Vinícius Mitto é professor e arquivista e apresenta uma série sobre a história dos bairros de Porto Alegre no @cartaotri e em @bahguri.rs
Após ser colocado à venda, restaurante Guaipeca resiste há 34 anos e mira em renovação da Demétrio Ribeiro
O espaço, que foi colocado à venda durante a pandemia, segue firme com o propósito de fomentar a região
Natural de Lagoa Vermelha, Rose empreendia no ramo da gastronomia em Vacaria antes de se mudar para Porto Alegre no início dos anos 1990. Recém-chegada à Capital, ela começou a trabalhar no Guaipeca antes de adquirir o negócio. "Vim embora para Porto Alegre e não sabia o que fazer. Meu namorado na época já era dono daqui, então compramos em 1997. O Guaipeca estava praticamente falido. Eu tinha 23 anos e assumi o Guaipeca com tudo. Fui para a cozinha, fazia compras, atendimento, servia, lavava a louça e criei o prato do dia. Foi indo tão bem que não dei mais conta e trouxe minha irmã para cá, a Maria Andara", lembra sobre a parceria com a irmã, que atuou por oito anos no negócio.
Segundo a empreendedora, a jornada do restaurante foi próspera até o início da pandemia, quando o cenário ficou adverso. Rose chegou a anunciar, em junho de 2022, a venda da operação no grupo de vizinhos do bairro no Facebook. "Estávamos com 10 funcionários e não sabia o que fazer. Comecei a fazer doces. Não fechei totalmente, comecei a tele-entrega, que não tínhamos, fui para internet, fiz vídeo, criei promoções e não fechei o Guaipeca. Me descapitalizei e, hoje, está bem difícil", afirma Rose, que desistiu da venda após receber o apoio dos clientes fiéis do negócio. "Anunciei a venda e recebi tantos comentários das pessoas falando para não vender. Os clientes vieram falar comigo: "poxa, tu superaste uma pandemia, tu estás com as portas abertas, vais conseguir sair dessa'. Estou batalhando com todas as forças, cheia de boletos, mas estou aqui trabalhando", orgulha-se a empreendedora, que conta com cinco funcionários na operação. "Tenho funcionários há 13 anos. É um orgulho grande, porque é sinal que eles estão crescendo e é um ambiente bom de trabalhar", percebe.
"Moro há 30 anos e nunca tive nenhum problema. Para mim, é o melhor bairro de se morar. A vizinhança é tranquila, as pessoas se conhecem. Os bares dão segurança para a rua", acredita.
Operando de segunda-feira a sábado, das 11h às 23h, o Guaipeca tem como carro-chefe a à la minuta, que custa, em média, R$ 26,90 acompanhada de um refrigerante, e as pizzas. "No Guaipeca, a comida é feita na hora e é muito rápido. Você escolhe o prato e ele vem fresquinho. Sempre ofereci qualidade no atendimento e cerveja hipergelada", garante.
Tradicional lancheria atrai os trabalhadores do Centro Histórico
Com o foco nos lanches e a lá minutas, o negócio está presente na região há 25 anos
Operando das 7h às 16h, na rua Jerônimo Coelho, nº 103, a Vicari tem como público fiel os trabalhadores do Centro Histórico. "Aqui é um bairro boêmio, mas tentamos abrir na parte da noite e não valeu a pena, então preferimos ficar no horário que já era de costume. Dependemos muito dos órgãos públicos, a Assembleia é nossa maior cliente, o pessoal do Piratini também. Mas, depois da pandemia, muitos escritórios fecharam, eles começaram a trabalhar em casa, aí dificultou um pouco", comenta Tarso, que comanda o restaurante com os dois irmãos, Carina, cozinheira do empreendimento e Bianor Vicari.
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Chope artesanal, pizza e panini feitos na casa e muita história são as marcas do bar
Quando o Tutti fechou, em 2012, Renato, que era amigo do dono do antigo bar e já estava construindo o seu próprio em uma sala ao lado, herdou alguns itens do espaço.
"Isso aqui estava tudo em obra, mas as pessoas continuavam vindo mesmo assim, principalmente às terças. Então, eu comecei a colocar a bebida e vender antes mesmo de abrir. Sem lucro, sem sistema, sem saber de muita coisa", lembra entre risadas.
Sobre a relação com os empreendedores do bairro, Renato comenta que é a melhor possível. "É uma parceria, todos pelo mesmo objetivo, que é transformar esse espaço no que ele já é, que é um cartão postal de Porto Alegre. É uma construção coletiva e o melhor é poder ver quem vem de fora, e até as pessoas que moram aqui, encantadas com a cidade. É o que me dá satisfação", relata.
