocarem seus ninhos
Projeto Albatroz/Dimas Gianuca/Divulgação/JCA figura dos albatrozes habita o imaginário, principalmente, devido a referências em filmes. Mas, na vida real, avistar um albatroz a partir da terra firme é tarefa quase impossível. Para enxergar alguma das 11 espécies que transitam pela costa gaúcha - são 22 no mundo todo -, é preciso estar munido de binóculo ou luneta, uma vez que essas aves não chegam tão próximas da areia.
Para albatrozes, a costa gaúcha serve como um grande prato de comida e uma confortável cama. Chamadas de Migrantes do Sul, estas aves passam a vida inteira no mar, percorrem até mil quilômetros por dia em busca de alimento e podem voar a cerca de 100 km/h. Só que depois de usufruirem do que o litoral gaúcho tem a oferecer, elas migram para áreas no entorno da Antártica, para o arquipélago de Tristão da Cunha - no sul do Oceano Atlântico, um território ultramarino britânico -, e para as Ilhas Malvinas, na Argentina, por exemplo, para colocarem seus ninhos.
“Um albatroz juvenil, antes de atingir a maturidade, o que pode demorar até 12 anos, dependendo da espécie, até pode voltar à sua colônia, mas em geral passa esse período todo no mar. São aves completamente adaptadas ao ambiente oceânico. Elas têm, por exemplo, glândula de sal, não tomam água doce. A água do corpo delas vem do alimento, que passa por um processo de filtragem, como se tivessem um rim extra. Na verdade é uma modificação da glândula lacrimal que faz com que elas possam excretar o sal”, explica Sampaio.
Para albatrozes, a costa gaúcha serve como um grande prato de comida e uma confortável cama. Chamadas de Migrantes do Sul, estas aves passam a vida inteira no mar, percorrem até mil quilômetros por dia em busca de alimento e podem voar a cerca de 100 km/h. Só que depois de usufruirem do que o litoral gaúcho tem a oferecer, elas migram para áreas no entorno da Antártica, para o arquipélago de Tristão da Cunha - no sul do Oceano Atlântico, um território ultramarino britânico -, e para as Ilhas Malvinas, na Argentina, por exemplo, para colocarem seus ninhos.
“Um albatroz juvenil, antes de atingir a maturidade, o que pode demorar até 12 anos, dependendo da espécie, até pode voltar à sua colônia, mas em geral passa esse período todo no mar. São aves completamente adaptadas ao ambiente oceânico. Elas têm, por exemplo, glândula de sal, não tomam água doce. A água do corpo delas vem do alimento, que passa por um processo de filtragem, como se tivessem um rim extra. Na verdade é uma modificação da glândula lacrimal que faz com que elas possam excretar o sal”, explica Sampaio.
Aves ajudam a sustentar a cadeia alimentar marinha

Coordenador de projetos na SAVE Brasil, Gianuca explica que os albatrozes têm um papel chave na regulação oceânica
Dimas Gianuca/Projeto Albatroz/Divulgação/JCMas porque albratrozes e petréis são tão importantes para a manutenção do ecossistema marinho? Coordenador de projetos na Save Brasil, braço da BirdLife International no País, o biólogo Dimas Gianuca explica que essas aves têm um papel chave na regulação oceânica, justamente pela capacidade de deslocamento muito grande sobre o mar, elas fazem “link energético” entre regiões muito diferentes.
Nos longos trajetos que fazem diariamente em busca de comida, se alimentando de coisas de um lugar e defecando em outro, acabam por distribuir os nutrientes marinhos sobre uma vasta área e contribuindo para a fertilização do oceano, ou seja, disponibilizam nitrogênio e potássio para as microalgas marinhas, que são os fitoplânctons, ajudando na produtividade. “Os fitoplânctons são as algas do mar que ficam na coluna d’água e servem de alimento para os pequenos crustáceos, para os pequenos peixes, para os peixes maiores, para as baleias, os albatrozes e assim por diante. Então, os albatrozes ajudam a regular e fomentar o ciclo de fertilização desse alimento, dessa base que sustenta a cadeia alimentar marinha.”
