As internações de casos confirmados e suspeitos de Covid-19 nas UTIs de Porto Alegre não param de acelerar e é o que
provoca o retorno de medidas de distanciamento. Esta quinta-feira (25) encerrou com 144 pacientes (113 positivos e 31 à espera do resultado). No Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), eram 52 doentes para 56 leitos (92% de lotação). Nesta sexta-feira (26),
serão abertos mais leitos. "Não dá para enfrentar a pandemia só dentro dos hospitais", adverte o diretor médico do HCPA, Milton Berger.
Berger cita que o nível de confirmação de casos mudou de padrão. "Há algumas semanas, todos que chegavam com suspeita, maioria não confirmava, hoje todos os que chegam confirmam", contrasta o médico, alarmado com a evolução da contaminação e antevendo que a ampliação de vagas não será suficiente, se for mantida a velocidade de casos que exigem UTIs, que esta semana superaram os
cem doentes internados com a Covid-19.
"Isso significa que a doença está se propagando mais na população em geral", adverte o profissional, que reforça: "Há uma clara correlação entre restrição e circulação e a disseminação menos veloz do vírus", relaciona, defendendo que as pessoas precisam seguir o distanciamento.
Sobre a afirmação de muitas pessoas que questionam as medidas de restrição e fechamento devido ao crescimento de doentes em UTIs e dizem que "é normal ter lotação nas unidades de terapia intensiva nesta época do ano", o diretor médico contrapõe: "Mesmo aumentando 56 leitos, além do que tínhamos, todos os leitos estão sendo ocupados. Portanto, é um argumento que cai por terra: dizer que seria normal essa lotação, se a epidemia não existisse".
Outro fato agrava a pressão por vagas. Pacientes com Covid-19 têm maior gravidade e ficam mais tempo internados, o que reduz a rotatividade de leitos. O intensivista Édino Parolo, que atua na UTI do Clínicas, já
havia explicado como são os cuidados e a complexidade do casos.
Para o diretor médico, é urgente que a população perceba que "todos estamos no mesmo barco e todos têm de contribuir, não só o hospital". Além de mais leitos, o médico aposta que a maior eficácia para achatar a curva de casos será obtida com as medidas comunitárias de menor movimentação.
Outra constatação de Berger que está associada à maior circulação do vírus é de casos de funcionários do HCPA infectados. Já foram afastadas 170 pessoas atestadas com Covid-19. Ele admite que é um número pequeno para um universos de 6 mil a 7 mil pessoas que atuam no Clínicas. A UTI cardíaca teve casos e foi preciso fazer ajustes e reduzir capacidade, o que afeta pacientes.
"O funcionário é contaminado fora do HCPA, por isso é importante a noção de que a doença se propaga na comunidade . Dentro do hospital tomamos todos o cuidados. Mais uma razão para investir no distanciamento social", reforça mais uma vez.
Clínicas vai chegar a 105 leitos na UTI: será suficiente?
O alívio momentâneo virá nesta sexta-feira (26), quando o HCPA abrirá mais dez leitos, chegando a 66. E até o término de junho, na terça-feira (30), o número deve chegar 70. "Serão 20 leitos em pouco mais de sete dias", resume o diretor médico. A meta é chegar a 105 vagas no novo anexo, capacidade total prevista e cuja instalação foi acelerada pela pandemia.
Com o ritmo de ocupação, os leitos podem rapidamente esgotar. São quase 200 leitos exclusivos para Covid-19. Esta á a razão que fez Porto Alegre entrar na bandeira vermelha, voltando a um estado de contingência do começo da pandemia. Em um mês, a população em UTI, e com gravidade cada vez maior, cresceu 150%. O prefeito da Capital, Nelson Marchezan Júnior, disse que em meados de julho a saúde colapsa. Dos pacientes, a proporção é de 40% residentes na Capital e 60% do Interior.
Clínicas e Hospital Conceição, ligado ao GHC, são as duas referências para casos críticos, que exigem cuidados de terapia intensiva, na Capital. Nesta semana, foi anunciadas mais 16 vagas no Conceição e 14 no Complexo Santa Casa.
Mas um gargalo pode frustar a velocidade da oferta de vagas que a demanda de enfermos está pedindo: a carência de profissionais. Faltarão abrir 35 leitos, e a maior dificuldade é conseguir médicos intensivistas, admite Berger. "Queremos completar a capacidade até o fim de julho, mas estamos enfrentando arduamente a questão de pessoal", admite. "Se 'amanhã' surgisse todo o pessoal que precisamos, abriríamos mais vagas."
Segundo Berger, a demanda por contratações aumentou muito para médicos de Medicina Intensiva. Uma barreira para que mais candidatos da área se apresentem é o contrato temporário. O HCPA obteve aval do Ministério da Educação para as contratações, mas que não são permanentes. Vão atender ao período da pandemia. "Não sei se vamos conseguir utilizar as vagas oferecidas pelo governo. Isso é um problema que não depende da gente", lamenta.
Para lidar com a dificuldade, o HCPA passou a fazer malabarismos, como deslocar pessoal de UTIs de outras áreas não Covid-19 para o núcleo de cuidados de casos da nova doença. Problema que isso impacta o atendimento de pacientes que passam por cirurgia ou têm outras complicações. O hospital reduziu a 30% a produção de cirurgias, mantendo apenas agendas para procedimentos essenciais, em áreas como oncologia ou recuperação funcional de órgãos, esclarece o diretor médico.
O HCPA prevê abrir mais dez leitos até o fim de semana, chegando a 66. E até o término de junho, na terça-feira, o número deve chegar 70 no total.