"É uma empresa de 60 anos e tem muita credibilidade. Ninguém fica 60 anos no mercado prestando um mau serviço ou oferecendo um produto ruim", diz Gustavo Ervalho, nome à frente do Trianon, lancheria com foco no bauru que ocupa, desde 1962, o número 978 da avenida Protásio Alves em Porto Alegre. Segunda geração administrando a operação, Gustavo celebra o sexagésimo ano do negócio como um reconhecimento da cidade e aposta em uma novidade: produção de xis.
O empreendedor conta que o espaço, antes de oferecer o lanche como se conhece hoje, já existia com o mesmo nome e era comandado por um casal de portugueses. "Eles faziam tipo um bauru, mas um pouco diferente do que é feito hoje. Meu pai comprou o restaurante e chamou o irmão dele para trabalhar junto. A partir disso, o Trianon se tornou bem conhecido pelo produto. Ele alterou o modo de preparo, colocou mais ingredientes. Houve uma grande aceitação no mercado. De lá para cá, passaram 60 anos da gente fazendo exatamente o mesmo bauru", conta Gustavo sobre a história do negócio.
Apesar de garantir que o produto é o mesmo, o empreendedor é categórico ao afirmar que, para permanecer tanto tempo no mercado, foi necessário acompanhar as mudanças. Uma delas foi encarar a crescente concorrência no segmento de lanches. Recentemente, o Trianon foi
citado em uma matéria produzida pelo GeraçãoE sobre o Bauru Country como um estímulo ao desenvolvimento da empresa, já que ambos ofertam o mesmo lanche. Para Gustavo, no entanto, não há diferença na concorrência entre quem oferece o mesmo ou um produto diferente. "Todo mundo é concorrente. Qualquer um que entra no mercado para vender qualquer produto que seja é concorrente, está tirando uma fatia do mercado", pondera Gustavo, lembrando que o cenário era bem diferente antigamente. "A população de Porto Alegre continua igual ou um pouco maior que há 60 anos. Mas quantos negócios tinham há 60 anos e quantos têm hoje? Abrimos em uma época que nem tinha shopping, McDonalds. A população não cresce proporcional aos negócios que estão abrindo", ressalta o empreendedor.
Para continuar se destacando no mercado, Gustavo revela que o segredo é estar atento às mudanças e demandas do mercado. Em 2020, o Trianon abriu uma operação de delivery de pizzas inspiradas no preparo feito em Chigado, a deep dish. As novidades seguiram em 2021, quando a aposta, a partir de agosto, foi a criação do TrXis, dedicada ao lanche típico gaúcho. "Colocamos as novas marcas como família Trianon, tanto nas redes sociais quanto na embalagem", conta. Gustavo afirma que a aposta em diferentes marcas, e não por incorporar os itens ao cardápio do Trianon, é uma forma de preservar a personalidade do negócio. "Para não perder a identidade do Trianon, que é muito identificado pelo bauru. O porto-alegrense é muito conservador, então tenho receio de falarem ‘ah, não é mais o mesmo, não é mais como antigamente’. Mas se fosse fazer só como é antigamente já tinha fechado o restaurante. Vou aos pouquinhos", diz.
O Trianon opera com dois pontos na mesma quadra da avenida Protásio Alves, sendo um dedicado somente ao delivery, que hoje representa 60% do faturamento do negócio. O salão passou por uma reforma há cinco anos para acompanhar a modernização da marca. "Vi a necessidade de reformar completamente o restaurante, porque estava com uma decoração muito década de 1990. Acrescentamos outras opções ao cardápio, como hambúrguer e pratos para crianças. Nunca perdendo o que é o Trianon", afirma.
A longa trajetória da marca faz do negócio uma testemunha das mudanças da cidade. Gustavo conta que escuta de clientes mais velhos relatos que despertam sentimentos ambíguos. "Ao mesmo tempo que dá alegria, dá tristeza, porque Porto Alegre mudou muito. As pessoas nos contam nas redes sociais que vinham caminhando na avenida Protásio Alves à noite até o Trianon, que desciam do IPA pela rua Santa Cecília para comer um bauru. É uma mudança comportamental, de segurança, as pessoas têm medo", comenta. No entanto, ele acredita que a região está passando por uma transformação positiva. "O bairro passou por momentos piores, mas está mudando. Muitos clientes vinham no antigo hospital da Ulbra, que fechou, mas já se sabe que uma grande construtora comprou o terreno. Várias casas estão virando prédios. A Protásio está mudando", percebe.
Hoje com 40 funcionários, o empreendedor conta que precisou demitir parte da equipe durante a pandemia. Segundo ele, foi o pior momento do negócio. "Nunca tínhamos ficado fechados. Quando abriu, cheio de restrições, ninguém vinha ao restaurante porque estava com medo. Não atendíamos nem 10% do que a loja estava apta, tivemos que demitir muitos funcionários, foi bem traumático", lembra. Para ele, foi mais um dos percalços inerentes a ser um negócio de longa trajetória e que preza por manter a sua identidade. "São centenas de opções que têm em Porto Alegre novas e modernas. Muitas delas, abrem, aparecem no jornal como sendo uma coisa fantástica, e em dois anos fecham. Porto Alegre é uma cidade que vive de modismo, e nós estamos aqui, há 60 anos, aos trancos e barrancos, independentemente se é Plano Real, Plano Collor, Plano Bresser, Plano Verão. Mas o pior cenário, sem dúvida, foi o cenário dos últimos dois anos disparado", garante.
Para Gustavo, o segredo para conseguir passar pelas adversidades e manter um negócio promissor é conhecer bem o mercado em que se atua. "Restaurante em Porto Alegre com 60 anos ou mais são poucos. O segredo é a qualidade, produto, dedicação, muito empenho e conhecimento do negócio. O que vejo, muitas vezes, são pessoas que nunca trabalharam com gastronomia e entraram no segmento. É um ramo bem complicado, muito difícil. Para mim, é mais fácil porque já nasci aqui dentro, venho desde pequeno", afirma.