E se você morrer amanhã? A maioria das pessoas nem quer pensar sobre essa possibilidade, exceto Alexandre da Silveira e Camila Leães. Os empreendedores de Porto Alegre criaram a primeira startup end-of-life do Brasil: a Quando Eu Partir. A plataforma permite que o usuário registre orientações e desejos a serem consultados depois da sua morte, facilitando as decisões de quem fica.
"Em 2021, perdi a minha mãe. Fiquei impactada pela necessidade de dar conta de coisas que o relógio não espera o teu tempo emocional para acontecer. As decisões precisavam ser tomadas de forma mais rápida, mas eu não sabia nem por onde começar", lembra Camila.
Camila estima ter despendido cerca de 500 horas em dezenas de ligações realizadas para colher as informações necessárias - sem nem contar com as burocracias do inventário. "É um trabalho muito custoso, ainda mais num momento que estava muito fragilizada. Aí, pensei: quando eu morrer, não quero que a minha família passe por isso", conta.
A angústia levou Alexandre e Camila a explorarem mais a temática. Foi assim que descobriram, no mercado norte-americano, o nicho das deadtechs, empresas de tecnologia com temáticas ao redor da morte, e o subnicho das end-of-life, startups para planejamento de fim de vida. "Pesquisamos muito e, no Brasil, não encontramos nenhuma empresa desses segmentos. Começamos a desenhar o nosso negócio para que as pessoas não passassem pela mesma situação da Camila", destaca Alexandre.
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O que você pode registrar
Lançada neste ano, a Quando Eu Partir é um espaço virtual para que o usuário anote últimos desejos e orientações práticas para quando estiver ausente. Vale registrar de tudo: se quer ser enterrado ou cremado, se é doador de órgãos ou não, como deve ser realizada a cerimônia fúnebre, informações sobre imóveis, contas bancárias, seguros e assinaturas digitais, como Netflix e Amazon Prime, e por aí vai. Até mesmo esclarecer qual deve ser o destino dos animais de estimação e dos perfis nas redes sociais são instruções que podem ser catalogadas. "É muito mais um plano, um norte para quando a pessoa não estiver mais aqui. É olhar para o fim da vida, entender que ele existe e querer ser protagonista desse momento", entende Camila.
A startup funciona como um instrumento legal - assim como um testamento - e utiliza tecnologia de dados criptografados para proteger as informações concedidas. "Trago a experiência de uma carreira de mais de 20 anos em instituições financeiras, que são mundialmente reconhecidas pela segurança", enfatiza Alexandre. Os dados podem ser atualizados a qualquer momento.
Opções de planos pago e gratuito
Estão disponíveis duas opções de planos. No gratuito, o usuário pode registrar informações sobre doação de órgãos e cerimônia de despedida e compartilhar essas anotações com uma única pessoa. No plano pago, todas as outras funções podem ser acessadas, e o compartilhamento é ilimitado. A primeira anuidade custa R$ 199,00. Nos anos seguintes, o valor pago é de R$ 99,00.
Levar esse assunto ao mercado, no entanto, não é uma tarefa tão simples. "Existem segmentos que colocam um véu sobre a morte. O nosso papel é quebrar um pouco desse tabu, tratando o assunto de forma prática, respeitosa e leve", diz Camila. E as pessoas parecem estar assimilando a importância de falar sobre essa temática com antecedência. "A pandemia fez com que as pessoas se dessem conta da finitude de uma forma muito intensa. Não precisa ser mais velho para isso acontecer. Todos os mercados conectados a isso vêm crescendo", fala Camila.
Hoje, a Quando Eu Partir conta com centenas de clientes. A perspectiva é que, ainda neste ano, a startup atinja os milhares em sua carteira. "Estamos fechando parcerias com seguradoras de vida, funerárias e outras empresas de saúde que querem oferecer a plataforma como um serviço complementar a sua oferta de produto principal", pontua Camila.