Nos longos trajetos que fazem diariamente em busca de comida, se alimentando de coisas de um lugar e defecando em outro, acabam por distribuir os nutrientes marinhos sobre uma vasta área e contribuindo para a fertilização do oceano, ou seja, disponibilizam nitrogênio e potássio para as microalgas marinhas, que são os fitoplânctons, ajudando na produtividade. “Os fitoplânctons são as algas do mar que ficam na coluna d’água e servem de alimento para os pequenos crustáceos, para os pequenos peixes, para os peixes maiores, para as baleias, os albatrozes e assim por diante. Então, os albatrozes ajudam a regular e fomentar o ciclo de fertilização desse alimento, dessa base que sustenta a cadeia alimentar marinha.”
Essas aves se alimentam na costa gaúcha e levam essa matéria orgânica para suas regiões de reprodução. “Esse balanço é superimportante para termos a manutenção do ecossistema global funcional. Isso envolve, entre outras coisas, a manutenção das pescarias”, complementa Sampaio.
Poluição e mudanças climáticas são ameaças a aves marinhas e costeiras
O que se faz no ambiente costeiro, afeta também o oceânico. A poluição por lixo, as mudanças climáticas e a introdução de predadores nos locais de reprodução são ameaças crescentes a essa cadeia de fertilização.
“Está tudo muito ligado. quando se joga um lixo aqui no Atlântico, pode parar no Pacífico, no Índico, porque os oceanos estão todos conectados pelo sistema de corrente e fazem do oceano “um grande oceano”, ressalta Sampaio. As aves ingerem lixo e levam lixo para os filhotes se alimentarem. Elas acabam ficando cheias, mas morrendo por desnutrição, porque não tem alimento de verdade, só tem lixo.
“A introdução de predadores exóticos nas ilhas em que eles se reproduzem é um grave problema, porque albatrozes e petréis só procriam em áreas marinhas, que historicamente não tinham predadores terrestres. Não tinha rato, gato, nenhum outro bicho. Eles foram levados a esses locais por embarcações. Além disso, porcos e cabras, que historicamente os navegadores largavam nas ilhas para ter alimento para quando retornassem, dizimaram a vegetação, o ambiente que é usado para os albatrozes se reproduzirem”, alerta o coordenador de projetos da Save Brasil.
Com relação às mudanças climáticas, duas causas principais afetam as aves. “Alterações nos ecossistemas marinhos, que modificam a temperatura e alteram a produtividade daquele plâncton, daquela cadeia que ele detém, e também eventos extremos meteorológicos, como chuvas, ventanias nos lugares onde esses bichos fazem seus ninhos. Eles precisam de condições mais amenas”, explica.
“Está tudo muito ligado. quando se joga um lixo aqui no Atlântico, pode parar no Pacífico, no Índico, porque os oceanos estão todos conectados pelo sistema de corrente e fazem do oceano “um grande oceano”, ressalta Sampaio. As aves ingerem lixo e levam lixo para os filhotes se alimentarem. Elas acabam ficando cheias, mas morrendo por desnutrição, porque não tem alimento de verdade, só tem lixo.
“A introdução de predadores exóticos nas ilhas em que eles se reproduzem é um grave problema, porque albatrozes e petréis só procriam em áreas marinhas, que historicamente não tinham predadores terrestres. Não tinha rato, gato, nenhum outro bicho. Eles foram levados a esses locais por embarcações. Além disso, porcos e cabras, que historicamente os navegadores largavam nas ilhas para ter alimento para quando retornassem, dizimaram a vegetação, o ambiente que é usado para os albatrozes se reproduzirem”, alerta o coordenador de projetos da Save Brasil.
Com relação às mudanças climáticas, duas causas principais afetam as aves. “Alterações nos ecossistemas marinhos, que modificam a temperatura e alteram a produtividade daquele plâncton, daquela cadeia que ele detém, e também eventos extremos meteorológicos, como chuvas, ventanias nos lugares onde esses bichos fazem seus ninhos. Eles precisam de condições mais amenas”, explica.
Essas aves têm uma estratégia de vida chamada de “K estrategista”, ou seja, investem muita energia em poucos filhotes com alta taxa de sobrevivência. A fecundidade delas é baixa, então, para se recuperarem de impactos abruptos nas suas populações pode demorar décadas.
Nesse sentido, alerta Sampaio, uma outra questão que deve ser levada em conta é a mudança nos padrões de distribuição de alimentos. “Imagina um bicho que estava acostumado a sair da sua colônia e percorrer 1.000km por dia para encontrar alimento e tem de passar a andar 1.500km? Isso leva a um gasto energético maior. Um dos fatores que as mudanças climáticas afetam as aves marinhas como um todo são nessa mudança nos padrões de distribuição das presas, dos alimentos.”