Desocupado desde 2016 para uma obra de restauro, o prédio do Instituto de Educação (IE) General Flores da Cunha, na avenida Osvaldo Aranha, em Porto Alegre, está sem canteiro de obras desde setembro de 2019. A Secretaria Estadual de Educação (Seduc) pretende retomar as obras ainda neste mês de outubro. Membros da Comissão de Acompanhamento da Obra de Restauro, formada pela escola, estão preocupados com a falta de confirmação do novo início das obras e com o destino futuro do prédio.
A Comissão foi criada muito antes do início dos trabalhos, em meados de 2011. Na época, conforme os relatos da presidente, Maria da Graça Ghiggi Morales, o IE tinha uma série de problemas estruturais, e a Seduc tinha decidido concentrar todas as necessidades de restauro em um só processo. A licitação foi feita em 2011 e o processo foi concluído em 2014. A ordem de início do serviço foi assinada em janeiro de 2016 e, a princípio, a obra duraria 18 meses, com previsão de término em julho de 2017.
Alguns impasses financeiros impediram que a Porto Novo Empreendimento e Construções, empresa vencedora da licitação, continuasse responsável pela obra. No final do ano em que a obra deveria terminar, o contrato foi rescindido e o Estado começou o processo para fazer uma nova licitação. Em 2018, uma nova empresa, Concrejato Serviços Técnicos de Engenharia S.A, venceu o processo e ficou responsável pelo restante da obra. Em setembro de 2018, dois anos e oito meses após o início da empreitada, a obra estava com apenas 10% de conclusão. A empresa tinha apresentado orçamento de R$ 22,9 milhões, menor que o previsto inicialmente.
O valor da obra, estimada em R$ 28,5 milhões, vinha de um empréstimo do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird), com validade até fevereiro de 2019. Ou seja, se a obra não fosse concluída até lá, no mês seguinte já seria necessário aportar recursos próprios do Estado para a reforma. “Em 2019, o novo secretário de educação (Faisal Karam) assumiu e começaram a surgir questionamentos sobre o valor da obra, já que o prazo do Bird estava quase vencendo e a obra não estava pronta. Diante disso, começaram a atrasar os pagamentos, a empresa contestou e disse que deixaria o canteiro até que os termos do contrato e os valores fossem acertados”, relembra Maria da Graça. A pandemia atrasou as tratativas e a obra segue parada desde então.
Em maio deste ano, a Seduc informou ao Jornal do Comércio que o investimento previsto - proveniente do salário-educação (Fundo Nacional de Educação) - na obra do Instituto de Educação é de R$ 22,9 milhões, dos quais R$ 9,1 milhões são referentes à mão de obra e R$ 13,7 milhões a materiais. Na ocasião, a pasta disse que a obra seria retomada em julho de 2021, com prazo de término para dezembro de 2022.
Nesta semana, por meio de nota ao JC, a Seduc disse que "está em negociações com a empresa responsável pela restauração do Instituto de Educação Flores da Cunha para retomada da obra em outubro”.
O contrato com a Concrejato está suspenso desde 2019, mas ainda não foi rescindido. "Temos informações de que o aditivo ao contrato com a empresa, para retomada da obra, ainda não foi assinado. Portanto, a mobilização efetiva dos trabalhos, acredito que vai demorar um pouco mais", afirma Maria da Graça.
“Saímos de lá em 2016 com o intuito de retornar em 18 meses e isso não aconteceu. Não poderíamos ficar lá enquanto a obra acontecia”, conta a professora de língua portuguesa do IE e membro da Comissão, Heloiza Rabeno.
Os 1,9 mil estudantes da instituição foram realocados para três outras escolas da Capital. “O nosso retorno, enquanto escola, é para a sede da Osvaldo Aranha, mas existe uma indefinição desse retorno. Não temos certeza de como e quando acontecerá”, pontua.
Prédio do IE será sede de um centro de referência em educação, diz Seduc
Nesta semana, em Madri, Leite assinou o protocolo de entendimento do Museu Escola do Futuro
Gustavo Mansur/Palácio Piratini/JC
Além da preocupação com quando acontecerá o retorno, Maria da Graça e Heloiza também ficam apreensivas com a falta de informações oficiais sobre o destino do prédio, que foi construído em 1935 e é considerado um dos patrimônios históricos do Rio Grande do Sul. “O Instituto tem 152 anos de história e está há mais de 80 anos no prédio da Osvaldo Aranha. A casa anterior do IE era na rua Duque de Caxias e não foi por qualquer decisão que ele se mudou para aquela sede”, defende Heloiza.
A professora, que leciona no Instituto há 21 anos, conta que o prédio tem tudo para garantir que o IE tenha uma educação de referência no Estado. Mas, desde o início das obras, existem boatos de que será destinado para outras funções além da escola. A Seduc informou, via nota, que “o projeto a ser realizado no Instituto de Educação Flores da Cunha visa transformar sua estrutura em um centro de referência em educação. Ele receberá o Museu Escola do Futuro, o Centro de Educação Mediada por Tecnologia e o Centro de Desenvolvimento do Profissional da Educação, além de uma escola modelo.”
Segundo a pasta, a ideia é criar um ambiente que estimulará a qualificação e a descoberta, em um espaço que aproxima as pessoas das novas formas de conhecimento. “O projeto tem como propósito a preparação de professores e estudantes para os novos desafios do mundo, com habilidades para responder às exigências de inovação e complexidade do século XXI”, declarou.
Apesar da Seduc afirmar ter participado de encontros com a equipe diretiva para debater esse projeto, o assunto ainda está nebuloso para Heloiza e Maria da Graça. “Foi com muita surpresa que essas coisas foram ditas fora do nosso conhecimento. Nos derrubou, ficamos com esse medo que viesse gente de fora e que nós ficássemos nessas unidades que estamos hoje”, conta Heloiza.
Para ela, os atuais espaços são muito pequenos e não propiciam a continuidade da educação que o IE oferecia antes dessa divisão. “Onde estamos hoje é muito pequeno, não temos espaço para nada. No IE temos tudo. Lá eu me faço professora. E penso muito nos nossos alunos. Sabe o que é um adolescente não ter espaço para conversar com outro no recreio? Ou não ter onde atirar uma bola na Educação Física?”, indaga.
Já para a presidente da Comissão de Acompanhamento da Obra de Restauro, a preocupação principal acerca desse assunto é outra: a forma como esses espaços irão coexistir. “O IE tem uma equipe diretiva formada para gerir a escola. Não sabemos como esses centros foram desenhados, quem vai geri-los ou quais espaços irão utilizar”, aponta.
Nesta semana, em Madri, na Espanha, o governador Eduardo Leite assinou o protocolo de entendimento do Museu Escola do Futuro, confirmando, então, a nova função do prédio. Na ocasião, Leite disse que queria “rechear este prédio para dar a ele a vida que entendemos que é importante que tenha: não ser apenas a formação para uma centena de alunos, mas ser uma escola de escolas.”