Os cardápios do local são feitos em álbuns fotográficos para mostrar e incentivar criações de clientes como cartas, fotos, desenhos e até pares de alianças de compromisso.
"O importante ao se ter um negócio é acreditar que tu vais ser grande e entender que a organização é uma das coisas principais, que deve ser cuidada desde o começo", aconselha.
Justo busca oferecer alta gastronomia a preços acessíveis no Centro Histórico
A proposta do bar foi pensada a partir do público local, e segue sendo adaptada à necessidade da clientela
O ponto nas escadarias do Viaduto Otávio Rocha foi o primeiro e único visitado pelos sócios. "Começamos a olhar imóveis e, no dia seguinte, já pegamos as chaves do espaço. Em uma semana alugamos, sem plano de negócio, sem cardápio, não tinha nada. Ficamos surpresos por não ter um negócio no ponto porque é um baita espaço, então alugamos e fomos de improviso", admite Adelino sobre o começo do bar. "Era geladeira de casa, sofá de casa. Nós sabíamos que iria rolar, que iria aparecer gente, mas o início foi um negócio de guerrilha", lembra o empreendedor.
A proposta do espaço foi pensada a partir do público local, levando em conta quem são as pessoas que frequentam o Centro Histórico. "Começamos com uma ideia, pensando em quem vem aqui, que é uma galera universitária, sem muita grana, ou alguém que mora por aqui e também não tem muita grana", descreve, reforçando que o Justo vive em constante mudança. "Se o público está mudando, indo para outro lado, nós analisamos e mudamos também. Se algum rango não está vendendo, ele vai sair do cardápio, ou vamos buscar entender o público e o porquê eles não estão gostando daquilo", garante o sócio.
Abertos ao público de segunda a sábado, das 17h às 22h30min, o negócio busca oferecer uma boa gastronomia por preços acessíveis, como a clássica pizza artesanal que custa R$ 10,00. O empreendedor garante que o segredo para manter um preço justo, principalmente em um momento de difícil situação econômica, é unir conhecimento e criatividade. "Nosso aniversário de dois anos foi durante a greve dos caminhoneiros, quando o preço da carne foi lá em cima, e o meu sócio Ricardo, que também é professor de gastronomia, conseguiu criar um sanduíche de carne que vendemos por R$ 10,00. Ele comprou a carne mais barata do mercado e utilizou uma técnica da alta gastronomia, o sous-vide, onde a carne ficou por três dias cozinhando em banho maria. Então, é ter criatividade, conhecimento, trabalhamos com ingredientes simples, mas utilizando a técnica certa para tirar o melhor sabor deles", define.
Enxergando o potencial do Centro Histórico, Adelino comemora a boa relação que os empreendedores do bairro possuem entre si. "Temos um grupo no WhatsApp, nos juntamos e estamos pensando em fazer uma associação. A galera é bem unida, não se enxerga como concorrência", comenta.
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A Pão e Maria é focada na produção de pães de fermentação natural que podem ser fatiados e consumidos no espaço
O casal conta que o sonho sempre foi abrir no Centro, já que no início do namoro eles faziam muitos passeios pela área e tinham carinho pela região. "Adoramos o Centro. E também lemos sobre o que estava acontecendo pelo bairro, os vários pontos de revitalização, e achamos que, além de querer, também é um bom momento para vir pra cá. Estamos vendo várias outras coisas abrindo e está sendo um momento muito massa", percebe Carolina.
Imobiliária cria atelier de plantas para atrair clientes em Porto Alegre
O negócio foca em plantas próprias para ambientes internos e fáceis de cultivar
Os amigos, que também atuam juntos na imobiliária Somos Lares, que fica no mesmo prédio, perceberam que existia uma alta demanda no mercado botânico, principalmente dos clientes que procuravam os apartamentos já imaginando onde colocariam as plantas. "Foi no início da pandemia que percebemos o maior interesse das pessoas pelas plantas, e, como trabalhamos com muitos apartamentos no Centro Histórico, vimos que não tinha um negócio que suprisse isso aqui, até por isso que viemos para esse prédio. Os dois andares de cima são da imobiliária e, no de baixo, decidimos colocar o atelier", explica Fernando. O sócio afirma que, no início, o projeto do negócio ainda era confuso, justamente por não serem especialistas no assunto, mas a ideia de ser uma loja focada em plantas mais específicas para apartamentos foi o que mais chamou a atenção dos empreendedores. Para fazer a curadoria dos produtos, os sócios contam com a ajuda da Lívia Hafner, que cuida da operação no dia a dia.
