Quando o assunto é degradação ambiental, rapidamente vem à lembrança das pessoas a floresta Amazônica, constantemente na mídia, ou ainda, em menor grau nos noticiários, a Mata Atlântica, porém, quase ninguém pensa no bioma Pampa, característico do Rio Grande do Sul, com as suas as planícies e coxilhas cobertas de vegetação rasteira, gramíneas, arbustos, plantas herbáceas e árvores de pequeno porte, que sofre pelo manejo inadequado. Pois bem, esse é o objeto de estudo da pesquisadora Adriana Carla Dias Trevisan, que lidera o Grupo de Pesquisa Ecologia de Saberes em Agroecossistemas do Bioma Pampa e Mata Atlântica – Ecos do Pampa. Sua atuação abre a série de reportagens a partir de hoje que reunirá os 11 vencedores do prêmio O Futuro da Terra 2023, divididos em cinco categorias. Os agraciados serão laureados durante evento no dia 28 de agosto, às 19h30min, na Expointer.
“Eu gosto da palavra inovação, porém, mais ainda, do termo ecoinovação e o meu trabalho está alinhado a esse conceito”, cita Adriana, que é docente, engenheira agrônoma e pós-doutora em Agroecologia, além de atuar na Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Uergs) nos cursos de Bacharelado em Agronomia, em Agroecologia e em Desenvolvimento Rural e Gestão Agroindustrial.
Para a pesquisadora, que “recorta” o bioma Pampa, em Sul e Norte, dando uma atenção particularizada ao primeiro, que, segundo ela, é muito parecido ao existente no Uruguai, o conceito de ecoinovação surge como algo que é extremamente importante para todos.
“De fato, ecoinovação é (o modo) como os territórios podem se desenvolver (com base) no trabalho e renda a partir da conservação de seus recursos naturais. Esse é o grande objetivo das minhas linhas de pesquisa”, salienta.
Adriana comenta que a agropecuária, em prática, acaba indo um pouco ao revés desse olhar (apresentado pelo conceito) da ecoinovação. “Eu sou agrônoma e sei que a produtividade é importante, mas a conservação também é. Então, eu trabalho com um segundo patamar, ou seja, que leva em consideração a conservação pelo uso”. Ela prossegue: “a gente conserva, usa, gera trabalho e renda. Eu olho os ecossistemas como blocos; e a gente pode trabalhar com dois objetivos: inovação e a conservação pelo uso”, detalha.
Para se ter uma ideia, o grupo que Adriana coordena atua em três linhas de pesquisa: conhecimento da biodiversidade e da sociobiodiversidade botânica; paisagens resilientes: conservação pelo uso e restauração ecológica de ecossistemas dos campos sulinos; e ecoinovação em agroecossistemas.
“Em cada uma dessas linhas, são desenvolvidos diversos projetos ligados à ecologia e produção de espécies do Pampa; produtos naturais com óleos essenciais para uso agrícola; etnobiologia e etnoconhecimento”. Ela também ministra aulas na especialização em Agroecologia e Práticas em Sustentabilidade Ambiental e no Mestrado Profissional em Ambiente e Sustentabilidade, da Uergs Hortênsias.
Adriana lembra que, só em 2004, o bioma Pampa foi reconhecido oficialmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) pelas suas características distintas. “É algo, realmente, muito recente”, reforça. Mas, ela demonstra uma particular preocupação quando fala de todo potencial que já foi perdido pelo mau uso do bioma Pampa.
A pesquisadora frisa o conceito de ecoinovação, lembrando que a forma correta é trabalhar toda a cadeia produtiva. “Então, quando falamos, especialmente, sobre a inovação, devemos ter um olhar de juntar ‘hélices’, ou seja, juntar o poder público, as empresas e as instituições de pesquisa e ensino. Só então podemos lograr êxito em juntar essas duas coisas. E a gente só faz isso quando está no território, convive com as pessoas desse território, entende a sua cultura, as suas dimensões sociais e ecológicas. Nós precisamos colocar tudo isso como variáveis para, então, pensar nessa conservação e na conservação pelo uso”, explica.
Adriana comenta que a sua pesquisa direciona-se para os aspectos já descritos, porém, o seu olhar mais particularizado vai para as plantas nativas do bioma Pampa Sul. “Desde muito jovem olho para as plantas nativas e como elas podem auxiliar no sentido da ecoinovação e da conservação (do meio ambiente) pelo uso”.
Segundo a pesquisadora, as plantas são biofábricas de produtos químicos. “Grande parte dos fármacos são inspirados na química das plantas. Eu tenho um olhar macro. A primeira linha (de pesquisa) é conhecer o que existe no bioma Pampa, ou seja, os seus potenciais da biodiversidade”. Já o outro ponto (do estudo), de acordo com Adriana, é “eleger algumas espécies, que fazem sentido para geração de trabalho e renda para ecoinovação”. “Nós estamos colocando muitas fichas nessa aposta, inclusive, trabalhando em uma rede de instituições, os chamados bioinsumos”.
A pesquisadora explica que esse estudo analisa o metabolismo das plantas. “O metabolismo primário é o responsável em fazer a planta crescer, florescer, dar fruto e perpetuar a espécie. Já o metabolismo secundário, permite que ela produza ‘mecanismos’ capazes, por exemplo, de repelir os insetos. E com base nessa lógica, a ideia é aproveitar esse metabolismo para gerar os bioinsumos botânicos, ao invés de usar químicos que contaminam o solo, o ar e as pessoas”, conclui.