Considerado o segundo país em diversidade de aves do mundo - são mais de 1,9 mil espécies catalogadas -, o Brasil também carrega um recorde negativo: é a nação que possui mais aves em risco de extinção, com 176 tipos.
Organizações que trabalham com preservação e educação ambiental têm ajudado na conscientização para que a conservação de aves e seus habitats sejam preservados. Entre as com atuação em território nacional está a Save Brasil, braço da BirdLife Internacional. A aliança global é formada por ONGs que têm foco especial na conservação das aves e atuam em conjunto compartilhando prioridades, políticas e programas de preservação, trocando conhecimentos, realizações e informações e fortalecendo, assim, as habilidades, as autoridades e as influências locais.
Um dos focos de atuação da BirdLife é o combate à mortalidade incidental de aves, que acontece acidentalmente durante as atividades de pesca. Doutor em Ciências Biológicas pela University of Exeter, no Reino Unido, o biólogo rio-grandino Dimas Gianuca, é coordenador de Projetos na Save Brasil, braço da BirdLife International. O seu foco de atuação é o ambiente marinho, voltado à preservação de albatrozes e petréis.
Jornal do Comércio - O que é a BirdLife Internacional?
Um dos focos de atuação da BirdLife é o combate à mortalidade incidental de aves, que acontece acidentalmente durante as atividades de pesca. Doutor em Ciências Biológicas pela University of Exeter, no Reino Unido, o biólogo rio-grandino Dimas Gianuca, é coordenador de Projetos na Save Brasil, braço da BirdLife International. O seu foco de atuação é o ambiente marinho, voltado à preservação de albatrozes e petréis.
Jornal do Comércio - O que é a BirdLife Internacional?
Dimas Gianuca - É uma aliança global de organizações de conservação da natureza com foco nas aves e seus ambientes, que atua em 120 países. A Save Brasil, braço da BirdLife Internacional no País, tem 15 anos. Começou em 2008, com o objetivo de conservar as aves e os ambientes em que elas vivem no Brasil e, em 2016, passou a ser uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip). Então o Save Brasil tem essa questão, conservar as aves e seus ambientes sempre lidando com as relações sociais e a sustentabilidade. Atua em nove estados e tem mais de 110 projetos com aves de diferentes tipos, costeiras, papagaios, araras e passarinhos.
JC - Como é esse trabalho?
Gianuca - Meu trabalho vai além do Brasil. A BirdLife tem um programa marinho, voltado às aves. E dentro desse programa são desenvolvidas ações-chave para a conservação dos albatrozes e petréis em águas internacionais, que estão fora das jurisdições dos países, nas quais atuam frotas de diferentes nações, principalmente asiáticas. O objetivo de se ter um programa global em relação a albatrozes, com trabalho e investimento, é porque essas aves estão entre as espécies mais afetadas pela captura incidental. Isso beneficia também as espécies que ocorrem no Brasil, as quais percorrem vastas distâncias pelo oceano e são afetadas pelas pescarias internacionais.
JC - Como surgiu a oportunidade em trabalhar com albatrozes e petréis?
Gianuca - Nesse programa há um setor voltado à redução da captura de albatrozes e petréis em águas internacionais, projeto coordenado pela Sociedade Real de Proteção das Aves (The Real Society for Protection of Birds), que é a BirdLife britânica, assim como a Save é um braço brasileiro. É o braço britânico que lidera o trabalho de conservação dos albatrozes em águas internacionais. Eu já havia trabalhado com eles na época em que fiz parte do Projeto Albatroz e também com a BirdLife. Então, por causa da minha experiência no Projeto Albatroz, na qual fiz diversas viagens acompanhando pescadores em alto mar e, principalmente, pela minha experiência técnica, estudando albatrozes e as interações deles com a pesca e desenvolvendo soluções para resolver capturas incidentais, há três anos, eles me chamaram para fazer parte deste programa maior.
JC - E como se deu o início pela pesquisa destas espécies?
Gianuca - A minha experiência com a natureza veio desde a época do colégio. Bem cedo eu já vinha me envolvendo. Sempre me interessei pelos ecossistemas costeiros. Praias, marinas, dunas, o ambiente marinho e, depois, dentro dessa parte costeira, acabei me interessando e trabalhando mais com as aves. Trabalhei com aves marinhas nos arquipélagos brasileiros de São Paulo e São Pedro - a 1.100km de Natal (RN) -, ilha de Abrolhos, aves costeiras no Rio Grande do Sul e depois expandi meu trabalho para os oceanos, para os albatrozes e petréis, que têm um estilo de vida muito único. São aves que só pisam em terra para formar ninhos, colocar ovos e criar os filhotes e, uma vez que acabou esse ciclo, elas vão para o mar. Passam meses e até anos só em alto mar. Normalmente não se aproximam da costa, porque não vão pousar na praia.

Um dos focos de atuação da BirdLife é o combate à mortalidade incidental de aves. FOTO: Fabiano Peppes/Projeto Albatroz/Divulgação/JC
JC - E foi isso que te atraiu para estudar essas espécies?
Gianuca - Sim. Porque a gente acaba fazendo coisas que são uma série de eventos e oportunidades que vão surgindo. Comecei a trabalhar com albatrozes e petréis num projeto da Universidade Federal de Rio Grande (Furg), chamado Talude, onde me chamaram para coordenar a parte de estudos das aves marinhas. É um projeto gigante que estuda cetáceos, mamíferos marinhos, todo o ecossistema, desde o Chuí até o Rio de Janeiro. Foi nesse momento em que tive mais contato com albatrozes e petréis, porque isso se dava em alto mar, embarcado. Nesse primeiro cruzeiro, do Chuí ao Rio de Janeiro, foram quase cinco dias direto.
JC - Qual a diferença entre aves marinhas e costeiras?
Gianuca - Aves marinhas são aquelas que voam sobre a água, tem autonomia sobre o mar, são dependentes do ambiente marinho, e as aves costeiras, são do ambiente marinho costeiro, mas não vão se alimentar sobre o mar. Somando esses grupos, são umas 100 espécies pelo menos. O litoral gaúcho, incluindo as águas marinhas (mar afora), tem uma riqueza muito grande de aves marinhas e costeiras.
JC - Existe uma catalogação de quantas espécies de aves marinhas e costeiras que transitam pela costa do RS?
Gianuca - Entre albatrozes e petréis, que são menores e têm estilo de vida parecido, são cerca de 40 espécies (no Sul). Sete espécies de albatrozes. São aves que não se reproduzem no Brasil, ficam aqui só em alto mar, mas voltam para ilhas muito distantes - Ilhas Malvinas, Geórgia do Sul, Antártida, Tristão da Cunha, Austrália, Nova Zelândia - para realizar o processo de reprodução.
JC - Acreditas que a conscientização ambiental está aumentando no Brasil de um modo geral e em relação às aves também?
Gianuca - Sim, com certeza. A questão dos impactos ambientais e o quanto isso afeta nossa vida têm feito crescer a conscientização, e no Brasil não é diferente. Então há cada vez mais um crescimento da consciência das pessoas sobre a necessidade de preservação da natureza dos ambientes dos animais e com as aves não é diferente. Inclusive, no Brasil, existe um movimento muito forte numa atividade muito importante no mundo todo chamado de “bird watching”, que na tradução literal é uma observação de aves. Isso é uma indústria gigante em outros lugares do mundo e, no Brasil, está começando a tomar um pouco mais de volume.