Anderson se mudou para o bairro para ficar mais perto do negócio e por se identificar com o público do local. "Acho o Centro Histórico um lugar democrático, aqui vemos todo o tipo de gente, tem todo o tipo de negócio, desde o restaurante de luxo até a padaria simples, me identifico com esse clima", explica.
Casal francês aposta no potencial artístico e cultural do Centro Histórico
O espaço busca fomentar a cultura, língua, arte e gastronomia francesa
Um dos motivos de optarem pelo Centro é a vontade que os sócios possuem em manter um espaço democrático e acessível ao público. "Não queremos algo elitista, queremos ser um negócio mais acessível a todos, e o bairro que mais encarna isso é o Centro Histórico, além da beleza dos prédios, somos apaixonados por casas históricas, como essa aqui", afirma Mathilde sobre o casarão de dois andares onde o Ateliê está localizado. "Essa casa aqui tem mais de 100 anos, e isso é uma coisa muito importante para nós, preservar e cuidar dessa casa, deixar ela bonita, mas ainda com essa cara de casa provençal, antiga, histórica", define.
Completando 15 anos de operação em 2023, a empreendedora comemora que, apesar de possuírem muitos clientes e alunos fiéis, o espaço está sempre lotado de rostos novos. "Tem pessoas que frequentam a casa desde o início, mas temos um movimento muito grande de pessoas começando a vir. Com a pandemia, nosso público se renovou bastante", comenta. O espaço fechou as portas durante o período de isolamento e manteve os cursos de forma online. "Temos cursos regulares de língua, mas nossa especificidade é ter vários cursos em francês, mas voltados a uma temática única, seja literatura, arte, teatro, música. Temos diversas áreas culturais com uma proposta diferente a cada semestre", diz.
Banca criada no Mercado Público expande no Centro e RMPA de Porto Alegre
Negócio de família começou na década de 1970 no Centro da Capital
Hoje, são quatro lojas fora do Mercado, onde estão duas bancas (a segunda foi aberta em 2009). No começo de 2000, a marca chegou a Canoas, onde teve dois pontos, que foram unificados em 2021 em um só, com 170 metros quadrados de área de venda, no Centro da cidade.
"As fotos que estão nas paredes da loja despertam a curiosidade das pessoas e reforçam a ligação que temos com o complexo do Largo Glênio Peres. Foi uma forma de levar o Mercado para fora e mostrar que nossa origem vem de lá e temos muito orgulho disso", valoriza o filho de seu Heitor, Heitor Júnior, que hoje puxa a frente da expansão.
"Minha palavra é sempre a última sobre as mudanças", brinca Heitor pai, que reforça, já com semblante mais sério, que "a família atua unida".
"Deixo para os jovens tocarem que estão mais por dentro das novidades", comenta o precursor, citando que o novo layout e modelo de operação "foram importantes para padronizar o negócio".
Além das três da Capital e de Canoas, outras duas ficam em Cachoeirinha e Esteio, abertas em 2015 e 2020, respectivamente. A rede soma 75 funcionários e cresce com recursos próprios.
"A última (loja) foi aberta em meio à pandemia. Resolvemos apostar que as pessoas iriam querer comprar mais produtos saudáveis", explica Heitor Júnior.
O foco principal da banca 12 é ser um empório de venda de grãos e outros itens integrais, suplementos naturais e chás. Alguns artigos do antigo armazém de secos e molhados que caracterizava o varejo até o fim dos anos de 1970, mantêm-se nas gôndolas.
A incorporação de grãos e outros alimentos atendeu a uma demanda que a clientela passou a pedir nos anos de 1980. "Tinha fechado uma loja que vendia cereais no Centro e as pessoas passaram a procurar aqui. Alguém tinha de ocupar o espaço", recorda Heitor pai.
Mesmo com layout, conceito e linhas novas, os donos não querem abandonar a marca do comércio a granel e aviamentos que vêm do armazém. "Temos produtos integrais, suplementos, mas continuamos a vender muito pano de prato. Esta é nossa característica", reforça Heitor Júnior.
A expansão da Banca 12 não deve parar. Heitor Júnior estuda abrir mais lojas em 2023, cogitando se instalar nas zonas norte ou sul da Capital e avançar para mais cidades. O novo layout também deve ser levado às bancas do Mercado Público.
Todos os passos são conversados e decididos com o pai, que fez 76 anos em outubro passado, comenta Heitor Júnior, formado em Educação Física e com MBA em gestão de vendas e relacionamento.
"Tenho muito orgulho de ter ele por perto. Tudo isso só existe por causa dele", resume o filho.